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Medo, Tachyon pensou. Essas pessoas estão aterrorizadas. Por quê? Ele esfregou os pulsos.

— Meu casaco e meu chapéu, por favor. — O acréscimo de gentileza não reduziu o caráter da ordem.

— Se você insiste — disse Black, entregando o chapéu de cavaleiro com pena e a casaca de rabo de andorinha cor lavanda, que combinava com os olhos de Tach. O rosto bem marcado dividiu-se num sorriso sarcástico. — Seria difícil encontrar até um detetive de primeira classe com seu gosto — ele comentou.

— Muito provável que não — Tach disse, friamente. Ele balançou os cabelos para trás sobre o colarinho.

— Por aqui — disse Black. Tach inclinou o chapéu sobre um dos olhos e empurrou-o.

Era uma sala grande com painéis, uma mesa comprida, e estava um caos. Havia policiais, bombeiros, homens em uniformes militares. O prefeito gritava no rádio e, a julgar pela expressão selvagem, não estava conseguindo o que queria. O olhar de Tach pairou até a parte mais distante da sala e seus olhos estreitaram-se. O senador Hartmann estava de pé, numa conversa restrita com diversos ases: Peregrina, Pulso, o Uivador, a turma toda do CRISE-A.

Tach sempre se sentiu desconfortável com Hartmann… fosse um liberal de Nova York ou não, era o presidente do Comitê de Recursos Internos do Senado para Empenho dos Ases, o comitê CRISE-A, que estava à altura do seu nome sob a batuta de Joseph McCarthy. As leis eram diferentes agora, mas Tach não queria ter nada a ver com uma organização que recrutava ases para servir aos propósitos dos que estavam no poder.

O prefeito entregou o telefone para um assistente e, antes que pudesse correr para qualquer outro lugar, Tach marchou em sua direção, arremessando as algemas e encarando o prefeito com um olhar frio.

— Suas tropas de assalto me trouxeram — disse. — Arrombaram minha porta. Acredito que a prefeitura vá substituí-la, bem como qualquer coisa que possa ser roubada enquanto a porta estiver arrombada.

— Temos um problema — o prefeito disse, e então um assistente entrou às pressas com as mãos cheias de mapas de postos de gasolina de Nova Jersey. O prefeito mandou que os espalhasse sobre a mesa. Tachyon continuou falando, mesmo com a interrupção.

— Vocês poderiam ter me telefonado. Eu viria. Seus esquadrões nem bateram à porta. Ainda existem proteções constitucionais neste país, mesmo no Bairro dos Curingas.

— Nós batemos — disse Black. — Batemos de verdade. — Ele se virou para um dos detetives, um curinga com a carne marrom, cheia de escamas. — Você me ouviu bater, não foi, Kant?

Kant sorriu, um lagarto com dentes. Tachyon teve um calafrio.

— Claro que sim, tenente.

— E você, Matthias?

— Ouvi bater também.

Tach travou os dentes.

— Eles… não… bateram.

Black deu de ombros.

— O doutor provavelmente não nos ouviu. Estava ocupado. — Olhou de soslaio. — Estava acompanhado, se é que você me entende. Uma enfermeira. Muito bonita. — Ele ergueu um documento em papel-ofício. — Além do mais, nossa busca era legal. Assinada pelo juiz Steiner bem aqui, meia hora atrás.

O prefeito virou-se para Tachyon.

— Queríamos ter certeza de que você não tinha nada a ver com isso.

Tach tirou o chapéu e, indiferente, balançou-o à frente do rosto, enquanto olhava para a sala cheia de pessoas correndo para lá e para cá, inclusive… meu Deus, um tiranossauro de quase um metro que tinha acabado de se transformar num pré-adolescente nu.

— Do que vocês estão falando, meu bom homem? — finalmente perguntou.

O prefeito encarou Tachyon com olhos parecidos com lascas de gelo.

— Temos relatórios do que poderia ter sido um ataque do carta selvagem em Jersey.

O coração de Tach acelerou. De novo não, pensou, lembrando-se daquelas primeiras semanas terríveis, as mortes, a mutilação que fez seu sangue gelar, a loucura, o cheiro… Não, não era possível. Ele engoliu seco.

— O que posso fazer para ajudar? — falou.

— Quarenta mil em um grupo — o general murmurou, fixando os números na mente. — Provavelmente em Princeton agora. Vinte mil voadores. Talvez outros 20 mil espalhados na zona rural, movendo-se para o ponto de encontro em Princeton. — Ele olhou para o androide. — Alguma ideia de para onde vão depois de Princeton? Filadélfia ou Nova York? Sul ou norte?

— Não consigo dizer.

O tenente-general mordeu o punho fechado. Era magro, de óculos, e seu nome era Carter. Nem parecia perturbado pelo pensamento de alienígenas carnívoros aterrissando em Nova Jersey. Comandava o Primeiro Exército dos Estados Unidos de seu quartel-general em Fort Meade, Maryland. Modular fora enviado para lá por um major-general suarento em Fort Dix, que no fim das contas era um centro de treinamento.

O caos cercava a aura de calma de Carter. Telefones tocavam, assistentes se acotovelavam e, lá fora, no corredor, homens gritavam.

— Até agora, consegui apenas a Octogésima Segunda e a Guarda Nacional — Carter comentou. — Não é o suficiente para defender Nova York e Filadélfia contra esses números. Se tivesse regimentos de fuzileiros de Lejeune, poderíamos nos sair melhor, mas o comandante dos Fuzileiros não quer liberá-los da Força de Deslocamento Rápido, que é comandada por um fuzileiro. Quer que a FDR assuma o comando aqui, especialmente porque a Octogésima Segunda também está abaixo de seus protocolos. — Deu um gole no suco de cranberry e suspirou. — Trata-se do processo de mover um exército em tempo de paz para uma condição de guerra. Nossa hora chegará, e então teremos nossa vez.

O androide havia descoberto que o Enxame aterrissara em quatro lugares na América do Norte: Nova Jersey; Kentucky, sul de Louisville; uma área central em torno de McAllen, Texas, exceto nos dois lados da fronteira Estados Unidos-México; e uma aterrissagem extremamente difusa que parecia espalhada por grande parte a norte de Manitoba. A aterrissagem de Kentucky também estava dentro da jurisdição do Primeiro Exército, e Carter ordenou a intervenção dos soldados de Fort Knox e Fort Campbell. Felizmente, não tinha de obter a permissão dos fuzileiros navais antes.

— Norte ou sul? — Carter perguntou-se. — Que inferno, queria saber pra onde estão rumando. — Esfregou as têmporas. — Hora de arriscar — decidiu. — Você os viu seguirem para o norte. Vou mandar a Força Aérea para Newark e dizer para a Guarda se concentrar lá.

Outro assistente entrou apressado e passou um bilhete para Carter.

— Tudo bem — disse o general. — O governador de Nova York pediu para todos os ases na área se reunirem na prefeitura. Uma conversa sobre usar vocês como tropas de choque. — Ele espreitou o androide através dos óculos. — Você é um ás, certo?

— Sou uma máquina inteligente de sexta geração programada para defender a sociedade.

— Então, você é uma máquina? — Carter olhou como se não tivesse entendido isso até aquele momento. — Alguém te construiu?

— Isso aí. — Seu linguajar informal estava cada vez melhor, sua fala mais concisa. Estava satisfeito consigo mesmo.

A reação de Carter foi rápida.

— Existem mais de você? Podemos construir mais de você? Temos urgência aqui.

— Posso transmitir sua solicitação ao meu criador. Mas não acho que poderá prestar ajuda imediata.

— Faça isso. E, antes que você decole, quero que fale com um da minha equipe. Diga a ele sobre você, suas capacidades. Podemos fazer melhor uso de você dessa forma.

— Sim, senhor — o androide estava tentando soar militar, e pensou estar conseguindo.

— Não — Tachyon falou. — Não é carta selvagem.