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Por mais incrível que pudesse parecer, Ele não respondeu.

Não é possível, pois Deus se encontrava em toda a parte. E quando o sexto homem penetrou em seu corpo, a epifania ocorreu-lhe subitamente. Deus não estava escutando porque não havia Deus.

Ela enganara-se a si mesma durante todos aqueles anos, idolatrando um poder supremo e servindo-o fielmente. Mas não havia nenhum poder supremo. "Se Deus existisse, Ele teria me salvado."

O nevoeiro vermelho dissipou-se da frente dos olhos de irmã Teresa, e ela teve uma visão nítida do que acontecia pela primeira vez. Havia pelo menos uma dúzia de soldados na barraca esperando a vez de estuprá-la. Os soldados na fila estavam de uniforme, não se dando ao trabalho de tirá-lo. Enquanto um soldado saía de cima dela, o seguinte agachou-se por cima dela e penetrou-a logo depois.

"Não há Deus, mas existe um Satã, e estes são seus ajudantes", pensou irmã Teresa. "E eles devem morrer. Todos eles."

Enquanto o soldado afundava nela, irmã Teresa tirou-lhe a pistola do coldre. Antes que alguém pudesse reagir, ela apontou para Arrieta. A bala acertou-lhe na garganta. Apontou então a arma para os outros soldados e continuou a disparar. Quatro deles caíram ao chão antes que os outros recuperassem o controle e começassem a atirar nela. Por causa do soldado em cima dela tiveram dificuldade para mirar.

Irmã Teresa e seu último estuprador morreram ao mesmo tempo.

Capítulo 21

Jaime Miró acordou instantaneamente, despertado por um movimento na beira da clareira. Saiu do saco de dormir e levantou-se, com a arma na mão. Quando se aproximou, viu Megan ajoelhada, rezando. Ficou imóvel, estudando-a. Havia uma extraordinária beleza na imagem daquela linda mulher concentrada em suas orações na floresta, no meio da noite. Jaime descobriu-se ressentido. "Se Felix Carpio não dissesse que estávamos a caminho de San Sebastián, eu não estaria com o fardo da irmã, para começar."

Era indispensável que ele chegasse a San Sebastián o mais depressa possível. O coronel Acoca e seus homens fechavam o cerco. Mesmo sozinho, já seria difícil escapar da rede. Com o fardo adicional daquela mulher para retardá-lo, o perigo era dez vezes maior.

Aproximou-se de Megan, irritado, a voz soou mais ríspida do que tencionava.

- Já lhe disse para dormir um pouco. Não quero que nos retarde amanhã.

Megan fitou-o e disse calmamente:

- Desculpe se o deixei zangado.

- Irmã, guardo minha raiva para coisas mais importantes. Seu tipo me cansa. Passam suas vidas escondidas por trás de muros de pedra, à espera de uma viagem gratuita para o outro mundo. Deixam meu estômago embrulhado, todas vocês.

- Porque acreditamos no outro mundo?

- Não, irmã. Porque não acreditam neste. E fogem dele.

- Para rezar por homens como você. Dedicamos nossas vidas a preces por vocês.

- E acha que isso resolverá os problemas do mundo?

- Com o tempo, sim.

- Não há tempo. Seu Deus não pode ouvir as orações por causa do barulho dos canhões e os gritos das crianças sendo dilaceradas pelas bombas.

- Quando se tem fé…

- Ora, irmã, tenho muita fé. Tenho fé naquilo por que estou lutando. Tenho fé em meus homens e nas minhas armas. Só não tenho fé nas pessoas que andam sobre a água. Se acha que seu Deus está nos escutando agora, diga a ele para nos levar ao convento em Mendavia, para que eu possa me livrar de você.

Estava furioso consigo mesmo por perder a calma. Não era culpa dela que a Igreja se tivesse posto de lado, sem fazer nada, enquanto os falangistas de Franco torturavam, estupravam e assassinavam bascos e catalães. "Não foi culpa dela que minha família estivesse entre as vítimas."

Ele era criança na ocasião, mas aquela lembrança ficaria gravada em sua memória para sempre…

Foi despertado no meio da noite pelo barulho das bombas caindo. Desciam do céu como mortíferas flores de som, plantando suas sementes de destruição por toda a parte.

- Levanta, Jaime! Depressa!

O medo na voz do pai era mais assustador para o menino do que o estrondo terrível do bombardeio aéreo.

Guernica era um baluarte dos bascos, e o general Franco decidira convertê-la numa lição: "Destruam-na."

A temida Legião Condor nazista e alguns aviões italianos desfecharam um ataque concentrado sem misericórdia. Os moradores da pequena cidade tentaram fugir da chuva de morte que caía do céu, mas não havia escapatória.

Jaime, a mãe, o pai e duas irmãs nazistas velhas fugiram junto com os outros.

- Para a igreja! - gritou o pai de Jaime. - Eles não vão bombardear a igreja.

Ele estava certo. Todos sabiam que a Igreja se postara do lado do caudilho, ignorando o tratamento brutal dispensado a seus inimigos. A família Miró encaminhou-se para a igreja, fazendo força para abrir caminho pela multidão em pânico que tentava fugir.

O menino segurava com toda força a mão do pai e procurava não ouvir o barulho terrível à sua volta. Lembrou um tempo em que o pai não estava assustado, nem fugindo.

- Vamos ter uma guerra? - perguntou ele ao pai uma vez.

- Não, Jaime. É apenas boato de jornal. Tudo o que pedimos é que o governo nos dê um mínimo de independência. Os bascos e catalães têm direito à sua própria língua, bandeira e feriados. Ainda somos uma nação. E espanhóis nunca lutarão contra espanhóis.

Jaime era muito pequeno na ocasião para compreender, mas claro que havia mais em jogo do que a questão dos catalães e bascos. Era um profundo conflito ideológico entre o governo republicano e os nacionalistas da direita, e o que começara como uma faísca de dissidência logo se transformou numa conflagração incontrolável, que atraiu outras potências estrangeiras.

Quando as forças superiores de Franco derrotaram os republicanos e os nacionalistas já mantinham um firme controle da Espanha, o ditador concentrara sua atenção nos intransigentes bascos: "Punam-nos."

E o sangue continuara a jorrar.

Um grupo de líderes bascos criara a "ETA", um movimento por um Estado Basco Livre, e o pai de Jaime fora convidado a aderir.

- Não. Está errado. Devemos obter o que é nosso por direito através de meios pacíficos. A guerra nada realiza.

Mas os gaviões demonstraram ser mais fortes do que as pombas, e a "ETA" logo se tornara uma força poderosa.

Jaime tinha amigos cujos pais eram membros da "ETA" e escutava as histórias de seus feitos heróicos.

- Meu pai e um grupo de amigos atacaram à bomba o quartel-general da Guarda Civil - lhe diria um amigo.

Ou:

- Já soube do assalto ao banco em Barcelona? Foi meu pai. Agora eles podem comprar armas para combater os fascistas.

E o pai de Jaime insistia:

- A violência é um erro… Devemos negociar.

- Explodimos uma das fábricas deles em Madrid. Por que seu pai não está do nosso lado? Ele é um covarde?

O pai dizia a Jaime:

- Não dê atenção aos seus amigos, Jaime. A atitude deles é criminosa.

- Franco ordenou que uma dúzia de bascos fossem executados sem um julgamento sequer. Vamos promover uma retaliação em escala nacional. Seu pai vai se juntar a nós?

- Papai…?

- Somos todos espanhóis, Jaime. Não devemos permitir que ninguém nos divida.

E o menino estava dividido. "Meus amigos estão certos? Papai é um covarde?" Jaime acreditava no pai.

E agora…, Armagedom. O mundo desmoronava ao seu redor. As ruas de Guernica estavam apinhadas por uma multidão que gritava e tentava escapar das bombas vindas do céu. Prédios, estátuas e calçadas explodiam em chuvas de concreto e sangue.

Jaime, a mãe, o pai e as irmãs chegaram à enorme igreja, o único prédio da praça que ainda se encontrava de pé. Outras pessoas batiam à porta.

- Deixem-nos entrar! Em nome de Jesus, abram a porta!