Nas décadas seguintes, esta nova compreensão de espaço e tempo iria revolucionar a nossa concepção do Universo. A velha ideia de um Universo essencialmente imutável, que podia ter existido e podia continuar a existir para sempre, foi substituída pela noção de um Universo dinâmico e em expansão, que parecia ter tido início há um tempo finito no passado, e que podia acabar num tempo finito no futuro. Essa revolução constitui o assunto do próximo capítulo. E, anos mais tarde, foi também o ponto de partida para o meu trabalho de física teórica. Roger Penrose e eu mostramos que a teoria da relatividade geral de Einstein implicava que o Universo tinha de ter um princípio e, possivelmente, um fim.
III. O Universo em Expansão
Se olharmos para o céu numa noite de céu limpo e sem luar, os objectos mais brilhantes que podemos ver serão possivelmente os planetas Vénus, Marte, Júpiter e Saturno. Haverá também um grande número de estrelas, que são exactamente como o nosso Sol, mas que se encontram mais distantes de nós. Algumas destas estrelas fixas parecem de facto mudar muito ligeiramente as suas posições umas em relação às outras, enquanto a Terra gira em volta do Soclass="underline" não estão absolutamente nada fixas! Isto acontece por estarem comparativamente perto de nós. Como a Terra gira em volta do Sol, vemo-las de diferentes posições no pano de fundo das estrelas mais distantes. É uma sorte, porque nos permite medir directamente a distância a que essas estrelas estão de nós: quanto mais próximas, mais parecem mover-se. A estrela que está mais perto de nós chama-se Próxima Centauro e está, afinal, a cerca de quatro anos-luz de distância (a sua luz leva cerca de quatro anos a alcançar a Terra) ou a cerca de trinta e sete milhões de milhões de quilómetros. A maior parte das outras estrelas visíveis a olho nu está a algumas centenas de anos-luz de nós. O nosso Sol, em comparação, está a uns meros oito minutos-luz de distância! As estrelas visíveis aparecem espalhadas por todo o céu nocturno, mas concentram-se :, particularmente numa faixa a que damos o nome de Via Láctea. Por volta de 1750, alguns astrónomos [entre os quais Thomas Wright (1)], sugeriram que o aspecto da Via Láctea podia ser explicado por a maior parte das estrelas visíveis estar distribuída numa configuração de disco, como aquilo a que agora chamamos galáxia espiral (Fig. 3.1). Só algumas décadas mais tarde, outro astrónomo, Sir William Herschel, confirmou a ideia de Wright, catalogando pacientemente as posições e distâncias de um grande número de estrelas. Mesmo assim, a ideia só obteve aceitação completa no princípio deste século. :,
Fig. 3 .1
(1) Trata-se, por certo, de um lapso da edição americana. Esta informação indispensável (como o leitor verá um pouco adiante) refere-se a Thomas Wright (1711-1786) que imaginou a Via Láctea como um anel de estrelas similar ao de Saturno (*N. do R.*).
A representação moderna do Universo data apenas de 1924, quando o astrónomo americano Edwin Hubble demonstrou que a nossa galáxia não era a única. Havia, na realidade, muitas outras, com vastidões de espaço vazio entre elas. Para o provar, precisa va de determinar as distâncias a que se encontravam essas outras galáxias, que estão tão longe que, ao contrário das estrelas próximas, parecem realmente fixas. Hubble teve de utilizar métodos indirectos para medir as distâncias. O brilho aparente de uma estrela depende de dois factores: da quantidade de luz que radia (a sua luminosidade) e da distância a que se encontra de nós. Para as estrelas próximas, podemos medir o seu brilho aparente e a distância a que se encontram e, assim, determinar a sua luminosidade. Ao contrário, se conhecermos a luminosidade de estrelas de outras galáxias, podemos calcular a sua distância medindo o seu brilho aparente. Hubble notou que certos tipos de estrelas (2) têm sempre a mesma luminosidade quando estão suficientemente perto de nós para que a possamos medir; portanto, argumentou que, se encontrássemos estrelas dessas em outra galáxia, podíamos admitir que teriam a mesma luminosidade e, assim, calcular a distância dessa galáxia. Se o pudéssemos conseguir com várias estrelas da mesma galáxia e os nossos cálculos indicasse m sempre a mesma distância, podíamos confiar razoavelmente neles.
(2) Trata-se das estrelas variáveis *cefeides* (*N. do R.*).
Deste modo, Edwin Hubble calculou as distâncias de nove galáxias diferentes. Sabemos agora que a nossa galáxia é apenas uma de umas centenas de milhar de milhões que podem ser observadas com os telescópios modernos e que cada galáxia contem algumas centenas de milhar de milhões de estrelas. A Fig. 3.1 mostra uma galáxia espiral semelhante ao que pensamos que seja o aspecto da nossa galáxia para alguém que viva noutra. Vivemos numa galáxia :, que tem cerca de uma centena de milhar de anos-luz de diâmetro e roda vagarosamente; as estrelas, nos seus braços em espiral, orbitam em redor do centro cerca de uma vez em cada várias centenas de milhões de anos. O nosso Sol não passa de uma estrela amarela normal, de tamanho médio, perto do limite interior de um dos braços em espiral. Percorremos realmente um longo caminho desde Aristóteles e Ptolomeu, quando se pensava que a Terra era o centro do Universo!
As estrelas estão tão distantes que nos parecem meros pontinhos de luz. Não podemos ver o seu tamanho nem a sua forma. Então como é que podemos distinguir diferentes tipos de estrelas? Na grande maioria das estrelas, há apenas uma característica que podemos observar: a cor da sua luz. Newton descobriu que, se a luz do Sol passa através de um pedaço triangular de vidro, chamado prisma, se decompõe nas cores componentes (o seu espectro), como num arco-íris. Focando uma estrela ou uma galáxia com um telescópio, podemos observar do mesmo modo o espectro da luz dessa estrela ou galáxia. Estrelas diferentes têm espectros diferentes, mas o brilho relativo das diferentes cores é sempre exactamente o que se esperaria encontrar na luz emitida por um objecto incandescente. (Na realidade, a luz emitida por um objecto opaco ao rubro apresenta um espectro característico que depende apenas da sua temperatura -- um espectro térmico. Isto significa que podemos medir a temperatura a partir do espectro da sua luz). Além disso, sabe-se que algumas cores muito específicas estão ausentes dos espectros das estrelas e estas cores que faltam podem variar de estrela para estrela. Como sabemos que cada elemento químico absorve um conjunto característico de cores muito específicas, comparando-as com as que faltam no espectro de uma estrela, podemos determinar exactamente quais são os elementos presentes na atmosfera da estrela. :,
Nos anos 20, quando os astrónomos começaram a observar os espectros de estrelas de outras galáxias, descobriram algo muito estranho: faltavam as mesmas cores encontradas nos espectros das estrelas da nossa galáxia, porque eram todas desviadas na mesma proporção para o extremo vermelho do espectro. Para compreender as implicações deste fenómeno, temos de entender primeiro o efeito de Doppler. Como vimos, a luz visível consiste em flutuações ou ondas no campo electromagnético. A frequência (ou número de ondas por segundo) da luz é extremamente alta, indo de quatro a sete centenas de milhões de milhões de ondas por segundo. As diferentes frequências de luz são o que o olho humano vê como cores diferentes, com as frequências mais baixas junto do extremo vermelho do espectro e as mais altas no extremo azul. Imaginemos agora uma fonte luminosa a uma certa distância de nós, tal como uma estrela, emitindo ondas luminosas com uma frequência constante. É óbvio que a frequência das ondas que recebemos será a mesma a que são emitidas (o campo gravitacional da galáxia não será suficientemente grande para ter um efeito significativo) (3). Suponhamos agora que a fonte começa a mover-se na nossa direcção. Quando a fonte emitir a crista da onda seguinte, estará mais perto de nós; por isso, o tempo que essa crista leva a chegar até nós será menor que quando a estrela estava em repouso relativo. Isto significa que o tempo entre duas cristas de onda que chegam até nós é menor e, portanto, o número de ondas que recebemos por segundo (ou seja, a frequência) é maior do que quando a estrela está em repouso relativo. Da mesma maneira, se a fonte se afastar de nós, a frequência das ondas que recebemos será mais baixa. No :,