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— Quando ela encontrar outro no caminho, vai ficar realmente perturbada — e a mulher continuou —, especialmente com Marty tendo se mudado para a casa da garçonete…

Croyd lembrou-se do colapso da mãe após a morte do pai, e uma ponta de tristeza nesse caso óbvio de demência senil despertou em seu peito. Mas… ele se perguntou. Seu novo poder, sua capacidade de influenciar os padrões de pensamento alheios, poderia ter algum efeito terapêutico em uma pessoa como essa? Tinha um pouco de tempo para passar ali. Talvez…

— Ouça — disse ele para a mulher, pensando de forma clara e simples, concentrando-se nas imagens. — Você está aqui, agora, no presente. Você está sentada na entrada de uma porta, observando a neve…

— Desgraçado! — a mulher gritou para ele, seu rosto não mais pálido, a mão lançando-se na direção das bolsas. — Cuide da sua vida! Não quero o agora e a neve! Machuca!

Ela abriu a bolsa, e a escuridão dentro desta se expandiu enquanto Croyd assistia… seguindo na direção dele, preenchendo todo o seu campo de visão, levando-o de repente para várias direções, torcendo-o e…

A mulher, agora sozinha na porta, fechou a bolsa, olhou para a neve por um momento e disse:

— … então eu disse para ela: “Os homens não são bons de pagar pensão. Às vezes você precisa botar advogado em cima deles. Aquele moço bacana da Defensoria Pública vai dizer a você o que fazer”. E, então, o Charlie, que estava trabalhando na pizzaria…

A cabeça de Croyd doía e ele não estava acostumado a sentir essa dor. Nunca tinha ressacas, porque metabolizava o álcool com grande rapidez, mas aquela sensação era como ele imaginava uma ressaca.

Então, sentiu as costas, as pernas e o traseiro molhados, além da parte de trás dos braços. Estava estirado em algum lugar frio e úmido. Decidiu abrir os olhos.

O céu estava claro e a tarde caía entre os prédios, com algumas poucas estrelas brilhantes já no céu. Era para estar nevando. Também era tarde. Ele se sentou. O que acontecera nas últimas horas e…

Viu uma caçamba de lixo. Viu um monte de garrafas de uísque e de vinho vazias. Estava num beco, mas…

Não era o mesmo beco. Os prédios eram baixos, não havia caçamba no outro, e não conseguia localizar a porta onde estivera com a velha.

Massageou as têmporas, sentiu o pulsar começando a diminuir. Aquela velha… Que diabos era aquela coisa preta com a qual ela o atingiu quando estava tentando ajudá-la? Ela havia tirado de uma de suas sacolas e…

Sacolas! Ele procurou freneticamente pelo saco de lixo com os restos cuidadosamente separados do diminuto joão-ninguém. Então, viu que ainda o segurava na mão direita, e que havia sido virado de cabeça para baixo e rasgado.

Levantou-se e olhou em volta para o brilho tremeluzente de um poste distante. Viu as embalagens espalhadas ao redor e as contou rapidamente. Nove. Ufa. Todas as nove estavam à vista, e viu então os membros, a cabeça, o tórax — embora o tórax estivesse quebrado em quatro partes e a cabeça parecesse muito mais brilhante do que antes. Por causa da umidade, talvez. O pote! Onde está? O líquido poderia ser muito importante para fosse lá quem quisesse os restos mortais. Se o pote tiver se quebrado…

Ele lançou um grito rápido quando o viu nas sombras, próximo da parede à sua esquerda. A tampa não estava lá, nem cerca de três centímetros de vidro abaixo de onde ela deveria estar. Ele foi até ele e, pelo cheiro, sabia que era a coisa de verdade e não apenas água da chuva.

Juntou as embalagens, que pareciam surpreendentemente secas, e as colocou no peitoril protegido de uma janela de porão fechada. Então, recolheu as peças de quitina em um montinho. Quando recuperou as pernas, observou que ambas estavam quebradas, mas refletiu que poderia ser melhor para embalar. Então, voltou a atenção para o jarro de picles com a parte de cima cortada, e sorriu. Que simples. A resposta estava toda ao seu redor, dada pelos indigentes que frequentavam a área.

Ele juntou uma braçada de garrafas vazias e as carregou para o lado, onde ele as pousou e começou a tirar as rolhas e tampas. Quando terminou, decantou o líquido escuro.

Foram oito garrafas de vários tamanhos, e ele as deixou no peitoril com as embalagens em cima de um pequeno amontoado de exoesqueleto e cartilagens estilhaçados. Parecia que havia cada vez menos do cara toda vez que era desembalado. Talvez tivesse algo a ver com o jeito que estava dividido agora. Talvez precisasse de álgebra para entender.

O som de passos rápidos ia e vinha. Ele se virou, erguendo as mãos para se defender, mas não havia ninguém por perto. Então, ele o enxergou. Um pequeno homem de casaco muitas vezes mais largo que ele parou por um momento no parapeito da janela, onde pegou uma das garrafas maiores e duas das embalagens. Então, saiu correndo de imediato, na direção do fim beco, onde duas outras figuras surradas esperavam.

— Ei! — Croyd gritou. — Pare! — E estendeu seu poder, mas o homem estava fora de alcance.

Tudo o que ouviu foram gargalhadas e um grito de “Hoje vamos festejar, rapazes!”.

Suspirando, Croyd retirou uma grande bola de papel vermelho e verde de Natal da caçamba e voltou à janela para embalar de novo o que sobrara dos restos.

Após ter caminhado vários quarteirões com o pacote brilhante embaixo do braço, passou por um bar que chamava The Dugout e percebeu que estava no Village. Sua testa franziu-se por um momento, mas então viu um táxi e acenou, e o carro encostou. Tudo estava bem. Até a dor de cabeça havia passado.

Jube levantou a cabeça, olhou para Croyd, sorrindo para ele.

— Como… como foi? — perguntou.

— Missão cumprida — Croyd respondeu, passando-lhe a chave.

— Você conseguiu? Rolaram uns rumores sobre Darlingfoot…

— Eu consegui.

— E os pertences.

— Não havia nenhum.

— Está certo disso, camarada?

— Absolutamente. Nada além dele, e ele está na banheira.

— Quê?

— Tudo bem, eu fechei o ralo.

— O que você está dizendo?

— Meu táxi sofreu um acidente no caminho e algumas das garrafas quebraram. Então, cuidado com o vidro quebrado quando você desembalar.

— Garrafas? Vidro quebrado?

— Ele estava, digamos… reduzido. Mas peguei tudo que restou.

— Restou?

— Disponível. Ele, tipo, se despedaçou e derreteu um pouco. Mas salvei a maior parte dele. Ele está enrolado num papel brilhante com uma fita vermelha em volta. Espero que esteja ok.

— Claro… Tudo bem, Croyd. Parece que você deu o seu melhor.

Jube passou para ele um envelope.

— Vou pagar um jantar para você no Aces High — Croyd comentou —, assim que eu tomar um banho e me trocar.

— Agradeço. Mas eu… tenho coisas a fazer.

— Leve um desinfetante se passar no apartamento.

— Tá… Acho que você teve alguns problemas…

— Que nada, foi moleza.

Croyd foi embora, assobiando, com as mãos nos bolsos. Jube olhou para a chave enquanto as horas badalavam num relógio distante.

Até a sexta geração

Walter Jon Williams

Parte Um

A chuva fria tamborilava nas claraboias. A garoa finalmente silenciara o Papai Noel do Exército da Salvação na esquina, e Maxim Travnicek agradeceu — o tilintar persistiu por dias. Ele acendeu um cigarro russo e pegou uma garrafa de bebida.

Travnicek tirou os óculos de leitura do paletó e deu uma olhada nos controles dos geradores de fluxo. Era um homem ameaçadoramente alto, nariz aquilino, de uma beleza fria. Entre os ex-colegas no MIT, era conhecido como “a resposta da Tchecoslováquia para Victor Frankenstein”, um rótulo cunhado por um amigo professor, Bushmill, que mais tarde conseguiu uma nomeação para reitor e na primeira oportunidade mandou Travnicek embora.