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- Não - respondeu ele.

"Essa vai ser uma tarde bem divertida", disse o sujeito da loja para si mesmo. De todo jeito, Arthur comprou o Apple. E, alguns dias depois adquiriu também alguns softwares astronômicos, traçou os movimentos das estrelas, esquematizou pequenos diagramas toscos de como se lembrava da posição das estrelas no céu à noite sobre a sua caverna e trabalhou com afinco na coisa durante semanas, alegremente adiando a conclusão que sabia que teria de encarar inevitavelmente, ou seja, que o projeto em si era absurdo. Desenhos toscos feitos de memória eram inúteis. Não sabia nem dizer há quanto tempo tinha sido, a não ser pelo chute de Ford Prefect, na época, de que tinham voltado no tempo "uns dois milhões de anos" e ele nem sabia como calcular a coisa toda. Ainda assim, no final, criou um método que pelo menos iria produzir um resultado. Decidiu não se importar com o fato de que, com a extraordinária mistureba de regras inventadas, aproximações tresloucadas e conjecturas misteriosas que ele estava usando, seria preciso muita sorte para localizar a Galáxia certa, mas seguiu em frente assim mesmo e chegou a um resultado.

Ele o chamaria de resultado correto. Quem iria discordar?

Acontece que em meio a insondável miríade de possibilidades do destino, o resultado estava de fato correto, embora ele jamais fosse saber disso. Ele simplesmente foi até Londres bateu na porta certa.

- Ué, pensei que você fosse me ligar primeiro.

Arthur estava pasmo com a surpresa.

- Você não vai poder ficar muito tempo - disse Fenchurch. - É que eu estou de saída. capítulo 18

Um dia de verão em Islington, repleto do pesaroso lamento das máquinas de restauração de antigüidades.

Fenchurch estava inevitavelmente ocupada durante a tarde, então Arthur saiu para passear envolto em uma névoa de êxtase e deu uma olhada em todas as lojas que, em Islington, são bastante úteis, como qualquer um que habitualmente precise de velhas ferramentas para trabalhar a madeira, capacetes da Guerra Bôer, dragas, mobília de escritório ou peixes pode prontamente confirmar.

O sol batia sobre os jardins nos terraços. Batia sobre arquitetos e encanadores. Batia em advogados e ladrões. Batia sobre as pizzas. Batia em fiscais do estado. Bateu em Arthur quando ele entrou em uma loja de mobília restaurada.

-É um prédio interessante - disse o proprietário, efusivo. - No porão tem uma passagem secreta que dá para o bar mais próximo. Parece que foi construída para o príncipe regente, para ele pudesse dar as suas escapadinhas.

- Entendi, para ninguém surpreendê-lo comprando móveis de pinho descascados - disse Arthur.

- Não - respondeu o proprietário -, não por esse motivo.

- Desculpe - disse Arthur. - Estou terrivelmente feliz.

-Estou vendo.

Continuou vagando atordoadamente e acabou indo parar bem na frente dos escritórios do Greenpeace. Lembrou-se do conteúdo do seu arquivo marcado "Coisas Para Fazer - Urgente!", que nunca mais havia aberto. Entrou no prédio com um sorriso alegre e disse que tinha vindo dar contribuição em dinheiro para ajudar a libertar os golfinhos.

- Muito engraçado - responderam -, vá embora.

Não estava exatamente preparado para aquela resposta então tentou novamente. Desta vez ficaram bastante irritados com ele; então ele acabou deixando algum dinheiro e voltou para a rua ensolarada.

Um pouco depois das seis voltou para a casa de Fenchurch na travessa, trazendo uma garrafa de champanhe.

- Segura isso aqui - disse ela, colocando uma pesada corda em suas mãos e desaparecendo para dentro das enormes portas de madeira branca, de onde pendia um pesado cadeado em uma tranca de ferro preta.

A casa era um estábulo reformado, em uma pequena travessa industrial atrás do Royal Agricultural Hall de Islington, agora abandonado. Além das enormes portas de estábulo, também havia uma porta da frente de aparência normal, revestida de madeira envernizada com ornamentos e um golfinho preto servindo de batente. A única coisa estranha sobre essa porta era sua posição, a quase três metros de altura, já que a porta fora colocada no segundo andar e provavelmente havia sido originalmente usada para receber o feno para cavalos famintos. Uma velha roldana projetava-se para fora dos tijolos acima entrada e era nela que a corda que Arthur segurava estava presa. Na outra ponta da corda havia um violoncelo pendurado. A porta abriu-se sobre a sua cabeça.

- O.k. - disse Fenchurch -, puxe a corda e mantenha o violoncelo firme. Depois faça-o subir até aqui.

Ele puxou a corda, mantendo o violoncelo firme.

- Não dá para puxar a corda de novo - disse ele - sem soltar o violoncelo. Fenchurch deitou-se no chão.

- Eu cuido do violoncelo - disse ela. - Pode puxar a corda. O violoncelo subiu até a altura da porta, balançando um ouço, e Fenchurch puxou-o para dentro.

- Agora, suba você - ela gritou lá para baixo.

Arthur apanhou a sacola com as comprinhas que tinha feito e entrou pelas portas do estábulo, radiante.

O cômodo de baixo, que ele vira brevemente mais cedo, era bem rústico e cheio de tralhas. Havia coisas como uma enorme e velha máquina de passar de ferro fundido e uma surpreendente pilha de pias de cozinha em um canto. Havia também um carrinho de bebê que deixou Arthur momentaneamente alarmado, mas estava caindo aos pedaços e descomplicadamente cheio de livros.

O chão era de concreto, velho e manchado, empolgantemente rachado. E essa era a medida do humor de Arthur, enquanto olhava para os degraus de madeira malconservados do outro lado da sala. Até mesmo um chão de concreto rachado parecia-lhe insuportavelmente sensual.

- Um arquiteto amigo meu vive me dizendo que poderia fazer coisas fantásticas aqui disse Fenchurch, toda falante quando Arthur surgiu pela porta. - Ele vive vindo aqui em casa, e fica aí parado, embasbacado, resmungando alguma coisa sobre espaço, objetos, acontecimentos e propriedades maravilhosas de luz, aí me pede um lápis e some por várias semanas. Coisas fantásticas, como você vê, até agora não aconteceram por aqui. Para falar a verdade, pensou Arthur ao examiná-lo, o cômodo superior era no mínimo razoavelmente fantástico de qualquer forma. Fora decorado com simplicidade e mobiliado com coisas feitas de almofadas e tinha um aparelho de som estéreo com auto-falantes que teriam impressionado caras que construíram Stonehenge. s Havia flores pálidas e quadros interessantes.

Havia uma espécie de jirau abaixo do telhado que sustentava uma cama e um banheiro no qual, explicou Fenchurch, seria até possível dançar uma valsa.

- Mas - acrescentou - apenas se você quisesse dançar sozinho e não se importasse de bater nas paredes o tempo todo. Enfim. Aqui está você.

- Pois é.

Olharam-se por um momento.

Aquele momento tornou-se um momento mais longo e, de repente, virou um momento muito longo, tão longo que mal se podia dizer de onde aquele tempo todo estava vindo. Para Arthur, que normalmente conseguia dar um jeito de sentir-se constrangido se fosse deixado a sós por muito tempo mesmo com um vaso de banana-do-mato, aquele momento foi de constante revelação. Sentiu-se, de repente, como um animal enjaulado, nascido no zoológico, que um belo dia acorda, encontra a porta da sua jaula tranqüilamente aberta e vê, diante de si, a savana estender-se cinzenta e rosada até o distante sol nascente, enquanto à sua volta novos sons despertam.

Perguntou-se quais seriam esses novos sons, olhando para o rosto dela, francamente maravilhado, e para os seus olhos, que sorriam com uma compartilhada surpresa. Nunca antes percebera que a vida está sempre falando com uma voz que responde às perguntas que você vive fazendo sobre ela; nunca detectara conscientemente ou reconhecera esses tons até agora, quando a vida estava algo que jamais dissera para ele, que era "sim". Fenchurch finalmente abaixou os olhos, sacudindo a cabeça de um modo quase imperceptível.