E Graciela acreditava, fazia o maior esforço para não chorar.
À tarde, depois das aulas, Graciela vagueava sozinha, andando pelas ruas estreitas e sinuosas, com acácias e plátanos, passando por casas de pedra caiadas de branco, em que os pais amorosos viviam com suas famílias. Graciela tinha muitos colegas, mas todos apenas em sua mente. Eram lindas meninas e garotos simpáticos, convidavam-na para todas as suas festas, serviam bolo e sorvete. Os amigos imaginários eram gentis e afetuosos, todos consideravam-na muito inteligente. Quando a mãe não estava por perto, Graciela mantinha longas conversas com os amigos imaginários.
"Quer me ajudar com os deveres de casa, Graciela? Não sei somar, e você é muito boa nisso."
"O que vamos fazer esta noite, Graciela? Podemos ir ao cinema ou passear pela cidade e tomar uma coca-cola."
"Será que sua mãe a deixaria vir jantar conosco esta noite, Graciela?"
"Acho que não vai dar. Minha mãe se sente muito sozinha quando não estou em casa. Afinal, sou tudo o que ela tem."
Aos domingos, Graciela levantava-se cedo e vestia-se sem fazer barulho, tomando cuidado para não acordar a mãe e qualquer que fosse o tio que estivesse na cama. Depois, ia para a igreja de San Juan Baptista, onde o padre Pérez falava sobre as alegrias da vida após a morte, uma vida de conto de fadas, com Jesus; e Graciela sentia-se ansiosa em morrer e se encontrar com Jesus.
Padre Pérez era um homem atraente, de quarenta e poucos anos. Assistia os ricos e pobres, doentes e saudáveis, desde que viera para Las Navas del Marqués, vários anos antes. Não havia segredos na pequena aldeia que ele não conhecesse. Padre Pérez conhecia Graciela como uma frequentadora assídua da igreja e também estava a par das histórias sobre o constante fluxo de estranhos que partilhavam a cama de Dolores Pinero. Não era um lar apropriado para uma criança, mas não havia nada que ele pudesse fazer a esse respeito. Admirava-se por Graciela se sair tão bem.
Era uma menina boa e gentil, nunca se queixava ou falava sobre a vida doméstica.
Graciela aparecia na igreja todas as manhãs de domingo com uma roupa limpa e arrumada, que ele sabia ter sido lavada por ela. Padre Pérez sabia que ela era escorraçada pelas outras crianças da aldeia, e seu coração se confrangia. Fazia questão de passar alguns momentos com Graciela depois da missa, todos os domingos; e quando dispunha de tempo, levava-a um café para tomar um sorvete.
No inverno a vida da Graciela era uma paisagem desolada, monótona e sombria. Las Navas del Marqués ficava num vale, cercado de montanhas, por causa disso, os invernos duravam seis meses. Os verões eram mais fáceis de suportar, pois os turistas chegavam e enchiam a aldeia com risos e danças, as ruas fervilhavam. Os turistas reuniam-se na Plaza de Manuel Delgado Barredo, com seus pequenos coretos de pedra, escutavam a orquestra e observavam os nativos dançarem a sardana, a dança folclórica de muitos séculos, sempre descalços, as mãos dadas, dando voltas graciosas, num círculo colorido. Graciela gostava de observar os visitantes, sentados nos cafés de beira de calçada com seus aperitivos ou envolvidos nas compras no mercado de peixe. À uma hora da tarde a bodega estava sempre repleta de turistas, bebendo chateo e comendo pedaços de carne, frutos do mar, azeitonas e batatas fritas.
O mais excitante para Graciela era assistir ao passeo, todos os dias, ao fim da tarde. Rapazes e moças andavam de um lado para outro da Plaza Mayor, em grupos segregados, os rapazes olhavam para as moças, enquanto pais, avós e amigos vigiavam atentos dos cafés na calçada. Era o tradicional ritual de acasalamento, mantido há séculos. Graciela ansiava em participar, mas a mãe proibia.
- Quer ser uma puta? - gritava para a filha. - Fique longe de rapazes. Eles só querem uma coisa de você. - Uma pausa e ela acrescentava, amargurada: - Sei por experiência própria.
Se os dias eram suportáveis, as noites eram uma agonia.
Através da cortina que separava as camas, Graciela podia ouvir os sons dos gemidos, estertores e respiração ofegante, e sempre as obscenidades.
- Mais depressa… com mais força!
- Cóge-me!
- Mámame la verga!
- Mételo en el culo!
Antes dos dez anos de idade, Graciela já ouvira todas as palavras obscenas do vocabulário espanhol. Eram sussurradas e gritadas, balbuciadas e gemidas. Os gritos de paixão repugnavam Graciela e ao mesmo tempo lhe despertavam estranhos anseios.
Quando Graciela estava com 14 anos, o mouro entrou em cena.
Era o maior homem que Graciela já vira. A pele era de preto lustroso e a cabeça raspada. Tinha ombros enormes, peito estufado e braços musculosos. O mouro chegou durante a noite, quando Graciela dormia. Ela só o viu pela manhã, quando ele empurrou a cortina para o lado e passou por sua cama, completamente nu, a caminho da privada nos fundos. Graciela fitou-o e quase soltou um grito de espanto. Ele era enorme, em todas as partes. "Isso vai matar minha mãe", pensou Graciela. O mouro a viu.
- Ora, ora… o que temos aqui? Dolores Pinero deixou a cama apressada e veio se postar ao seu lado.
- Minha filha - disse, bruscamente.
Uma onda de embaraço envolveu Graciela ao ver o corpo nu da mãe junto do homem. O mouro sorriu, exibindo dentes bonitos, brancos e regulares.
- Qual é o seu nome, guapa?
Graciela estava envergonhada demais com a nudez do homem para falar.
- Ela se chama Graciela, e é retardada.
- Ela é linda. Aposto que você parecia assim quando jovem.
- Ainda sou jovem - respondeu Dolores em tom áspero, virando-se para a filha e acrescentou: - Vista-se ou vai chegar atrasada na escola.
- Está bem, mamãe.
O mouro ficou parado ali, contemplando-a. A mãe pegou-lhe o braço musculoso e murmurou, insinuante:
- Vamos voltar para a cama, querido. Ainda não acabamos.
- Mais tarde - respondeu o mouro, ainda olhando para Graciela.
O mouro ficou. Todos os dias, ao voltar da escola, Graciela rezava para que ele tivesse ido embora. Por motivos que não compreendia, aquele homem a deixara apavorada. Sempre era polido com ela, e nunca tentara coisa alguma, mas Graciela sentia calafrios só de pensar nele.
O tratamento que ele dispensava à mãe era bem diferente.
Passava a maior parte do dia na pequena casa, bebendo sem parar.
Tomava qualquer dinheiro que Dolores ganhava. Às vezes, à noite, no meio do ato de amor, Graciela o ouvia espancar a mãe. Pela manhã, Dolores Pinero aparecia com um olho roxo ou um lábio partido.
- Por que atura esse homem, mamãe?
- Você não compreendia. Ele é um homem de verdade, não um anão como os outros. Sabe como satisfazer uma mulher. - Dolores passou a mão pelos cabelos, num gesto coquete. - Além do mais, ele está perdidamente apaixonado por mim.
Graciela não acreditava nisso. Sabia que o mouro apenas usava sua mãe, mas não ousou protestar de novo. Tinha pavor do temperamento explosivo da mãe, pois Dolores Pinero parecia dominada por uma espécie de insanidade quando ficava furiosa.
Numa das ocasiões perseguira Graciela com uma faca de cozinha, porque ela se atrevera a fazer um chá para um dos "tios".
No início de uma manhã de domingo, Graciela levantou-se para ir à igreja. A mãe saíra cedo para entregar alguns vestidos. No momento em que Graciela tirou a camisola, a cortina foi puxada e o mouro apareceu. Estava nu.
- Onde está sua mãe, guapa?
- Mamãe saiu cedo. Tinha de entregar alguns vestidos.
O mouro, contemplando o corpo nu de Graciela, murmurou:
- Você é mesmo uma beleza.
Graciela sentiu-se corar. Sabia o que devia fazer: cobrir a nudez, pôr uma saia e uma blusa, sair dali. Em vez disso, ficou parada, incapaz de se mexer. Observou o membro do mouro começar a inchar e subir diante de seus olhos. Podia ouvir as vozes ressoando em seus ouvidos: "Mais depressa… Com mais força!"
Sentiu que estava prestes a desfalecer.