Muitas vezes é útil pensar nas quatro coordenadas de um acontecimento para especificar a sua posição num espaço quadridimensional chamado espaço-tempo. É impossível imaginar um espaço quadridimensional. Eu próprio já acho suficientemente difícil visualizar um espaço tridimensional! Contudo, é fácil desenhar diagramas de espaços bidimensionais como a superfície da Terra. (A superfície da Terra é bidimensional porque a posição de um ponto pode ser especificada por duas coordenadas: a latitude e a longitude). Usarei geralmente diagramas em que o tempo aumenta no sentido ascendente vertical e uma das dimensões espaciais é indicada horizontalmente. As outras duas dimensões espaciais ou são ignoradas ou, por vezes, uma delas é indicada em perspectiva. (São os diagramas de espaço-tempo como a Fig. 2.1). Por exemplo, na Fig. 2:2, o tempo é medido no sentido vertical ascendente em anos e a distância do Sol a Alfa Centauro é medida horizontalmente em quilómetros. As trajectórias do Sol e de Alfa Centauro através do espaço-tempo são representadas pelas linhas verticais à esquerda e à direita do diagrama. Um raio de luz do Sol segue a linha diagonal e leva quatro anos a chegar a Alfa Centauro. :,
tempo (em anos)
sol
alfa centauro
raio luminoso
distância ao sol (em biliões de quilómetros)
Fig. 2.2
Como vimos, as equações de Maxwell prediziam que a velocidade da luz devia ser a mesma, qualquer que fosse a velocidade da sua fonte, o que foi confirmado por medições rigorosas. Daí que, se um impulso de luz é emitido em determinado momento e em dado ponto do espaço, à medida que o tempo passa, espalhar-se-á como uma esfera de luz cujos tamanho e posição são independentes da velocidade da fonte. Um milionésimo de segundo depois, a luz ter-se-á difundido para formar uma esfera com raio de trezentos metros; dois milionésimos de segundo depois, o raio será de seiscentos metros, etc. Será como a ondulação que se propaga na superfície de um tanque, quando se lhe atira uma pedra. A ondulação propaga-se nun1 círculo que aumenta à medida que o tempo passa. Se pensarmos num :, modelo tridimensional que consista na superfície bidimensional do tanque e numa coordenada de tempo, o círculo de ondulação que se expande representará um cone, cujo topo está no local e no instante em que a pedra atingiu a água (Fig. 2.3). Da mesma maneira, a luz que se propaga a partir de um acontecimento forma um cone tridimensional no espaço-tempo quadridimensional. Este cone chama-se cone de luz do futuro do acontecimento. Podemos, do mesmo modo, desenhar outro cone chamado cone de luz do passado que constitui o conjunto de acontecimentos a partir dos quais um impulso de luz pode alcançar o acontecimento dado.
Os cones de luz do passado e do futuro de um acontecimento *P* dividem o espaço-tempo em três regiões (Fig. 2.5). o futuro absoluto do acontecimento é a região dentro do cone de luz do futuro de *P*. É o conjunto de todos os acontecimentos susceptíveis de serem afectados por aquilo que acontece em *P*. Os acontecimentos fora do cone da luz de *P* não podem ser alcançados por sinais provenientes de *P*, porque nada pode deslocar-se com velocidade superior à da luz. Não podem, assim, ser influenciados por o que acontece em *P*. O passado absoluto de *P* é a região inscrita no cone de luz do passado. É o conjunto de todos os acontecimentos a partir dos quais sinais que se propagam a uma velocidade igual ou inferior à da luz podem alcançar *P*. É, pois, o conjunto de todos os acontecimentos susceptíveis de afectarem o que acontece em *P*. Se soubermos o que está a passar-se em determinado momento em toda a região do espaço inscrita no cone de luz do passado de *P*, podemos predizer o que acontecerá em *P*. O presente condicional é a região do espaço-tempo que não fica nos cones de luz do futuro ou do passado de *P*. Os acontecimentos ocorrentes nessa região não podem afectar nem serem afectados pelos acontecimentos em *P*. Por exemplo, se o Sol deixasse de brilhar neste :, mesmo momento, não afectaria os acontecimentos actuais na Terra porque eles situariam na região do presente condicional do acontecimento quando o Sol deixasse de brilhar (Fig. 2.6). Só saberíamos o que se tinha passado daí a oito minutos, o tempo que a luz do Sol leva a alcançar-nos. Só nessa altura é que os acontecimentos na Terra ficariam no cone de luz do futuro do evento da morte do Sol. Do mesmo modo, não sabemos o que está a passar-se neste momento mais longe no Universo: a luz que nos chega provinda de galáxias distantes deixou-as há milhões de anos; a luz do objecto mais longínquo que conseguimos avistar deixou-o há já cerca de oito mil milhões de anos. Assim, quando observamos o Universo vemo-lo como ele era no passado.
espaço -- tempo
a pedra toca a superfície da água
um segundo depois
dois segundos depois
três segundos depois
ondas em expansão
fig. 2.3
tempo
cone de luz do futuro
cone de luz do passado,
acontecimento
(presente)
espaço
fig. 2.4 :,
espaço e tempo
futuro absoluto
presente condicional
passado absoluto
fig. 2.5
tempo (minutos)
sol
evento de morte do sol
cone de luz do futuro do acontecimento
terra
a morte do sol não nos afecta imediatamente porque não estamos no seu cone de luz do futuro
a terra penetra no cone de luz do futuro da morte do sol cerca de oito minutos depois
fig. 2.6 :,
Se desprezarmos os efeitos da gravitação, como Einstein e Poincaré fizeram em 1905, obtém-se aquilo a que se chama a teoria da relatividade restrita. Para cada acontecimento no espaço-tempo podemos construir um cone de luz (conjunto de todas as trajectórias possíveis da luz, no espaço-tempo, emitida nesse acontecimento) e, uma vez que a velocidade da luz é a mesma para todos os acontecimentos e em todas as direcções, todos os cones de luz serão idênticos e orientados na mesma direcção. A teoria também nos diz que nada pode mover-se com velocidade superior à da luz (6). Isto significa que a trajectória de qualquer objecto através do espaço e do tempo tem de ser representada por uma linha que fique dentro do cone de luz por cada acontecimento no seu interior (Fig. 2.7).
(6) O que está verdadeiramente em causa é a *velocidade* da luz, não a luz. *Acidentalmente*, a luz propaga-se à velocidade da luz, que tanto quanto se sabe também podia chamar-se a velocidade dos neutrinos! (*N. do R.*).
tempo
espaço
não permitida
permitida à luz
utilizável por corpos com massa
fig. 2.7
A teoria da relatividade restrita obteve grande êxito na explicação de que a velocidade da luz parece a mesma para :, todos os observadores (como a experiência de Michelson e Morley demonstrou) e na descrição do que acontece quando os objectos se movem a velocidades próximas da velocidade da luz. Contudo, era inconsistente com a teoria da gravitação de Newton, que afirmava que os objectos se atraíam uns aos outros com uma força que dependia da distância que os separava. Isto significava que, se se deslocasse um dos objectos, a força exercida sobre o outro mudaria instantaneamente. Por outras palavras, os efeitos gravitacionais deslocar-se-iam com velocidade infinita, e não à velocidade da luz ou abaixo dela como a teoria da relatividade restrita exigia. Einstein várias vezes tentou, sem êxito, entre 1904 e 1914, descobrir uma teoria da gravidade que fosse consistente com a relatividade restrita. :, Finalmente, em 1915, propôs o que agora se chama a teoria da relatividade geral.