— Está bem, obrigado.
Vinham chegando mais maças. Uma ambulância encostou. Os carregadores das maças colocaram na ambulância os feridos etiquetados, e o veículo se afastou sob a garoa. Do lado de fora, longe do fedor de sangue e morte, o rapaz sentiu-se melhor.
— Alô, Paul, como vão indo as coisas?
— Oh, oh, alô, tai-pan! Bem, obrigado.
Ele havia encontrado o tai-pan anteriormente e lhe contara sobre Quatro Dedos. Dunross ficara chocado e muito preocupado.
— Nada ainda, Paul?
— Não, senhor. Dunross hesitou.
— Às vezes nenhuma notícia é boa notícia. Se o Ching Sorridente pôde sobreviver, vamos torcer pelo melhor, não é?
— É, sim, senhor.
Paul Choy ficou olhando Dunross subir apressado a rua na direção da barricada, sua mente repassando todas as permu-tações que imaginara. "Com a fantástica compra de controle da General Stores pelo tai-pan (que coisa mais inteligente!), e agora, escapando à armadilha do Gornt, as ações dele têm que chegar até 30. E com o Ho-Pak cotado a 12,50, no momento em que voltar a pregão terá que ir a 20. Agora, calcule, 17,5 por cento de dez milhões, vezes 50, são..."
— Sr. Choy! Sr. Choy!
Era o dr. Tooley chamando-o da estação de socorro. O coração dele parou. Correu com quantas forças tinha.
— Não tenho certeza, mas, por favor, acompanhe-me. Não havia como errar. Era o Wu Quatro Dedos. Estava morto, aparentemente incólume. No seu rosto havia uma calma maravilhosa, e um sorriso estranho e angelical.
As lágrimas começaram a escorrer pelas faces de Paul Choy. Agachou-se ao lado da maca, dominado pela dor. Cheio de compaixão, o dr. Tooley o deixou e foi para junto das outras maças, onde agora alguém gritava, outra mão desesperada agarrando ao peito o corpo destroçado de um filho.
Paul Choy fitou o rosto, um rosto bom, na morte, quase sem vê-lo.
"E agora?", perguntou-se, enxugando as lágrimas, sem sentir realmente que havia perdido um pai, mas sim o chefe da família, o que, nas famílias chinesas, é pior do que perder o próprio pai. "Deus, e agora? Não sou o filho mais velho, portanto não terei que tomar as providências. Mas, mesmo assim, o que faço agora?"
Uns soluços chamaram sua atenção. Era um velho que soluçava por uma velha deitada numa maca próxima. "Tanta morte aqui, demais!", pensou Paul Choy. "É. Mas os mortos têm que enterrar os mortos, os vivos têm que continuar. Não estou mais ligado a ele. E sou americano."
Ergueu o cobertor como se fosse cobrir o rosto de Quatro Dedos, tirou habilmente o colar de couro com a meia moeda e enfiou-o no bolso. Certificando-se de novo de que não havia ninguém olhando, revistou os bolsos. Notas numa carteira, um molho de chaves, o carimbo de bolso pessoal. E o anel de diamantes na sua caixinha.
Levantou-se e dirigiu-se para o dr. Tooley.
— Com licença, doutor. Por favor, por favor, quer deixar o velho aí? Volto logo com um carro. A família, nós... Pode ser?
— Claro. Informem à polícia antes de o levarem, o setor de pessoas desaparecidas está instalado na barricada. Vou assinar a certidão de óbito amanhã. Desculpe, mas não há tem... — Novamente o bondoso homem teve a atenção voltada para outro lugar, e foi até onde estava o dr. Meng. — Pronto, deixe-me ajudar. É como na Coréia, não?
Paul Choy desceu o morro, sem ligar para a garoa, o coração leve, o estômago no lugar, o futuro definido. "Agora a moeda é minha", disse a si mesmo, certo de que Quatro Dedos não teria contado a ninguém, atendo-se à sua habitual reserva, confiando apenas naqueles de quem não podia prescindir.
"Agora que tenho o carimbo pessoal dele, posso carimbar o que quiser, fazer o que quiser, mas não vou fazer isso. Isso é trapacear. Por que devo trapacear quando estou levando vantagem? Sou mais esperto do que qualquer dos outros filhos dele. Eles sabem, eu sei, e isso não é bancar o maluco. Sou melhor. É apenas justiça que eu fique com a moeda e todos os lucros dos dois milhões. Vou ajudar a família, modernizar tudo, equipar os barcos, fazer o que eles quiserem. Mas com o meu lucro vou dar início ao meu próprio império. Claro. Mas, primeiro, vou para o Havaí..."
No começo da fila de carros, perto do primeiro deslizamento, Dunross parou ao lado do seu carro e abriu a porta do banco de trás. Casey despertou bruscamente do seu devaneio, e seu rosto perdeu a cor.
— Linc?
— Não. Ainda nada. Quillan tem quase certeza de que localizou a área. Os gurkhas estão revistando aquela parte agora. Vou para Iá substituí-lo. — Dunross tentou parecer confiante. — Os peritos dizem que há uma chance muito boa de que ele esteja bem. Não se preocupe. Você está bem?
— Sim, estou, obrigada.
Quando ele voltara da primeira busca, mandara Lim ir apanhar café, sanduíches e uma garrafa de conhaque, sabendo que a noite ia ser muito comprida. Quisera deixar Casey com Riko, mas ela se recusara. E então Riko voltara para o hotel, no outro carro, com Lim.
— Quer um conhaque, Ian? — perguntou Casey.
— Obrigado. — Ele a observou enquanto ela o servia, notando que os dedos estavam firmes. O conhaque sabia bem. — Vou levar um sanduíche para o Quillan. Por que não põe uma boa dose de conhaque no café, hem? Levo isso também.
— Certo — disse ela, satisfeita por poder fazer alguma coisa. — Mais gente foi resgatada?
— Donald McBride... está bem, só abalado. Tanto ele quanto a mulher.
— Ah, que bom! Algum, algum cadáver?
— Ninguém que eu conheça — replicou, decidindo não lhe contar sobre o Plumm ou seu velho amigo Southerby, presidente da junta diretora do Blacs.
Naquele momento, Adryon e Martin Haply apareceram intempestivamente, e Adryon abraçou-o com força, soluçando de alívio.
— Oh, papai, acabamos de saber, oh, papai, eu estava apavorada!
— Pronto, pronto! — disse ele, acalmando-a. — Estou bem. Santo Deus, Adryon, avalancha maldita nenhuma jamais tocará o tai-pan da Casa No...
— Ah, não fale assim! — suplicou ela, com um arrepio de pavor supersticioso. — Nunca fale assim! Estamos na China, os deuses escutam, não fale assim!
— Está bem, meu amor! — Dunross abraçou-a e sorriu para Martin Haply, que também estava cheio de alívio. — Tudo bem?
— Oh, sim, senhor, estávamos Iá em Kowloon, eu estava fazendo a cobertura do outro deslizamento quando soubemos da notícia. — O jovem estava aliviado. — Puxa vida, mas como estou contente por vê-lo, tai-pan! Nós... infelizmente amassamos um pouco o carro para chegar aqui.
— Não faz mal. — Dunross afastou Adryon de si um pouco. — Tudo bem, filhinha?
Ela o abraçou de novo.
— Tudo bem. — Foi então que viu Casey. — Oh, oh, alô, Casey, eu estava tão...
— Deixe de ser boba! Entrem e saiam da chuva! Os dois. Adryon obedeceu, Martin Haply hesitou, depois disse para Dunross:
— Se não se importa, senhor, vou dar uma olhada por aí.
— Christian se salvou — disse Dunross rapidamente.
— Eu sei, senhor. Liguei para o escritório. Obrigado. Não vou demorar muito, meu bem — disse para Adryon, e dirigiu-se para a barricada.
Dunross observou-o enquanto ele se afastava, jovem, durão e muito autoconfiante, depois enxergou Gornt descendo o morro, apressado. Gornt parou, bem longe do carro, e fez-lhe um sinal ansioso. Dunross lançou um olhar para Casey, o coração batendo inquieto. De onde estava, ela não podia ver Gornt.
— Volto logo que puder.
— Cuide-se.
Dunross acercou-se de Gornt. O homem mais velho estava imundo, as roupas rasgadas, a barba empastada, o rosto tenso.
— Nós o localizamos — disse Gornt. — Bartlett.
— Está morto?
— Não, nós o encontramos, mas não conseguimos chegar até ele. — Gornt fez um gesto para a garrafa térmica. — É chá?