Armstrong olhou para seu parceiro chinês. Depois, perguntou:
— E quando foi isso?
— Há quatro meses. Foi necessário todo esse tempo para os dois lados prepararem todos os detalhes.
— John Chen, hem? — comentou Armstrong. — Ele bem que podia ser o Chen da Casa Nobre.
— Sabe que John não é desse tipo — falou Dunross. — Não há motivo para ele estar metido numa trama dessas. Deve ser coincidência.
— Há mais uma coincidência curiosa — falou Brian Kwok. — Tanto Tsu-yan quanto John Chen conhecem um americano chamado Banastasio, ou pelo menos ambos já foram vistos em sua companhia. O nome não lhe diz nada?
— Não. Quem é ele?
— Um jogador da pesada, e suspeito de ser escroque. Dizem também que mantém ligações estreitas com uma das famílias da Cosa Nostra. Vincenzo Banastasio.
Os olhos de Dunross se estreitaram.
— Você falou "foram vistos em sua companhia". Quem foi que viu?
— O FBI.
O silêncio ficou mais pesado.
Armstrong enfiou a mão no bolso para puxar um cigarro. Dunross empurrou em sua direção a caixa de cigarros de prata.
— Tome.
— Ah, obrigado. Não, não vou fumar... agi sem pensar. Há duas semanas que parei. Cigarro mata. — A seguir acrescentou, tentando controlar o seu desejo: — O FBI nos passou a informação porque Tsu-yan e John Chen são figuras muito destacadas aqui. Pediram-nos que ficássemos de olho neles.
Foi então que Dunross se lembrou de repente do comentário de Foxwell sobre um importante capitalista que era comunista em segredo, e a quem estava vigiando no Sinclair Towers. "Santo Deus", pensou, "Tsu-yan tem um apartamento lá, e John Chen também. Mas é impossível que um deles esteja metido com os comunistas."
— Claro que a heroína é um negócio grande — dizia Armstrong, com voz muito dura.
— O que quer dizer, Robert?
— O tráfico de drogas exige quantias imensas para financiá-lo. Dinheiro de tal ordem só pode vir de bancos ou banqueiros, disfarçadamente, é claro. Tsu-yan faz parte da diretoria de vários bancos... e o Sr. Chen também.
— Robert, é melhor ir com muita calma nesse tipo de comentário — falou Dunross, com voz áspera. — Está tirando conclusões muito perigosas, sem prova alguma. Isso pode ser discutível, creio, e não o admito.
— Tem razão, desculpe. Retiro a coincidência. Mesmo assim, o comércio de drogas é um negócio e tanto, e existe aqui em Hong Kong em abundância, especialmente para posterior consumo nos Estados Unidos. Vou dar um jeito de descobrir quem são os nossos homens maus.
— É elogiavel. E terá todo o auxílio que quiser da Struan e de mim. Também odeio o tráfico.
— Ah, não o odeio, tai-pan, nem aos traficantes. É um fato da vida. É só mais um negócio... ilegal, é claro, mas ainda assim um negócio. Deram-me a tarefa de descobrir quem são os tai-pans. É uma questão de satisfação pessoal, nada mais.
— Se quiser ajuda, é só pedir.
— Obrigado. — Armstrong levantou-se, cansado. — Antes de partirmos, tenho mais duas coincidências para o senhor. Quando Tsu-yan e o Chen da Casa Nobre foram mencionados, hoje de manhã, pensamos em bater um papinho com eles imediatamente, mas logo depois que descobrimos as armas, Tsu-yan pegou o primeiro vôo para Taipé. Curioso, não?
— Ele viaja daqui para lá o tempo todo — falou Dunross, sua inquietação aumentando vertiginosamente. Tsu-yan era esperado na sua festa, logo mais à noite. Seria um fato extraordinário se não comparecesse.
Armstrong assentiu.
— Parece que foi uma decisão de última hora... não tinha reservas, nem bilhete, nem bagagens, mas passou alguns dólares extras por baixo do balcão, e alguém desistiu do vôo, deixando-lhe o lugar. Carregava apenas uma pasta. Estranho, não?
Brian Kwok falou:
— Não temos a mínima esperança de conseguir sua extradição de Formosa.
Dunross fitou-o, depois voltou a encarar Armstrong, os olhos firmes e da cor do gelo do mar.
— Disse que havia duas coincidências. Qual é a outra?
— Não conseguimos achar John Chen.
— Mas do que está falando?
— Não está em casa, nem na casa da namorada, nem nos lugares que costuma freqüentar. Há meses que o vigiamos, assim como a Tsu-yan, desde que o FBI nos alertou sobre eles.
O silêncio aumentou.
— Verificou o barco dele? — perguntou Dunross, já certo da resposta.
— Está atracado, não saiu desde ontem. Seu marinheiro também não o viu.
— No campo de golfe?
— Não está lá — falou Armstrong. — Nem na pista de corridas. Não foi assistir ao treino, embora fosse esperado, segundo o treinador. Sumiu, desapareceu, evaporou-se.
6
11h15m
Fez-se um silêncio estupefato na sala da diretoria.
— Qual o problema? — perguntou Casey. — Os números falam por si.
Os quatro homens à volta da mesa de reunião olharam para ela. Andrew Gavallan, Linbar Struan, Jacques de Ville e Phillip Chen, todos membros da assembléia interna.
Andrew Gavallan tinha quarenta e sete anos, era alto e magro. Deu uma olhada no maço de papéis à sua frente. "Dew neh loh moh para todas as mulheres metidas em negócios", pensou, irritado.
— Talvez devêssemos consultar o Sr. Bartlett — falou, constrangido, ainda muito perturbado por ter que lidar com uma mulher.
— Já lhe disse que tenho autoridade nessa área — retrucou ela, tentando ser paciente. — Sou tesoureira e vice-presidente executiva das Indústrias Par-Con, e tenho poderes para negociar com vocês. Confirmamos isso por escrito, no mês passado.
Casey controlou a raiva. A reunião fora pesadíssima. Desde a reação inicial de choque deles pelo fato de ela ser mulher, até o constrangimento inevitável, o excesso de cortesia, esperando que ela se sentasse, esperando que falasse, depois não se sentando até que ela mandasse, conversando fiado, não querendo tratar de negócios, não querendo negociar com ela como pessoa, como empresária, de modo algum, todos dizendo, ao invés disso, que as mulheres teriam grande prazer em levá-la às compras, depois ficando de boca aberta porque ela conhecia todos os detalhes particulares da transação em projeto. Tudo fazia parte de um esquema com o qual, normalmente, estava habituada a lidar com facilidade. Mas não naquele dia. "Deus", pensou, "tenho que me sair bem. Tenho que sacudi-los."
— É, realmente, muito fácil — dissera inicialmente, tentando dissipar o constrangimento deles, usando sua abertura padrão. — Esqueçam que sou mulher... julguem-me pela minha capacidade. Bem, temos três tópicos na nossa agenda: as fábricas de poliuretano, a representação do arrendamento de computadores, e, finalmente, a representação geral dos nossos produtos derivados do petróleo, fertilizantes, produtos farmacêuticos e esportivos por toda a Ásia. Primeiro, vamos debater as fábricas de poliuretano, os suprimentos da mistura da substância química e um projeto do prazo para o financiamento.
Logo a seguir, ela lhes apresentou os gráficos e a documentação preparada, fez uma sinopse verbal de todos os fatos, números e porcentagens, taxas dos bancos, juros, tudo de maneira muito simples e rápida, de modo que até uma pessoa de inteligência curta poderia entender o projeto. E agora, todos a fitavam.
Andrew Gavallan rompeu o silêncio.
— Muito impressionante, minha cara.
— Na verdade, não sou "sua cara" — disse ela, com uma risada. — Sou muito cabeça-dura na defesa da minha companhia.
— Mas mademoiselle — disse Jacques de Ville, com suave charme francês —, sua cabeça é perfeita, e não é nada dura.
— Merci, monsieur — replicou ela imediatamente, e acrescentou despreocupadamente, num francês passáveclass="underline" — Mas, por favor, deixemos de lado a forma da minha cabeça, e discutamos a forma da transação em pauta. É melhor não misturarmos as coisas, não acha?
Novo silêncio.
— Quer um pouco de café? — perguntou Linbar Struan.