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Foi por pouco que Nynaeve conteve um suspiro de alívio ao apertar a mão que lhe fora estendida. Conseguira. Pela primeira vez no que parecia uma eternidade, alguém tentara intimidá-la sem sucesso. Sentia-se quase pronta para enfrentar Moghedien. Quase.

Elayne alcançou Min assim que a garota saiu pela porta dos fundos da estalagem, e passou a caminhar ao lado dela. Min tinha o que pareciam ser duas ou três camisas brancas emboladas debaixo do braço. O sol batia nas copas das árvores e, sob a luz que se desvanecia, o pátio do estábulo tinha o aspecto suave de terra recém-revirada, com um imenso cepo que poderia ter pertencido a um carvalho bem no centro. O estábulo de pedra com telhado de palha não tinha portas, o que permitia uma boa olhada nos homens se movimentando em meio às estrebarias cheias. Surpreendentemente, Leane estava conversando com um homem corpulento no limiar da sombra do estábulo. Vestido de maneira rústica, ele parecia um ferreiro, ou um lutador. O que surpreendia era quão perto dele Leane estava, a cabeça inclinada enquanto o olhava de baixo. E então tocou a bochecha do homem, antes de se virar e voltar apressada para a estalagem. O homenzarrão ficou olhando por um momento e, em seguida, entrou nas sombras e sumiu.

— Nem me pergunte o que ela está tramando — antecipou-se Min. — Pessoas estranhas vêm aqui para falar com ela ou com Siuan, e alguns dos homens, ela… Bem, você viu.

Elayne não dava a mínima para o que Leane fazia. Porém, agora que estava sozinha com Min, não sabia como puxar o assunto que queria.

— O que você está fazendo?

— Lavando roupa — resmungou Min, mexendo irritada nas camisas. — Não tenho como dizer como é bom ver Siuan sendo o rato, ao menos uma vez. Ela não sabe se a águia vai comê-la ou fazer dela um bichinho de estimação, mas tem as mesmas opções que oferece aos outros: nenhuma!

Elayne apertou o passo para acompanhá-la quando as duas atravessaram o pátio do estábulo. Não sabia de que se tratava, mas aquilo não dava abertura para o assunto que queria.

— Você sabia o que Thom ia sugerir? Nós vamos ficar.

— Eu disse a eles que vocês ficariam. Não foi uma visão. — O passo de Min voltou a ficar lento enquanto passavam entre o estábulo e uma parede de pedra quase desmoronando e desciam uma viela escura com touças de palhada e vegetação pisada. — Eu só não achei que você abriria mão da chance de estudar de novo. Você sempre ansiou por isso. Nynaeve também, mesmo que não admita. Eu queria estar errada. Iria com vocês. Ao menos eu… — Ela resmungou sozinha algo que soou furioso. — Aquelas três que vocês trouxeram é que são um problema, e isso foi uma visão.

Ali estava. A abertura de que ela precisava. No entanto, em vez de perguntar o que pretendia, Elayne disse:

— Está falando de Marigan, Nicola e Areina? Como elas podem ser um problema? — Só um tolo ignorava o que Min via.

— Não sei exatamente. Identifiquei apenas uns relances de aura, e só com o canto do olho. Nunca quando eu estava olhando diretamente para elas, quando poderia ter decifrado alguma coisa. Não são muitos os que têm auras o tempo todo, você sabe. Problemas. Talvez elas contem histórias. Vocês estavam tramando algo que não queriam que as Aes Sedai soubessem?

— Claro que não — respondeu Elayne, com rispidez. Min a olhou de soslaio, e ela acrescentou: — Bem, nada que não fosse necessário. Seja como for, elas não têm como saber. — Aquilo não estava levando ao ponto que queria. Elayne respirou fundo e saltou do penhasco: — Min, você teve uma visão sobre Rand e eu, não teve? — Deu mais dois passos antes de perceber que a outra mulher havia parado.

— Tive. — Foi uma palavra cheia de cautela.

— Você viu que iríamos nos apaixonar.

— Não exatamente. Vi que você se apaixonaria por ele. Não sei o que Rand sente por você, só que ele está preso a você de alguma forma.

Elayne comprimiu os lábios. Aquilo era mais ou menos o que esperara, mas não o que queria ouvir. “Desejar” e “querer” causam tropeços, mas “ser” prepara o caminho. Era o que Lini dizia. Tinha que lidar com o que era, não com o que desejava que fosse.

— E você viu que haveria outra pessoa. Alguém com quem… eu teria… que dividi-lo.

— Duas — disse Min com voz rouca. — Duas outras. E… E uma sou eu.

Com a boca já aberta para a pergunta seguinte, Elayne, por um momento, só conseguiu encará-la.

— Você? — conseguiu dizer, por fim.

Min se crispou.

— É, eu! Acha que não sou capaz de me apaixonar? Eu não queria, mas me apaixonei, e é isso. — Ela apertou o passo e ultrapassou Elayne na viela, que desta vez demorou mais para alcançá-la.

Aquilo certamente explicava algumas coisas: como Min sempre saía pela tangente ao tocar no assunto, de um jeito nervoso, e o bordado em suas lapelas. E, ao menos que estivesse imaginando, Min também estava usando ruge. Como eu me sinto em relação a isso?, ponderou Elayne. Não conseguiu chegar a uma conclusão.

— Quem é a terceira? — perguntou baixinho.

— Não sei — balbuciou Min. — Só sei que é geniosa. Não é Nynaeve, graças à Luz. — Ela soltou um risinho tímido. — Acho que eu não aguentaria isso. — Mais uma vez ela lançou um olhar enviesado e cauteloso na direção de Elayne. — O que isso muda entre nós duas? Eu gosto de você. Nunca tive uma irmã, mas às vezes sinto que você… Eu quero ser sua amiga, Elayne, e não vou deixar de gostar de você não importa o que aconteça, mas não tenho como deixar de amá-lo.

— Não gosto muito da ideia de ter que dividir um homem — confessou Elayne, rígida. Com certeza era um eufemismo.

— Nem eu. Só que… Elayne, tenho vergonha de admitir, mas vou aceitá-lo do jeito que for. Não que alguma de nós duas tenha muita escolha. Luz, ele bagunçou toda a minha vida. Só pensar nele bagunça minha cabeça. — Min parecia não saber se ria ou chorava.

Elayne soltou o ar devagar. Não era culpa de Min. Melhor que fosse Min do que, digamos, Berelain ou uma outra que ela não suportasse.

Ta’veren — disse ela. — Ele molda o mundo em torno dele. Somos farelos pegos em um redemoinho. Mas acho que me lembro de dizermos, eu, você e Egwene, que nunca deixaríamos um homem atrapalhar nossa amizade. Vamos dar um jeito nisso, Min. E quando descobrirmos quem é a terceira… Bem, também vamos dar um jeito nisso. De alguma maneira. — Uma terceira! Seria Berelain? Ah, sangue e cinzas!

— De alguma maneira — concordou Min em um tom desanimado. — Enquanto isso, nós estamos presas aqui com uma corrente no tornozelo. Sei que há outra, sei que não posso fazer nada a respeito, mas já tive problemas demais aceitando que seria você e… nem todas as cairhienas são como Moiraine. Uma vez eu vi uma nobre cairhiena em Baerlon. Na superfície, fazia Moiraine parecer Leane, mas às vezes ela dizia coisas, fazia insinuações… E as auras dela! Acho que homem nenhum na cidade inteira estava seguro sozinho com ela, a menos que fosse feio, chato ou, melhor ainda, estivesse morto.

Elayne bufou, mas conseguiu suavizar a voz.

— Não se preocupe com isso. Temos outra irmã, você e eu, uma que você ainda não conhece. Aviendha está vigiando Rand de perto, e ele não dá dez passos sem a presença de uma guarda das Donzelas da Lança. — Uma cairhiena? Pelo menos Berelain ela conhecia, sabia algo a seu respeito. Não. Não ia se preocupar com aquilo como uma desmiolada. Qualquer mulher feita lidava com o mundo como ele era e extraía o melhor disso. Mas quem poderia ser?

As duas tinham ido parar em um jardim pontilhado de freixos. Enormes caldeirões, em sua maioria esburacados onde a ferrugem fora raspada, repousavam junto ao muro de pedra que circundava a área e que fora derrubado em vários pontos pelas árvores que cresciam por entre ele. Apesar das sombras cortando o jardim, dois caldeirões fervendo ainda tinham o fogo aceso, e três noviças, os cabelos ensopados de suor e as saias brancas levantadas e amarradas, trabalhavam pesado em tábuas de bater roupa mergulhadas em espaçosas tinas cheias de água com sabão.