Estava determinada a investigar o assunto para sua própria satisfação pessoal. Ninguém era tão modesto que não se acreditasse um competente detetive amador, e Samia estava muito longe de ser modesta.
Depois do jantar, tão logo quanto polidamente pôde, apressou-se na direção da cela.
— Abra a porta! — disse ao guarda.
O marinheiro permaneceu perfeitamente ereto, olhando estúpida e respeitosamente para a frente, Disse: — Se Sua Senhoria me perdoar, a porta não será aberta.
Samia suspirou. — Como ousa dizer isso? Se você não abrir a porta instantaneamente, o Capitão será informado.
— Se Sua Senhoria tiver a bondade, a porta não será aberta. Isto por ordem estrita do Capitão,
Uma vez mais ela armou a maior tempestade, explodindo no camarote do Capitão como um furacão comprimido em um metro e meio.
— Capitão!
— Madame?
— Ordenou que o terráqueo e a mulher nativa fossem mantidos afastados de mim?
— Creio, Madame, que havia um acordo de que somente se entrevistasse com eles na minha presença.
— Antes do jantar, sim. Mas você não viu que eram inofensivos?
— Eu vi que eles pareciam inofensivos,
Samia fervia de raiva. — Neste caso eu lhe ordeno que venha comigo agora.
— Não posso, Madame. A situação mudou.
— De que maneira?
— Eles devem ser interrogados pelas autoridades competentes em Sark e até então eu acho que devem ser deixados sozinhos,
O maxilar inferior de Samia caiu, mas ela o livrou de sua indigna posição quase imediatamente. — Certamente você não vai entregá-los ao Departamento de Assuntos Florinianos.
— Bem — contemporizou o Capitão — certamente esta era a intenção original. Deixaram sua vila sem permissão. De fato, deixaram seu planeta sem permissão. Além disso, embarcaram como clandestinos em uma nave sarkiana.
— Este foi um erro.
— Foi?
— Em todo caso, você conhecia todos os seus crimes antes de nossa última entrevista.
— Mas foi somente na entrevista que ouvi o que o assim-chamado terráqueo tinha a dizer.
— O assim-chamado. Você mesmo disse que o planeta Terra existia.
— Eu disse que poderia existir. Mas, Madame, posso ser arrojado o bastante para perguntar o que gostaria que fosse feito com estas pessoas?
— Eu acho que a história do terráqueo deve ser investigada. Ele fala de um risco para Florina e de alguém em Sark que deliberadamente tentou esconder tal fato das autoridades adequadas. Acho que é mesmo um caso para meu pai. De fato eu o levaria a meu pai, quando a hora certa chegasse.
O Capitão disse: — A inteligência disso tudo!
— Está sendo sarcástico, Capitão?
O Capitão enrubesceu. — O seu perdão, Madame. Estava me referindo aos prisioneiros. Pode me deixar falar por algum tempo?
— Não sei o que você quer dizer com “algum tempo” — retorquiu ela colericamente — mas eu acho que você pode começar.
— Obrigado. Em primeiro lugar, Madame, espero que não minimize a importância dos distúrbios em Florina.
— Que distúrbios?
— Não pode ter esquecido o incidente na biblioteca.
— Um patrulheiro assassinado! Realmente, Capitão!
— E um segundo patrulheiro assassinado esta manhã, Madame, e também um nativo. Não é muito normal para os nativos assassinar patrulheiros e aqui temos um que o fez duas vezes, e ainda permanece solto. Está sozinho nisso? um acidente? Ou isto tudo é parte de um esquema cuidadosamente planejado?
— Aparentemente você acredita nessa última possibilidade.
— Sim, acredito, O nativo assassinado tinha dois cúmplices. Sua descrição é particularmente como a dos dois clandestinos.
— Você nunca disse isso!
— Não desejava alarmar Sua Senhoria. Lembre-se, entretanto, que eu repetidamente lhe disse que poderiam ser perigosos.
— Muito bem, O que resulta de tudo isso?
— Que tal se os assassinatos de Florista fossem simplesmente uma fachada para distrair a atenção dos esquadrões de patrulheiros enquanto estes dois embarcavam sorrateiramente em nossa nave?
— Isto parece tolice.
— Parece? Por que estão fugindo de Florina? Ainda não lhes perguntamos. Vamos supor que estejam fugindo dos patrulheiros, já que é a suposição mais adequada. Estariam fugindo para Sark, podendo escolher qualquer outro lugar? E numa nave que transporta Sua Senhoria? E então ele alega ser um analista espacial.
Samia franziu as sobrancelhas: — E o que tem isso?
— Um ano atrás, um analista espacial foi dado como desaparecido. A história não teve muita repercussão. Eu sabia, claro, porque minha nave era uma das que vasculhavam o espaço próximo atrás de sinais de sua nave. Quem quer que esteja dando apoio a estes desordeiros florinianos indubitavelmente domina o fato, e exatamente o conhecimento da questão do desaparecimento do analista espacial por parte deles mostra a organização ajustada e inesperadamente eficiente que eles têm.
— Pode ser que o terráqueo e o analista espacial não tenham nenhuma ligação.
— Nenhuma ligação real, Madame, sem dúvida. Mas não esperar qualquer ligação é esperar muita coincidência. Estamos lidando com um impostor. Por isso é que ele afirma ter sido psico-sondado.
— É?
— Como podemos provar que ele não é um analista espacial? Não conhece detalhes do planeta Terra além do fato banal de que é radiativo. Não pode pilotar uma nave. Não sabe coisa alguma a respeito de análise espacial. Protege-se insistindo que foi psico-sondado. Percebe, Madame?
Samia não podia fazer uma pergunta direta. — Mas com que propósito? — interpelou.
— Dessa forma poderia fazer exatamente o que disse que tencionava fazer, Madame.
— Investigar o mistério?
— Não, Madame. Levar o homem a seu pai.
— Não entendo a idéia ainda.
— Existem algumas probabilidades. Na melhor das hipóteses, poderia ser um espião contra seu pai, ou de Florina, ou possivelmente de Trantor. Eu imagino que o velho Abel de Trantor certamente iria apresentar-se para identificá-lo como um terráqueo, se por nenhuma outra razão além de embaraçar Sark ao exigir a verdade relativa a esta fictícia psico-sondagem Na pior das hipóteses, ele seria o assassino de seu pai.
— Capitão!
— Madame?
— Isto é ridículo!
— Talvez, Madame. Mas se for assim, o Departamento de Segurança também é ridículo. Deve se recordar que pouco antes do jantar eu fui chamado para receber uma mensagem de Sark.
— Sim.
— Ei-la.
Samia recebeu a fina lâmina translucente com uma inscrição ver melha. Dizia: “Dois florinianos foram denunciados como estando em trânsito secreto e ilegal em sua nave. Prenda-os imediatamente. Um deles pode alegar ser um analista espacial e não um nativo floriniano. Não deve tomar qualquer iniciativa a este respeito. Será considerado estritamente responsável pela segurança dessas pessoas. Devem ser detidas e entregues ao Depseg. Máximo sigilo. Máxima urgência”.
Samia sentiu-se atordoada. — Depseg — disse. — O Departamento de Segurança.
— Máximo sigilo — disse o Capitão. — Fiz uma exceção ao contar-lhe sobre isto, mas não me deixou escolha, Madame.
— O que farão com ele? — perguntou.
— Não posso dizer com certeza — disse o Capitão. — Certamente um espião e assassino suspeito não pode esperar um tratamento gentil. Provavelmente sua pretensão irá tomar-se parcialmente uma realidade e ele saberá como é realmente uma psico-sondagem.