Para irmã Teresa, a notícia teve um significado diferente.
Ouvira os homens comentarem que alguém chamado coronel Acoca estava à procura deles. "Chamaram o coronel Acoca de inimigo. Mas esses homens são o inimigo; portanto, o coronel Acoca deve ser meu amigo. Obrigada, Deus, por enviar-me o coronel Acoca."
"O homem chamado Rubio estava lhe falando:
- Entendeu, irmã? Todos devemos ficar muito quietos.
- Entendi. - "E entendi mais do que você imagina. Eles não sabiam que Deus lhe permitia ver em seus corações malignos."
Tomás Sanjuro disse, gentilmente:
- Sei como deve ser difícil para as duas, mas não se preocupem. Daremos um jeito para que cheguem sãs e salvas ao convento.
"Para Éze, é o que ele está querendo dizer. Ah, mas como ele é astuto. Fala as palavras de mel do diabo. Mas Deus está em mim, e Ele me guia." Ela sabia o que devia fazer. Mas precisava ser muito cautelosa.
Os dois homens arrumaram os sacos de dormir das freiras, um ao lado do outro.
- Vocês duas devem dormir um pouco.
As mulheres enfiaram-se nos sacos de dormir, nada familiares. A noite estava excepcionalmente clara, e o céu salpicado de estrelas cintilantes. Lucia contemplou-as e pensou, feliz: "Dentro de mais algumas horas estarei a caminho da liberdade. Assim que os outros adormecerem." Ela bocejou. Não percebera como estava cansada. A viagem longa e árdua e a tensão emocional deixaram-na exausta. Sentiu os olhos pesados. "Vou descansar só um pouco", pensou Lucia.
Ela dormiu.
Irmã Teresa, deitada ao seu lado, permaneceu acordada, em sua luta contra os demônios que tentavam possuí-la, para mandar sua alma para o inferno. "Devo ser forte. O Senhor está me testando. Fui exilada a fim de poder encontrar o caminho de volta para Ele. E esses homens fazem de tudo para me deter. Não posso permitir."
Às quatro horas da madrugada, irmã Teresa sentou-se sem fazer barulho e olhou à sua volta. Tomás Sanjuro dormia a poucos passos dela. O homem alto e moreno chamado Rubio estava de vigia na beira da clareira, de costas para ela. Podia ver sua silhueta contra as árvores.
Em silêncio, irmã Teresa levantou-se. Hesitou, pensando na cruz. "Devo levá-la? Mas estarei voltando para cá muito em breve. Preciso encontrar um lugar em que fique segura até eu voltar."
Olhou para o lugar em que irmã Lucia dormia. "Isso mesmo. Está segura com minha irmã em Deus", decidiu irmã Teresa.
Aproximou-se do outro saco de dormir, sem fazer barulho, e enfiou a cruz lá dentro. Lucia não se mexeu. Irmã Teresa virou-se e afastou-se pelo bosque, fora da vista de Rubio Arzano. Começou a descer a encosta, com todo cuidado, na direção do acampamento dos soldados. A encosta era íngreme e escorregadia com o orvalho, mas Deus lhe deu asas, e ela desceu depressa, sem tropeçar ou cair, ao encontro da salvação.
O vulto de um homem surgiu de repente na escuridão à sua frente. Uma voz indagou:
- Quem está aí?
- Irmã Teresa.
Ela aproximou-se da sentinela, que usava um uniforme militar e apontava um rifle para ela.
- De onde veio, velha?
Irmã Teresa fitou-o com olhos brilhantes.
- Deus me enviou.
O sentinela arregalou os olhos.
- É mesmo?
- É, sim. Ele me mandou para falar com o coronel Acoca.
O soldado sacudiu a cabeça.
- É melhor dizer a Ele que você não é do tipo do coronel.
"Adiós, señora."
- Não compreende. Sou a irmã Teresa, do convento Cisterciense. Fui capturada por Jaime Miró e seus homens. - Observou uma expressão de espanto estampar-se no rosto do homem.
- Você… é do convento?
- Isso mesmo.
- O de Ávila?
- Exatamente. - Teresa estava impaciente. O que havia com o soldado? Será que não compreendia como era importante que fosse salva daqueles homens maus?
- O coronel não se encontra aqui no momento, irmã… - Era um golpe inesperado. -…mas o coronel Sostelo está no comando. Posso levá-la a ele.
- E ele poderá me ajudar?
- Claro. Acompanhe-me, por favor.
A sentinela mal podia acreditar na sua sorte. O coronel Fal Sostelo despachara pelotões para vascolhar toda a região à procura das quatro freiras, sem o menor sucesso. Agora, uma das irmãs aparecia no acampamento e se entregava. O coronel ficaria muito satisfeito.
Chegaram à barraca em que o coronel Fal Sostelo e seu subcomandante examinavam um mapa. Os homens levantaram os olhos quando a sentinela e uma mulher entraram.
- Com licença, coronel. Esta é a irmã Teresa, do convento Cisterciense.
O coronel Sostelo ficou incrédulo. Nos últimos três dias, todas as suas energias haviam-se concentrado na descoberta de Jaime Miró e as freiras, e agora, ali na sua frente, estava uma delas. "Havia" mesmo um Deus.
- Sente-se, irmã.
"Não há tempo para isso", pensou irmã Teresa. Precisava de fazê-lo compreender como a situação era urgente.
- Devemos nos apressar. Eles estão tentando me levar de volta para Éze.
O coronel ficou perplexo.
- Quem está tentando levá-la de volta para Éze?
- Os homens de Jaime Miró.
Ele se levantou.
- Irmã… por acaso sabe onde esses homens se encontram?
Irmã Teresa respondeu impaciente.
- Claro. - Ela virou-se e apontou. - Estão lá em cima, nas colinas, se escondendo de vocês.
Capítulo 18
Alan Tucker chegou a Ávila no dia seguinte à conversa com Ellen Scott. Fora um longo vôo, e Tucker devia estar exausto, mas sentia-se estimulado. Ellen Scott não era uma mulher propensa a caprichos. "Há alguma coisa estranha por trás de tudo isso, e se eu jogar minhas cartas direito, tenho a impressão de que poderá ser bastante proveitoso para mim", pensou Alan Tucker. Registou-se no quarto Postes Hotel e perguntou ao recepcionista:
- Há algum jornal por aqui?
- Nesta mesma rua, señor. No lado esquerdo, a dois quarteirões. Não pode errar.
- Obrigado.
- De nada.
Enquanto descia pela rua principal, observando a cidade ressuscitar depois da "siesta" da tarde, Tucker pensava na garota misteriosa que viera buscar. Só podia ser uma coisa importante. Mas importante por quê? Podia ouvir a voz de Ellen Scott.
"Se ela estiver viva, traga-a para mim. Não deve falar sobre isso com ninguém."
"Está certo, madame. O que devo dizer a ela?"
"Diga apenas que uma amiga de seu pai deseja conhecê-la. Ela virá."
Tucker encontrou a redação do jornal. Entrou e aproximou-se de algumas pessoas que trabalhavam por trás de mesas.
- Perdone, eu gostaria de falar com o editor.
O homem apontou para uma sala.
- Ali, señor.
- Gracias. - Tucker caminhou até a porta aberta e olhou para dentro. Um homem de trinta e poucos anos estava sentado por trás de uma mesa, ocupado com seus textos. - Com licença - disse Tucker. - Posso lhe falar por um momento?
O homem fitou-o.
- Em que posso ajudá-lo?
- Estou à procura de uma señorita.
O editor sorriu.
- Não estamos todos, señor?
- Foi deixada numa casa de fazenda por aqui quando era bebê.
O sorriso se desvaneceu.
- Ah… Ela foi abandonada?
- Isso mesmo.
- E está tentando descobri-la?
- Estou.
- Há quantos anos isso aconteceu, señor?
- Há 28 anos.
O homem encolheu os ombros.
- Foi antes do meu tempo.
"Talvez não seja tão fácil assim."
- O senhor poderia sugerir alguém que seja capaz de me ajudar?
O editor recostou-se na cadeira, pensativo.
- Acho que sim. Sugiro que converse com o padre Berrendo.
Padre Berrendo estava sentado à sua escrivaninha, uma manta cobria-lhe as pernas finas, escutando o estranho. Quando Alan Tucker terminou de explicar sua presença ali, padre Berrendo disse:
- Por que deseja saber isso, señor? Aconteceu há muito tempo. Qual é o seu interesse nisso?