— Alô — cumprimentou Bartlett.
— Oi... ah, Linc Bartlett? O contrabandista de armas americano? — disse, rindo.
— Como?
— Não fique tão chocado, Sr. Bartlett. Todo mundo em Hong Kong já sabe... Hong Kong não passa de uma aldeia.
— Falando sério... como soube?
— Li no jornal da manhã.
— Impossível. Aconteceu às cinco e meia da manhã.
— Foi no Fai Pao, o Expresso, na coluna de última hora, às nove horas. É um jornal chinês, e os chineses sabem de tudo o que se passa aqui. Não se preocupe, os jornais ingleses não saberão da novidade até as edições vespertinas, mas pode esperar a imprensa na sua porta por volta da hora dos coquetéis.
— Obrigado.
"A última coisa que estou querendo é a maldita imprensa atrás de mim", pensou Bartlett com azedume.
— Não se preocupe, Sr. Bartlett, não vou pedir entrevista, embora seja uma repórter free lance da imprensa chinesa. Sou mesmo muito discreta — falou. — Não sou, Quillan?
— Sem dúvida. Tem a minha garantia... Orlanda é totalmente digna de confiança — falou Gornt.
— Claro, se quiser me oferecer uma entrevista... aceitarei. Amanhã.
— Vou pensar no seu caso.
— Prometo que o farei parecer maravilhoso!
— Os chineses sabem mesmo de tudo por aqui?
— Claro — disse ela, prontamente. — Mas os quai loh, os estrangeiros, não lêem os jornais chineses, exceto uma meia dúzia de gente que está "por dentro"... como Quillan.
— E todo o pessoal do Serviço Especial de Informações, da Seção Especial e a polícia em geral — disse Gornt.
— E Ian Dunross — acrescentou ela, com a ponta da língua tocando os dentes.
— Ah, ele é vivo assim? — perguntou Bartlett.
— Ah, é. Tem o sangue do Demônio Struan nas veias.
— Não entendi.
— Vai entender, se ficar por aqui algum tempo. Bartlett pensou na frase, depois franziu o cenho.
— Também sabia das armas, Sr. Gornt?
— Apenas que a polícia havia interceptado armas contrabandeadas a bordo do "jato particular do americano milionário que chegou ontem à noite". Também estava no meu jornal chinês matinal. O Sing Pao. — O sorriso de Gornt era sardônico. — É The Times em cantonense. Também estava na sua coluna de última hora. Mas, ao contrário de Orlanda, estou surpreso pelo fato de o senhor ainda não ter sido interceptado por membros da nossa imprensa inglesa. São muito diligentes, aqui em Hong Kong. Mais diligentes do que Orlanda diz que são.
Bartlett sentiu o perfume dela, mas continuou.
— Estou surpreso de que não tenha mencionado o fato, Sr. Gornt.
— E por que mencionaria? O que é que as armas têm a ver com a nossa possível futura associação? — Gornt deu uma risadinha abafada. — Se o pior acontecer, iremos visitá-lo na cadeia, Orlanda e eu.
Ela riu.
— Sem dúvida.
— Muitíssimo obrigado! — O perfume dela, de novo. Bartlett esqueceu as armas e concentrou-se nela. — Ramos... é espanhol?
— Português. De Macau. Meu pai trabalhava para a Rothwell-Gornt em Xangai... minha mãe nasceu lá. Fui criada em Xangai até 49, depois fui para os Estados Unidos durante alguns anos, para a escola secundária em San Francisco.
— É mesmo? Los Angeles é minha cidade natal... fiz a escola secundária no vale.
— Adoro a Califórnia — disse ela. — Que tal está achando Hong Kong?
— Acabo de chegar. — Bartlett abriu um sorriso. — Parece que tive uma entrada explosiva.
Ela riu. Lindos dentes brancos.
— Hong Kong não é má... desde que a gente possa sair daqui, mais ou menos de mês em mês. Devia passar um fim de semana em Macau... é antiquada, muito bonita, fica a apenas sessenta quilômetros de distância, com bom serviço de barcas. É muito diferente de Hong Kong. — Voltou-se para Gornt. — Mais uma vez, desculpe ter interrompido. Quillan, só quis dar um alô...
Começou a se retirar.
— Não, já acabamos... eu já ia embora — disse Bartlett, interrompendo-a. — Obrigado, mais uma vez, Gornt. Até terça, se não antes... Espero vê-la de novo, srta. Ramos.
— Seria um prazer. Eis meu cartão... se me der a entrevista, garanto que ela lhe será simpática.
Ela estendeu a mão, ele a tocou e sentiu seu calor.
Gornt acompanhou-o até a porta, depois fechou-a, voltou à sua mesa e pegou um cigarro. A moça acendeu o fósforo para ele, depois soprou a chama, e foi sentar-se na cadeira que Bartlett ocupara.
— Um cara bonitão — comentou.
— É. Mas é americano, ingênuo, e um filho da mãe arrogante que talvez precise baixar um pouco a crista.
— É o que quer que eu faça?
— Pode ser. Leu o dossiê dele?
— Li. Muito interessante. Orlanda sorriu.
— Não deve pedir-lhe dinheiro — disse Gornt, bruscamente.
— Ayeeyah, Quillan, será que sou tão burra? — perguntou ela, igualmente ríspida, olhos faiscando.
— Ótimo.
— Por que ele contrabandearia armas para Hong Kong? — É mesmo de se perguntar por quê, minha cara. Talvez alguém o esteja usando.
— Deve ser essa a resposta. Se tivesse todo o dinheiro que ele tem, jamais faria uma burrice dessas.
— Não — falou Gornt.
— Como é, gostou da história de eu ser uma repórter free lance? Achei que me saí muito bem.
— É, mas não o subestime. Não é nenhum tolo. É vivo. Vivíssimo. — Contou-lhe sobre o Casale. — É coincidência demais. Ele também deve ter um dossiê sobre a minha pessoa, e bem detalhado. Não há muita gente que saiba que gosto daquele restaurante.
— Quem sabe também estou no dossiê.
— Talvez. Não deixe que a pegue, na tal história de ser repórter free lance.
— Ora, qual é, Quillan? Quem, entre os tai-pans, exceto você e Dunross, lê os jornais chineses? e mesmo assim não podem ler todos. Já escrevi uma ou duas colunas... como "correspondente especial". Se ele me conceder a entrevista, posso escrevê-la. Não se preocupe. — Levou o cinzeiro para mais perto dele. — Saiu tudo bem, não foi? Com Bartlett?
— Perfeitamente. Está sendo desperdiçada. Devia estar trabalhando no cinema.
— Então fale com seu amigo a meu respeito, por favor, por favor, Quillan querido. Charlie Wang é o maior produtor de Hong Kong, e lhe deve tantos favores! Charlie Wang tem tantos filmes em andamento, que... só preciso de uma chance... podia me tornar uma estrela! Por favor!
— Por que não? — comentou ele, secamente. — Mas não creio que você seja o tipo dele.
— Posso me adaptar. Não agi exatamente como você queria, com Bartlett? Não estou vestida perfeitamente, à moda americana?
— É, está sim. — Gornt olhou para ela, depois falou, delicadamente: — Podia ser perfeita, para ele. Estava pensando que vocês dois podiam, quem sabe, ter algo mais permanente do que um simples caso...
Ela ficou completamente atenta.
— O quê?
— Você e ele podiam se ajustar como um perfeito quebra-cabeças chinês. Você é bem-humorada, da idade certa, linda, esperta, educada, maravilhosa na cama, muito inteligente, com verniz americano suficiente para deixá-lo à vontade. — Gornt exalou a fumaça e acrescentou: — E de todas as damas que conheço, você seria a que mais gastaria o dinheiro dele. É, vocês dois se encaixariam perfeitamente... ele seria ótimo para você, que iluminaria a vida dele consideravelmente. Não é?
— Ah, sim — retrucou ela, prontamente. — Ah, sim, iluminaria. — Sorriu, depois franziu o cenho. — Mas, e quanto à mulher que o acompanha? Estão juntos numa suíte do Vic. Ouvi falar que é maravilhosa. E quanto a ela, Quillan? Gornt deu um débil sorriso.
— Meus espiões dizem que eles não dormem juntos, embora sejam mais que amigos.
O rosto dela expressou desalento.
— Ele não é bicha, é?
Gornt soltou uma risada gostosa.
— Não faria isso com você, Orlanda! Não, estou certo que não. É só um acordo estranho que ele tem com Casey.