Abel baixou a cabeça. Então balançou-a aborrecidamente. — Não, Junz. O que você diz me interessa, mas não é prático. Não posso depender de emoções contra o efeito político assegurado de qualquer tentativa de encerrar o comércio do kyrt. Na verdade, eu acho que poderia ser sensato evitar investigar a teoria. A idéia de que pudesse ser verdadeira faria muito mal.
— Mas, e se for verdadeira?
— Devemos trabalhar na hipótese de que não seja. Eu acho que quando você saiu momentos atrás, foi para fazer contato com o DAI.
— Foi.
— Não importa. Trantor, eu acho, terá bastante influência para impedir as investigações.
— Temo que não. Não estas investigações. Cavalheiros, logo teremos o segredo do kyrt sintético. Não haverá mais monopólio de kyrt dentro de um ano, haja ou não uma nova.
— O que você quer dizer com isso?
— A conferência está atingindo o ponto essencial agora, Fife. O kyrt cresce somente em Florina, entre todos os planetas habitados. Suas sementes produzem celulose comum em qualquer outro lugar. Florina provavelmente é o único planeta habitado, numa base estatística, que correntemente tem uma pré-nova, e provavelmente ela tem sido pré-nova desde que penetrou na corrente de carbono, talvez a milhares de anos atrás, se o ângulo de intersecção foi pequeno. Parece totalmente provável, então, que o kyrt e o estágio de pré-nova estejam associados.
— Bobagem — disse Fife.
— é? Deve haver uma razão para que o kyrt seja kyrt em Florina e algodão em qualquer outro lugar. Os cientistas têm tentado de muitas formas produzir artificialmente o kyrt em outro lugar qual quer, mas tentaram cegamente, por isso sempre falharam. Agora saberão que foi devido aos fatores induzidos por um sistema estelar de pré-nova.
Fife falou desdenhosamente: — Eles têm tentado duplicar as qualidades de radiação do Sol de Fife.
— Com arcos de luz adequados, sim, que reproduzem somente o espectro visível e o ultravioleta. E quanto à radiação do infra vermelho e além? E quanto aos campos magnéticos? E quanto à emissão de elétrons? E quanto aos efeitos dos raios cósmicos? Eu não sou um bioquímico físico de forma que podem existir fatores de que eu não sabia coisa alguma. Mas os que são bioquímicas físicos estarão pesquisando toda urna Galáxia de fatores. Dentro de um ano, eu lhe asseguro, a solução será encontrada.
— A economia está do lado da humanidade agora. A Galáxia quer kyrt barato, e se o descobrirem ou mesmo se imaginarem que podem descobri-lo em breve, irão querer Florina evacuada, não somente de seres humanos, mas terão o desejo de virar o feitiço, a longo prazo, contra os piratas do kyrt sarkianos.
— Blefe! — rosnou Fife.
— Você pensa assim, Abel? — interpelou Junz. — Se você ajudar os Nobres, Trantor será olhado não como o salvador do comércio do kyrt, mas sim do monopólio do kyrt. Você pode arriscar isso? Pode?
— Pode Trantor arriscar uma guerra? — interpelou Fife.
— Guerra? Besteira! Nobre, em um ano suas propriedades em Florina estarão imprestáveis, com ou sem nova. Venda-as. Venda toda Florina. Trantor pode pagar por ela.
— Comprar um planeta? — disse Abel com desânimo.
— Por que não? Trantor tem os fundos, e seu ganho de boa vontade entre a gente do universo dará um retorno mil vezes maior. Se dizer-lhes que estão salvando centenas de milhões de vidas não for o bastante, diga-lhes que vocês lhes darão kyrt barato. Isto será suficiente.
— Pensarei nisso — disse Abel.
Abel olhou para o Nobre. Os olhos de Fife baixaram.
Depois de uma longa pausa, ele também disse: — Pensarei nisso.
Junz riu estridentemente. — Não pensem muito. A história do kyrt vai vazar incrivelmente rápido. Nada pode pará-la. Depois disso, nenhum de vocês terá liberdade de ação. Cada um de vocês pode conseguir uma barganha melhor agora.
O Conselheiro parecia abatido. — É verdade mesmo? — continuava repetindo. — Verdade mesmo? Nunca mais Florina?
— É verdade — disse Junz.
Terens abriu os braços, então deixou-os cair contra as pernas.
— Se você quiser os papéis que peguei de Rik, estão arquivados entre dados estatísticos vitais na minha cidade natal. Eu coloquei no arquivo morto, registros de um século atrás ou mais. Ninguém jamais olharia lá por qualquer razão.
— Olhe — disse Junz —, estou certo de que podemos fazer um acordo com o DAI. Precisaremos de um homem em Florina, alguém que conheça o povo floriniano, que possa nos dizer como explicar os fatos a ele, como melhor organizar a evacuação, como escolher os planetas mais adequados para refúgio. Vai nos ajudar?
— E desse jeito ganhar o jogo, você quer dizer? Dar adeus ao assassino? Por que não? — Haviam lágrimas inesperadas nos olhos do Conselheiro. — Mas de qualquer modo eu perdi. Não terei mundo, não terei um lar. Todos perderemos. Os florinianos perdem seu mundo, os sarkianos perdem sua riqueza, os trantorianos sua chance de obter essa riqueza. Afinal não há vencedores.
— A não ser — disse gentilmente Junz — que você imagine que na nova Galáxia — uma Galáxia livre do terror da instabilidade estelar, uma Galáxia com kyrt disponível para todos, e uma Galáxia em que a unificação política estará muito mais próxima — haja vencedores afinal. Um quatrilhão de vencedores. O povo da Galáxia, ele é o vencedor.
Epílogo
Um Ano Depois
— Rik! Rik! — Selim Junz apressou-se através dos jardins do porto na direção da nave, mãos estendidas. — E Lona! Eu nunca teria reconhecido qualquer um de vocês. Como vão? Como vão?
— Tão bem quanto poderíamos desejar. Sua carta chegou até nós, como pode ver — disse Rik.
— Claro. Digam-me, o que acham disso tudo? — Estavam voltando, juntos, para os escritórios de Junz.
Valona falou tristemente: — Visitamos nossa antiga cidade esta manhã. Os campos estão tão vazios! — Suas roupas agora eram de uma mulher do Império, em vez das de uma camponesa de Florina.
— É, deve ser melancólico para uma pessoa que viveu aqui. Torna-se melancólico até mesmo para mim, mas ficarei enquanto puder. Os registros da radiação do Sol de Florina são de tremendo interesse teórico.
— Tamanha evacuação em menos de um ano! Mostra uma excelente organização.
— Estamos fazendo o melhor que podemos, Rik. Ah, eu acho que devia chamá-lo pelo seu nome verdadeiro.
— Por favor, não. Nunca me acostumarei a ele. Sou Rik. Este ainda é o único nome de que me lembro.
— Você decidiu se vai retomar à Análise Espacial? — disse Junz.
Rik balançou a cabeça. — Decidi, mas a decisão é não. Nunca me lembrarei o suficiente. Esta parte foi-se para sempre. Não me aborrece, porém. Vou retornar à Terra… A propósito, tinha esperança de ver o Conselheiro.
— Acho que não. Ele decidiu ir embora hoje. Eu acho que ele preferia não ver você. Ele se sente culpado, acho. Você não tem ressentimentos contra ele?
— Não — disse Rik. — Ele tinha boas intenções, e mudou minha vida em muitos aspectos para melhor. Um deles, encontrei Lona. — Seu braço enlaçou o ombro da garota.
Valona olhou para ele e sorriu.
Além disso — Rik continuou — ele me curou de alguma coisa. Eu descobri por que eu era um analista espacial. Sei por que quase um terço de todos os analistas espaciais é recrutado em um só planeta, a Terra. Qualquer pessoa que viva em um mundo radiativo está fadada a crescer em medo e insegurança. Um passo em falso pode significar morte e a superfície de nosso próprio planeta é o maior inimigo que temos.