Ele pensou que o assunto estivesse encerrado. Em vez disso, uma semana depois, ela ligou e perguntou se ele poderia encontrá-la para almoçar no Aces High.
Ele esperava na mesa quando ela entrou. Nunca, ele sabia, ela pareceria uma modelo fashion ou com uma de suas gueixas. Mas gostou de ela ter feito o máximo com o que tinha: saia justa cinza de flanela, blusa de algodão branca, cardigã azul-marinho, colar de contas âmbar e uma tiara larga de casco de tartaruga no cabelo. Sem maquiagem visível, exceto por uma base e um pouco de brilho labial.
Fortunato se levantou para puxar a cadeira para ela e quase trombou com Hiram. Houve uma pausa estranha. Finalmente ela estendeu a mão e Hiram curvou-se sobre ela, hesitou apenas um pouco demais, e então desviou. Fortunato o acompanhou com os olhos por um segundo ou dois. Queria que Eileen dissesse alguma coisa sobre Hiram, mas ela não entendeu a deixa.
— Bom te ver — disse ele.
— Bom te ver também.
— Apesar… daquilo que aconteceu no nosso último encontro?
— O quê? Um pedido de desculpas? — Novamente o sorriso.
— Não — ele falou. — Embora eu realmente sinta muito. Sinto muito por ter enfiado você nisso. Sinto muito por não poder te encontrar de outro jeito. Sinto muito por termos esses negócios horríveis entre nós todas as vezes que nos vemos.
— Eu também.
— E temo por você. Estou enfrentando algo que nunca vi antes. Existe essa… coisa, essa conspiração, esse culto, seja lá o que for, lá fora. E não consigo descobrir nada. — Um garçom trouxe os cardápios e água em taças de cristal. Fortunato agradeceu e o afastou com um aceno de cabeça.
— Fui ver o Clarke — disse Fortunato. — Fiz algumas perguntas, mencionei TIAMAT, e tudo que recebi foram olhares vagos. Ele não estava fingindo. Olhei dentro de seu cérebro. — Ele tomou fôlego. — Ele não tinha lembrança sobre você.
— É impossível — disse Eileen. Ela sacudiu a cabeça. — É tão estranho ver você aí sentado, falando sobre ler a mente dele. Deve ter havido algum tipo de engano, é isso. Tem certeza?
Fortunato conseguia ver sua aura claramente. Ela dizia a verdade.
— Tenho — ele respondeu.
— Vi Clarke a noite passada e posso jurar que se lembrou de mim. Ele me levou para encontrar algumas pessoas. São membros do culto, ou da sociedade, ou seja lá o que for. As moedas são algum tipo de chave de reconhecimento.
— Você pegou nomes, endereços ou algo assim?
Ela balançou a cabeça.
— Eu os reconheceria. Um deles se chamava Roman. Tinha boa aparência, boa aparência demais, se você me entende. O outro era bem comum. Harry, acho que era esse o nome.
— O grupo tem um nome?
— Eles não mencionaram um nome. — Ela olhou para o cardápio quando o garçom voltou. — Medalhões de vitela, eu acho. E uma taça de Chablis.
Fortunato pediu salada mista e uma cerveja Beck’s.
— Mas fiquei sabendo de algumas outras coisas — disse ela. — Estou tentando rastrear a mulher e o filho de Balsam. Digo, eles são um par de pontas soltas na história. Primeiro, tentei a rotina habitual do detetive, registros de nascimento, morte e casamento. Nenhuma pista. Então tentei encontrar conexões ocultas. Conhece a Abramelin Review?
— Não.
— É um tipo de guia do leitor para publicações de ocultismo. E aí a família Balsam surgiu. Existe um Marc Balsam que publicou pelo menos uma dúzia de artigos nos últimos anos. A maioria numa revista chamada Nectanebo. Te faz lembrar de alguma coisa?
Fortunato fez que não com a cabeça.
— Um demônio ou algo assim? Não me parece estranho, mas não me vem à cabeça agora.
— Dá para apostar que ele está envolvido com a mesma sociedade da qual Clarke participa.
— Por causa das moedas.
— Exatamente.
— E essas gangues de garotos que estão barbarizando no Mosteiro? Peguei uma moeda de um desses garotos. Consegue ver alguma conexão possível?
— Ainda não. Os artigos poderiam ajudar, mas a revista é bem obscura. Não consegui encontrar nenhuma cópia.
Os pratos chegaram. Durante o almoço, ela finalmente falou sobre Hiram.
— Quinze anos atrás ele era mais atraente do que você pode imaginar. Um pouco cheinho, mas muito charmoso. Sabia como se vestir, o que dizer. E, é claro, sempre conhecia restaurantes fantásticos.
— O que aconteceu? Se é que posso perguntar.
— Não sei. O que sempre acontece entre as pessoas? Acho que muito disso foi porque ficou muito envergonhado com seu peso. Agora eu que fico constrangida o tempo todo.
— Não deveria, viu? Você está ótima. Pode ter o homem que quiser.
— Você não precisa me cantar. Quer dizer, você tem todo esse poder sexual e carisma e tudo o mais, mas não gosto da ideia de você usar isso comigo. De me manipular.
— Não estou tentando te manipular — disse Fortunato. — Se parece que estou interessado em você, é porque estou interessado em você.
— Você é sempre assim, tão intenso?
— Sou. Acho que sou. Eu olho pra você e você está sorrindo o tempo todo. Isso me deixa louco.
— Vou tentar parar.
— Não faça isso.
Ele percebeu que foi muito atirado. Ela pousou os talheres impecavelmente no prato e deixou o guardanapo dobrado ao lado. Fortunato afastou o restante da salada. De repente, algo borbulhou em sua mente.
— Qual é mesmo o nome daquela revista? Onde o Balsam estava publicando?
Ela pegou um pedaço de papel dobrado da bolsa.
— Nectanebo. Por quê?
Fortunato fez um sinal para o garçom trazer a conta.
— Olha só. Você pode ir ao meu apartamento comigo? Não é um truque, é importante.
— Assim espero.
O garçom fez uma mesura e olhou para Eileen.
— Sr. Worchester está… impedido de vir cumprimentá-la. Mas pediu para dizer que o almoço de vocês é por conta da casa.
— Agradeça por mim — disse Eileen. — Diga a ele… diga apenas que agradeço.
Caroline ainda estava sonolenta quando chegaram ao apartamento. Ela considerou deixar a porta do quarto aberta enquanto caminhava nua até o banheiro, então sentou-se na ponta da cama e, lentamente, vestiu as roupas, começando pela meia-calça e pela cinta-liga.
Fortunato ignorou-a, examinando as pilhas de livros que cresceram até formar uma parede inteira da sala de estar. Ou ela aprendia a controlar seu ciúme ou encontraria outra ocupação.
Eileen sorriu para ela enquanto caminhava com dificuldade sobre saltos de dez centímetros.
— Ela é bonita — disse ela.
— Você também.
— Não comece.
— Você começou. — Ele entregou para ela o A magia egípcia, de Budge. — Aqui está. Nectanebo.
— … famoso como mago e sábio, era profundamente versado em toda a sabedoria dos egípcios.
— As peças estão se juntando. Você se lembra da máscara de cachorro do Black John? Fico me perguntando se o culto de Balsam não é a Maçonaria Egípcia.
— Ah, meu Deus. Você está pensando no mesmo que eu?
— Estou pensando que o nome Balsam pode ser uma americanização de Balsamo.
— Como em Giuseppe Balsamo de Palermo — Eileen disse. Ela se sentou pesadamente no sofá.
— Mais conhecido como — disse Fortunato — Conde Cagliostro.
Fortunato puxou uma cadeira diante dela e se sentou com os cotovelos apoiados nos joelhos.
— A Inquisição o prendeu quando?
— Por volta de 1790, não foi? Eles o mandaram pra um tipo de masmorra. Mas o corpo nunca foi encontrado.
— Provavelmente ele tinha ligação com os Illuminati. Talvez o tenham tirado da prisão e o enviado escondido para os Estados Unidos.