― Terrível essa sensação de impotência, não? ― disse Arthur, mas os outros o ignoraram.
No centro da área iluminada da qual os robôs se aproximavam, uma fenda de formato quadrado surgiu no chão. A fenda podia ser vista de forma cada vez mais distinta, e logo ficou claro que um bloco de solo, tendo pouco mais que meio metro quadrado, estava lentamente se erguendo.
Ao mesmo tempo perceberam um outro movimento, quase subliminar, e, por alguns instantes, não estava exatamente claro o que estava se movendo. Em seguida ficou claro.
Era o asteróide. Movia-se lentamente para dentro da Nuvem de Poeira, como se fosse inexoravelmente puxado por algum pescador celestial lá dentro das suas profundezas. Iriam fazer, na vida real, a jornada através da Nuvem que já haviam feito na Sala de Ilusões Informacionais. Permaneceram envolvidos por um silêncio gélido. Trillian franziu a testa.
Parecia que toda uma era se passara. Eventos pareciam transcorrer com uma lentidão estonteante, enquanto a extremidade do asteróide penetrava no vago e suave perímetro externo da Nuvem.
E logo foram envolvidos por uma obscuridade fina e oscilante. Passaram por ela, gradualmente, vagamente conscientes de formas e espirais impossíveis de distinguir na escuridão, exceto com o canto dos olhos.
A Nuvem de Poeira enfraquecia os focos de luz brilhante, que piscavam por entre a miríade de partículas de poeira.
Trillian, mais uma vez, observou essa passagem de dentro de seus próprios pensamentos franzidos.
Então a travessia terminou. Não havia como saber se tinham levado um minuto ou meia hora, mas atravessaram a Nuvem e se depararam com uma escuridão virgem, como o espaço tivesse sido puxado para fora da existência bem na frente deles. Agora as coisas começaram a se mover com rapidez.
Um ofuscante poço de luz parecia quase explodir, vindo do bloco, que havia subido cerca de um metro do chão, e dele saía um bloco menor de acrílico, formando um fascinante bale de cores em seu interior.
O bloco possuía ranhuras profundas, três na vertical e duas na transversal, claramente projetadas para aceitar a Chave de Wikkit.
Os robôs se aproximaram da Fechadura, introduziram a Chave e se afastaram novamente. O bloco começou a girar e o espaço começou a se alterar. Enquanto o espaço se desdobrava, dava a agonizante sensação de retorcer os olhos dos observadores em suas órbitas. Encontraram-se olhando, cegos, para um sol desemaranhado que agora estava diante deles, lá onde, segundos antes, parecia não haver nem mesmo espaço vazio. Passaram-se um ou dois segundos antes que pelo menos tomassem consciência do que acontecera e pudessem cobrir com as mãos seus olhos horrivelmente ofuscados. Naqueles poucos segundos perceberam um minúsculo ponto movendo-se lentamente pelo centro daquele sol.
Cambalearam para trás e ouviram, ressoando em seus ouvidos, o inesperado canto
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dos robôs gritando em uníssono com suas vozes finas.
― Krikkit! Krikkit! Krikkit! Krikkit!
O som era de arrepiar. Era duro, era frio, era vazio, era mecanicamente sombrio. Era também triunfante.
Ficaram tão atordoados por esses dois choques sensoriais que quase perderam o segundo evento histórico.
Zaphod Beeblebrox, o único homem em toda a história a ter sobrevivido a um ataque direto dos robôs de Krikkit, saiu correndo da nave de Krikkit brandindo uma arma Zapogun.
― Tudo bem ― gritou ―, a situação está totalmente sob controle a partir de agora. O robô que estava de guarda próximo à escotilha da nave silenciosamente girou seu bastão de batalha e conectou-o à parte de trás da cabeça esquerda de Zaphod.
― Mas quem foi o zark que fez isso? ― disse a cabeça esquerda, caindo em seguida para a frente.
Sua cabeça direita olhou em volta.
― Quem fez o quê? ― perguntou.
O bastão conectou-se com a parte de trás da cabeça direita.
Zaphod estatelou-se no chão.
Em poucos segundos, tudo estava terminado. Alguns disparos dos robôs fora suficientes para destruir a Fechadura para sempre. Ela se quebrou e derreteu e espalhou seu conteúdo despedaçado. Os robôs marcharam de forma impiedosa e, de uma forma peculiar, ligeiramente desalentados de volta à nave de guerra, que partiu com um "fuop". Trillian e Ford correram alucinadamente pela rocha inclinada até o corpo escuro e imóvel de Zaphod Beeblebrox.
Capítulo 26
Não sei ― disse Zaphod, pensando que devia ser a trigésima sétima vez que dizia aquilo ―, eles podiam ter me matado, mas não mataram. Talvez tenham pensado que eu era um cara incrível ou algo assim. É algo que posso entender.
Os outros registraram mentalmente suas opiniões sobre essa teoria. Zaphod estava deitado no chão frio da cabine de comando. Suas costas pareciam estar brigando com o chão, porque sentia uma dor percorrendo seu corpo e batendo em suas cabeças.
― Acho ― murmurou ― que tem algo de errado com esses carinhas anodizados, algo fundamentalmente estranho.
― Eles foram programados para matar todo mundo ― afirmou Slartibartfast.
― Este ― disse Zaphod, arquejante ― pode mesmo ser o problema. Ainda assim, não parecia totalmente convencido.
― Alô, querida ― disse para Trillian, esperando que isso servisse como desculpa para seu comportamento anterior.
― Você está bem? ― disse ela, gentilmente.
― Sim ― respondeu ―, tudo bem.
― Ótimo ― disse ela e se afastou para pensar. Olhou para a enorme tela de visualização acima dos assentos de vôo e, girando um botão, mudou as imagens locais que estavam sendo exibidas. Uma imagem era da escuridão da Nuvem de Poeira. Outra era do sol de Krikkit. Uma terceira era de Krikkit em si. Ficava passando de uma para a outra
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rapidamente.
― Bem, melhor dizermos adeus à Galáxia, então ― disse Arthur, batendo nos joelhos e levantando-se.
― Não ― disse Slartibartfast gravemente. ― Nosso rumo está claro. ― Franziu a testa a tal ponto que seria possível cultivar alguns vegetais pequenos em seus sulcos. Levantou-se, andou de um lado para o outro. Quando falou outra vez, aquilo que disse o deixou tão assustado que teve que se sentar de novo.
― Devemos descer em Krikkit ― disse. Um suspiro profundo sacudiu seu velho esqueleto e seus olhos pareceram tremer nas órbitas.
― Mais uma vez ― prosseguiu ― falhamos pateticamente. Muito pateticamente.
― Isso ― disse Ford, calmamente ― é porque não nos importamos o bastante. Eu já lhe disse.
Colocou seus pés sobre o painel de instrumentos e ficou futucando algo em uma de suas unhas.
― No entanto, se não agirmos ― disse o velho em tom de birra, como se lutasse com alguma coisa profundamente displicente em sua própria natureza ―, então seremos todos destruídos, iremos todos morrer. Acho que nos importamos com isso, não?
― Não o suficiente para morrermos por isso ― disse Ford. Abriu um sorriso vazio e lançou-o de um lado para o outro da sala, para quem quisesse vê-lo. Slartibartfast claramente achou esse ponto de vista muito sedutor e lutou contra ele. Virou-se de novo para Zaphod, que estava rangendo os dentes e suando de dor.
― Você certamente tem alguma idéia ― disse ― sobre a razão de terem salvado a sua vida. Parece muito estranho e incomum.
― Acho que nem mesmo eles sabem ― disse Zaphod, indiferente. ― Já lhe disse. Me acertaram com o disparo mais fraco apenas para me deixar desacordado. Daí me arrastaram até a nave deles, me jogaram em um canto e me ignoraram completamente. Como se estivessem meio envergonhados por eu estar ali. Se dissesse qualquer coisa, me tiravam do ar de novo Tivemos ótimas conversas. "Ei... ai! E aí... ui! Queria saber... argh!" Isso me manteve distraído durante várias horas, sabe ― Fez outra careta de dor. Estava brincando com um objeto entre seus dedos. Segurou-o. Era a Trave Dourada