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- O que está acontecendo? - gritou o pai de Jaime.

- Os padres trancaram a igreja. Não querem nos deixar entrar.

- Vamos arrombar a porta!

- Não!

Jaime olhou para o pai, surpreso.

- Não arrombamos a casa de Deus - declarou o pai. - Ele nos protegerá onde quer que estejamos.

Tarde demais, eles viram o esquadrão de falangistas aparecer vindo da esquina e abrir fogo de metralhadora, varrendo a multidão desarmada de homens, mulheres e crianças na praça. Mesmo enquanto sentia as balas se cravando em seu corpo, o pai de Jaime segurou o filho e puxou-o para baixo, para a segurança, seu próprio corpo protegendo Jaime da saraivada mortífera.

Um silêncio fantástico parecia envolver o mundo depois do ataque. O som de armas, de pessoas às carreiras e gritos desapareceu, como um passe de mágica. Jaime abriu os olhos e ficou imóvel por um longo tempo, sentindo o peso do corpo do pai por cima, como um cobertor de amor. O pai, a mãe e as irmãs estavam mortos, junto com centenas de outros. E na frente dos cadáveres estavam as portas trancadas da igreja.

Noite tarde Jaime deixou a cidade, e dois dias depois, ao chegar a Bilbao, ingressou na "ETA".

O oficial de recrutamento fitou-o e disse:

- Você é jovem demais para se juntar a nós, filho. Devia estar na escola.

- Vocês serão minha escola - respondeu Jaime Miró, calmamente. - Vão me ensinar a lutar, para que eu possa vingar o assassinato da minha família.

Ele nunca olhou para trás. Lutava por si mesmo e pela família, seus feitos se tornaram lendários. Jaime planejava e executava ataques audaciosos a fábricas e bancos, comandava as execuções de opressores. Quando algum dos seus homens era capturado, ele conduzia missões temerárias para salvá-lo.

Ao ser informado da criação do "GOE" para perseguir os bascos, Jaime sorriu e comentou:

- Ótimo. Eles nos notaram.

Nunca se perguntou se os riscos que assumia se relacionavam de alguma forma com os gritos de "Seu pai é um covarde" ou se tentava provar alguma coisa a si mesmo e aos outros. Era suficiente que provasse sempre sua coragem e que não tivesse medo de arriscar a vida pelo que acreditava.

Agora, porque um dos seus homens falara demais, Jaime se descobria sobrecarregado com uma freira.

"É irónico que sua Igreja esteja agora do nosso lado. Mas é tarde demais, a menos que eles possam promover um Segundo Advento e incluam minha mãe, pai e irmãs", pensou.

Eles andaram pela floresta à noite, o luar branco salpicava a paisagem ao redor. Evitavam as cidades principais, alertas a qualquer sinal de perigo. Jaime ignorava Megan. Ia junto de Felix, conversando sobre as aventuras passadas. Megan descobriu-se intrigada. Jamais conhecera alguém como Jaime. Era um homem seguro e confiante. "Se alguém pode me levar a Mendavia, é esse homem."

Havia momentos em que Jaime sentia pena da irmã, até mesmo uma admiração relutante pela maneira como ela se comportava na árdua jornada. Especulava como seus outros homens estariam se saindo com as pupilas de Deus.

Pelo menos ele tinha Amparo. À noite, encontrava nela um grande conforto.

"Ela é tão dedicada quanto eu", pensou Jaime. "E tem ainda mais motivos do que eu para odiar o governo."

Toda a família de Amparo fora exterminada pelo Exército Nacionalista. Ela era profundamente independente e dominada por uma paixão intensa.

Ao amanhecer, estavam se aproximando de Salamanca, à margem do rio Tormes.

- Estudantes de toda a Espanha vêm cursar a universidade aqui - Felix explicou para Megan. - Provavelmente é a melhor do país.

Jaime não prestava atenção. Concentrava-se em seu próprio movimento. Se eu fosse o caçador, onde poria minha armadilha? Ele virou-se para Felix.

- Não vamos para Salamanca. Há um parador fora da cidade. Ficaremos lá até o anoitecer.

A estalagem, "o parador", era pequena, afastada do fluxo principal de turistas. Alguns degraus levavam ao saguão, guardado por uma antiga armadura de cavaleiro. Ao se aproximarem da entrada, Jaime disse às duas mulheres:

- Ele acenou com a cabeça para Felix Carpio e os dois desapareceram.

- Para onde eles vão?

Amparo lançou-lhe um olhar desdenhoso.

- Talvez estejam à procura do seu Deus.

- Espero que O encontrem - respondeu Megan, suavemente.

Os homens voltaram dez minutos depois.

- Tudo calmo - informou Jaime a Amparo. - Você e a irmã partilharão um quarto. Felix ficará comigo. - Ele entregou-lhe uma chave.

- Querido, quero ficar com você, não…

- Faça o que estou dizendo. E fique de olho nela.

Amparo olhou para Megan.

- Bueno. Vamos embora, irmã.

Megan entrou no "parador" e subiu os degraus atrás de Amparo.

O quarto era um dos doze localizados no segundo andar, ao longo de um corredor cinzento. Amparo abriu a porta, e as duas entraram. Era pequeno e desolado, escassamente mobilado, o chão de tábuas, paredes de estuque, uma cama, um pequeno catre, uma cómoda escalavrada e duas cadeiras.

Megan olhou ao redor e exclamou:

- É lindo!

Amparo virou-se com raiva, pensando que Megan estava sendo sarcástica.

- Quem é você para se queixar…?

- É tão grande… - acrescentou Megan.

Amparo fitou-a em silêncio por um momento, depois riu. Claro que devia parecer enorme, em comparação com as celas em que as irmas viviam.

Amparo começou a se despir.

Megan não pôde deixar de contemplá-la. Era a primeira vez em que realmente olhava para Amparo Jiró, à luz do dia. A mulher era muito bonita, de uma maneira simples. Tinha cabelos ruivos, pele branca, seios fartos, cintura fina e quadris que ondeavam a cada movimento.

Amparo percebeu que ela a observava.

- Irmã… poderia me dizer uma coisa? Por que alguém ingressaria para um convento?

Era uma pergunta fácil de responder.

- O que pode ser mais maravilhoso do que se devotar à glória de Deus?

- De imediato, posso pensar em mil coisas. - Amparo foi até a cama e sentou-se. - Pode dormir no catre. Pelo que me contaram, seu Deus não quer que fiquem muito confortáveis.

Megan sorriu.

- Não tem importância. Eu me sinto confortável por dentro.

Em seu quarto, no outro lado do corredor, Jaime Miró acomodou-se na cama. Felix Carpio tentava ajeitar-se no pequeno catre.

Os dois permaneciam vestidos. A arma de Jaime encontrava-se debaixo do travesseiro, a de Felix na mesinha escalavrada ao seu lado.

- O que será que as levam a fazerem isso? - especulou Felix, em voz alta.

- Fazem o quê, "amigo?"

- Ficam trancafiadas num convento a vida inteira, como prisioneiras.

Jaime Miró encolheu os ombros.

- Pergunte à irmã. Eu gostaria muito que estivéssemos viajando sozinhos. Estou com um terrível pressentimento.

- Jaime, Deus nos agradecerá por esta boa ação.

- Acredita mesmo nisso? Não me faça rir.

Felix Carpio não insistiu no assunto. Não era conveniente discutir sobre a Igreja Católica com Jaime. Os dois ficaram em silêncio, cada um absorto em seus pensamentos.

Felix Carpio estava pensando: "Deus pôs as irmãs em nossas mãos. Precisamos levá-las a salvo a um convento."

Jaime pensava em Amparo. Queria-a desesperadamente naquele momento. "Aquela maldita freira." Começou a puxar as cobertas quando se lembrou que ainda havia uma coisa a ser feita.

No saguão pequeno e escuro lá embaixo, o recepcionista estava sentado em silêncio, à espera até ter certeza que os novos hóspedes dormiam. Seu coração batia forte quando pegou o telefone e discou.

Uma voz indolente atendeu.

- Delegacia de polícia.

O recepcionista sussurrou ao telefone para o sobrinho:

- Florian, Jaime Miró e mais três terroristas estão aqui. Não gostaria de ter a honra de prendê-los?

Capítulo 22

Cento e cinquenta quilômetros para o leste, numa área de bosque no caminho para Peñafiel, Lucia Carmine dormia.