— Bem, chame Transporte e consiga os detalhes. Psicopata ou não, os detalhes devem estar em nossos registros.
O analista espacial detivera-se novamente na dia seguinte para uma verificação de última hora antes que deixasse o planeta. Tinha outras questões a atender em outros mundos, e tinha uma pressa moderada. Quase à porta de saída, disse, por sobre o ombro: — Como está se saindo nosso homem de campo?
— Ah, claro, tencionava contar-lhe — respondeu o agente. — Transporte não teve notícias dele. Mandei um padrão de energia de seus motores hiperatômicos e disseram que sua nave não está em parte alguma do espaço próximo. O rapaz deve ter mudado de idéia na hora da aterrissagem.
O Dr. Junz decidiu adiar sua partida por vinte e quatro horas. No dia seguinte estava no Departamento de Transporte Extraplanetário em Sark City, capital do planeta. Encontrou os burocratas florinianos pela primeira vez e lá acenaram para ele. Haviam recebido a mensagem relativa à aterrissagem esperada de um analista do DAI. Sim, receberam, mas nenhuma nave pousara.
Mas era importante, e o Dr. Junz insistiu. O homem estava muito doente. Não haviam recebido uma cópia da transcrição de sua conversa com o agente do DAI local? Arregalaram os olhos para ele. Transcrição? Não conseguiram encontrar ninguém que se lembrasse de tê-la recebido. Sentiam muito que o homem estivesse doente, mas nenhuma nave do DAI havia pousado, e não havia nenhuma nave do DAI em parte alguma do espaço próximo.
O Dr. Junz retornou a seu quarto de hotel e pensou em muitas coisas. Um novo prazo final para sua partida havia se esgotado. Pediu uma escrivaninha e arranjou que fosse transferido para outra suíte mais adequada a uma ocupação mais prolongada. Então arranjou uma entrevista com Ludigam Abel, o embaixador trantoriano.
Passou o dia seguinte lendo livros sobre a história sarkiana, e quando estava na hora da entrevista com Abel, seu coração tornara-se um lento rufar de irritação. Não iria desistir facilmente, sabia.
O velho embaixador tratou disso como uma obrigação social, apertou sua mão, fez sua coqueteleira mecânica trabalhar, e não permitiria qualquer discussão de negócios durante os primeiros dois drinques. Junz aproveitou a oportunidade para pequenos assuntos que valiam a pena, perguntou sobre o Funcionalismo Público Floriniano e recebeu a exposição da genética prática de Sark. Sua sensação de irritação intensificou-se.
Junz sempre se lembrava de Abel como ele fora naquele dia. Olhos fixos semicerrados sob sobrancelhas surpreendentemente brancas, nariz largo pairando intermitentemente sobre seu copo de vinho, malares rasos que acentuavam a magreza de sua face e de seu corpo, e um dedo torcido lentamente marcando compasso de alguma música não ouvida. Junz começou sua história, contando-a com impassível moderação. Abel escutava atentamente e sem interrupção.
Quando Junz terminou, ele bateu delicadamente em seus lábios e disse: — Agora ouça, você conhece este homem que está desaparecido?
— Não.
— Nunca o viu?
— Nossos analistas de campo são homens difíceis de se encontrar,
— Ele já havia tido delusões antes disto?
— Esta é a sua primeira, de acordo com os registros nos escritórios centrais do DAI, se for uma delusão.
— Se? — O embaixador não o entendera. Disse: — E por que você veio a mim?
— À procura de ajuda.
— Obviamente. Mas como? O que posso fazer?
— Deixe-me explicar. O Departamento de Transporte Extra-planetário Sarkiano verificou o espaço próximo quanto aos padrões de energia dos motores da nave de nosso homem, e não há sinal dele. Eles não mentiriam a respeito disso. Não vou dizer que os sarkianos estejam acima das mentiras, mas que certamente estão acima de mentiras inúteis, e devem saber que eu posso verificar o assunto no espaço de duas a três horas.
— Verdade. E então?
— Há duas ocasiões em que o rastro do padrão de energia pode falhar: Primeira, quando a nave não estiver no espaço próximo por que saltará para o hiperespaço e estará em outra região da Galáxia, e, segunda, quando não estiver absolutamente no espaço porque estará pousada em um planeta. Não posso acreditar que nosso homem tenha saltado. Se suas afirmações sobre o risco para Florina e a importância a nível de Galáxia forem delusões megalomaníacas nada o impediria de vir a Sark para relatá-las. Não teria mudado de idéia e abandonado tudo. Eu tenho experiência de quinze anos com coisas assim. Se, por uma chance qualquer, suas afirmações fossem sensatas e reais, então certamente o assunto seria tão sério que não mudaria de idéia e deixaria o espaço próximo.
O velho trantoriano levantou um dedo e agitou-o gentilmente.
— Você então concluiu que ele está em Sark.
— Exatamente. Novamente existem duas alternativas. Primeira, se ele estiver sob controle de uma psicose, pode ter pousado em qualquer lugar no planeta que não um espaçoporto reconhecido. Pode estar vagando por aí doente e semi-amnésico. Essas coisas são muito incomuns, mesmo para um homem de campo, mas têm acontecido. Normalmente num caso desses, os ataques são temporários. Quando passam, a vítima descobre-se lembrando-se primeiro dos detalhes de seu trabalho, antes de qualquer memória pessoal. Afinal, o trabalho do analista espacial é sua vida. Com muita freqüência a amnésia é retraída porque ele vaga até encontrar uma biblioteca pública para procurar referências quanto à Análise Espacial.
— Entendo. Então você quer que eu o ajude a arranjar com o Conselho de Libairianos que tal situação fique sob sua responsabilidade.
— Não, pois não prevejo qualquer problema aqui. Pedirei que certas palavras-chaves da Análise Espacial sejam guardadas em segredo e que qualquer homem que perguntar por elas, que não possa provar que é um nativo sarkiano, seja detido para interrogatório. Concordarão com isso já que saberão, ou certamente seus superiores saberão, que tal plano não levará a nada.
— Por que não?
— Porque — e Junz agora falava rapidamente, tomado de um acesso trêmulo de fúria — eu estou certo de que nosso homem pousou no espaçoporto de Sark City exatamente como planejou e, são ou psicótico, foi então aprisionado e provavelmente assassinado pelas autoridades sarkianas.
Abel pousou seu copo quase vazio. — Você está brincando?
— Pareço estar? O que me contou há somente meia hora atrás sobre Sark? Suas vidas, prosperidade e poder dependem de seu controle sob Florina. O que toda investigação que fiz nestas últimas vinte e quatro horas mostrou-me? Que os campos kyrt de Florina são a riqueza de Sark. E então chega um homem, são ou psicótico, não importa, que afirma que algo de importância galáctica pôs a vida de todos os habitantes de Florina em risco. Veja esta transcrição da última conversação conhecida de nosso homem.
Abel pegou o pedaço de filme que fora atirado sobre seu colo por Junz e aceitou o leitor que segurava para ele. Passou-o lentamente, seus olhos enfraquecidos pestanejando e esquadrinhando a ocular.
— Não é muito informativo.
— Claro que não. Diz que há um risco. Diz que há horrível premência. Isto é tudo. Mas nunca deveria ter sido enviado aos sarkianos. Mesmo se o homem estivesse errado, poderia o governo sarkiano permitir que ele disseminasse qualquer loucura, admitindo-se que fosse loucura, que tivesse em sua mente e enchesse a Galáxia com ela? Deixando de lado o pânico que poderia gerar em Florina, a interferência na produção de fios kyrt, permanece o fato de que toda confusão suja nas relações políticas Sark-Florina seria exposta à visão da Galáxia como um todo. Considere o que precisam fazer com somente um homem para evitar tudo isso, já que eu não posso começar a agir com base somente nesta transcrição, e eles sabem disso. Sark hesitaria em terminar um caso como esse com um homicídio? O mundo de tais experimentadores genéticos, como você descreveu, não hesitaria.