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Pensando bem, aliás, ele não sabia como aqueles três haviam se quebrado. Se nenhuma força além da do Criador podia quebrar a pedra-do-coração, então não deveria haver jeito.

— Como? — perguntou ele, surpreso por sua voz ainda estar tão firme quanto quando estava cercado pelo Vazio.

— Não sei — respondeu Moiraine, demonstrando a mesma calma. — Mas você percebe o problema? Este objeto poderia se quebrar caindo de cima da mesa. Se os outros, onde quer que estejam, se encontrarem no mesmo estado, quatro homens com martelos poderiam abrir a prisão do Tenebroso. Quem pode sequer garantir a eficiência dos selos, se estão nessas condições?

Rand percebia. Ainda não estou pronto. E não tinha certeza se algum dia estaria, mas com certeza ainda não estava. Egwene parecia encarar a própria cova.

Moiraine reembrulhou o disco e o recolocou na bolsa.

— Talvez eu pense em alguma possibilidade, antes de levar isto a Tar Valon. Se descobrirmos o porquê, talvez possamos tomar uma providência.

A imagem do Tenebroso escapando outra vez de Shayol Ghul, libertando-se completamente, não saía da cabeça de Rand. Em sua mente, o fogo e as trevas cobriam o mundo, chamas que consumiam e não provinham luz, e uma escuridão tão sólida quanto pedra comprimia o ar. Com tudo isso preenchendo os pensamentos, as palavras que Moiraine acabara de dizer levaram alguns instantes para serem absorvidas.

— Você pretende ir pessoalmente? — Rand imaginara que a intenção dela fosse grudar-se a ele feito o limo a uma rocha. Não é isso o que você quer?

— Em algum momento — respondeu a mulher, calma. — No fim das contas, terei que deixar você… em algum momento. O que tiver que ser, será.

Rand pensou vê-la tremer, mas foi tão rápido que podia ter sido coisa da sua imaginação. No instante seguinte, Moiraine voltou a ser pura compostura e autocontrole.

— Você precisa estar pronto. — Foi desagradável ouvir um lembrete sobre as próprias dúvidas. — Deveríamos discutir seus planos. Você não pode ficar aqui sentado por muito mais tempo. Mesmo que os Abandonados não estejam planejando vir atrás de você, estão por aí ampliando o poder que têm. Reunir os Aiel não vai servir de nada se acabar descobrindo que todas as terras além da Espinha do Mundo estão nas mãos dos inimigos.

Rindo, Rand recostou-se contra a mesa. Então, tudo aquilo não passava de mais um jogo. Se estivesse ansioso para vê-la partir, poderia ficar mais disposto a escutá-la, mais receptivo a ser guiado. Moiraine não podia mentir, não diretamente. Um dos famosos Três Juramentos dava conta disso: não pronunciar nenhuma palavra que não fosse verdadeira. Rand já aprendera que aquele juramento deixava uma enorme margem de manobra. A Azul o deixaria em algum momento. Depois que ele estivesse morto, sem dúvida.

— Você quer discutir meus planos? — perguntou, seco. Rand tirou do bolso do casaco um cachimbo curto e uma bolsa de couro com tabaco, apertou o fumo com o polegar e tocou saidin por um breve instante para canalizar uma chama. — Por quê? Os planos são meus. — Pitando vagarosamente, ele esperou, ignorando o olhar fixo de Egwene.

O rosto da Aes Sedai não se alterou, mas os grandes olhos escuros pareciam pegar fogo.

— O que você fez quando se recusou a ser guiado por mim? — A voz estava tão tranquila quanto a expressão, mas as palavras ainda pareciam sair da boca feito o estalar de um chicote. — Por onde passou, você só deixou morte, destruição e guerras.

— Em Tear, não — retrucou Rand, rápido e na defensiva demais. Não podia permitir que Moiraine o desestabilizasse. Determinado, pitou o cachimbo calma e deliberadamente.

— Não — concordou ela. — Em Tear, não. Uma única vez, havia uma nação por trás de você, um povo, e o que você fez? Levar justiça a Tear foi digno de aplausos. Estabelecer a ordem em Cairhien, alimentar os famintos, tudo louvável. Em outras circunstâncias, eu o elogiaria. — Ela própria era cairhiena. — Mas nada disso o ajudará a encarar o dia em que Tarmon Gai’don chegar. — Uma mulher obstinada, indiferente a qualquer outra questão, até à própria terra natal. Mas ele não deveria ter a mesma obstinação?

— O que quer que eu faça? Cace os Abandonados um a um? — Uma vez mais, se obrigou a fumar o cachimbo devagar. Foi um esforço. — Você ao menos sabe onde eles estão? Ah, Sammael está em Illian, disso você sabe, mas e os outros? E se eu fosse atrás de Sammael, como você deseja, e encontrasse dois, três ou quatro deles por lá? Ou todos os nove?

— Você poderia enfrentar três ou quatro, talvez até os nove, e ainda sobreviveria — rebateu a mulher, gélida. — Bastava não ter deixado Callandor em Tear. A verdade é que você está fugindo. Não tem um plano de fato, não tem uma estratégia para se preparar para a Última Batalha. Você foge de um lugar a outro torcendo para que, de alguma forma, tudo termine da melhor maneira possível. Torcendo, porque não sabe o que mais pode fazer. Se aceitasse meus conselhos, ao menos… — Rand a interrompeu com um gesto abrupto do cachimbo, sem dar a mínima para os olhares que as duas mulheres lhe lançavam.

— Eu tenho um plano, sim. — Se elas queriam saber, que soubessem, e que a Luz o queimasse se mudasse uma palavra de sua estratégia. — Primeiro, pretendo pôr um fim nas guerras e na matança, não importa se elas começaram por minha causa ou não. Se homens precisarem matar, que matem Trollocs, não uns aos outros. Na Guerra dos Aiel, quatro clãs atravessaram a Muralha do Dragão e obtiveram êxito durante mais de dois anos. Eles pilharam e incendiaram Cairhien, derrotaram todos os exércitos que foram enviados para enfrentá-los. Poderiam ter conquistado Tar Valon, se quisessem. Por conta dos Três Juramentos de vocês, a Torre não teria como pará-los. — Não usar o Poder como arma, exceto contra Filhos das Sombras e Amigos das Trevas, ou para defender a própria vida, era mais um dos Juramentos, e os Aiel não haviam ameaçado a Torre propriamente dita. A raiva tomava conta dele. Fugindo e torcendo, é? — Quatro clãs fizeram isso. O que vai acontecer quando eu liderar onze deles para além da Espinha do Mundo? — Teriam de ser onze. Havia poucas esperanças de contar com os Shaido. — Quando as nações começarem a pensar em se unir, já vai ser tarde demais. Eles vão aceitar minha paz, ou vou ser enterrado em Can Breat. — Um dedilhado dissonante emergiu da harpa, e Natael curvou-se sobre o instrumento, balançando a cabeça. Instantes depois, os sons suaves ressurgiram.

— Um melão teria que passar muito do ponto para se comparar à sua cabeça — resmungou Egwene, cruzando os braços. — E nem uma pedra conseguiria ser tão teimosa! Moiraine só está tentando ajudar. Por que não enxerga isso?

Embora não fosse necessário, a Aes Sedai ajeitou as saias de seda.

— Levar os Aiel para além da Muralha do Dragão talvez seja a pior coisa que você poderia fazer. — Havia um quê a mais na voz dela, raiva ou frustração. Pelo menos ele estava deixando bem claro que não era um fantoche. — A esta altura, o Trono de Amyrlin já está se aproximando dos governantes de cada nação que ainda tiver um para dar a eles todas as provas de que você é o Dragão Renascido. Eles conhecem as Profecias, sabem o que você nasceu para fazer. Assim que estiverem convencidos de quem você é e do que é capaz, vão aceitá-lo porque precisam aceitar. A Última Batalha se aproxima, e você é a única esperança deles, a única esperança da humanidade.

Rand soltou uma sonora mas amarga gargalhada. Enfiando o cachimbo entre os dentes, ergueu-se para sentar-se de pernas cruzadas em cima da mesa, olhando para as mulheres.