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"Claro. Mas ainda não sei o que há nela, ou em Hong Kong, que mexeu comigo. É o melhor lugar em que já estive, e sinto-me mais em casa aqui do que nos Estados Unidos."

— Talvez, Linc, você tenha estado aqui numa vida anterior — Orlanda lhe dissera.

— Acredita em reencarnação?

— Claro que sim!

"Não seria uma maravilha", pensou ele, no seu devaneio, sem notar o gás, ou que agora o gás o estava afetando um pouco. "Ter mais de uma vida seria a coisa de mais sorte do mundo, e..."

— Linc!

— Oi, Ian, o que é que há?

A felicidade de Bartlett aumentou. A voz de Dunross estava bem perto, muito perto.

— Nada. Só vamos dar uma paradinha rápida. A barra está pesada, temos que fazer novo desvio, mas estamos apenas a poucos metros de distância. Pensei em batermos um papinho. Pelo que podemos calcular, estamos um metro e meio acima de você, vindos do oeste. Já dá para nos ver?

— Não. Há um soalho acima de mim, todo estropiado, e vigas, mas estou bem. Posso esperar aqui facilmente. Ei, sabe de uma coisa?

— O quê?

— Hoje foi a primeira vez que você me chamou de Linc.

— É? Não tinha notado.

"Não, porra nenhuma", pensou Bartlett, e riu consigo mesmo.

— O que você... — Os dois homens ficaram subitamente gelados quando os escombros começaram a gemer, retorcendo-se aqui e ali. Dali a um momento o barulho cessou, pelo menos a maior parte. Bartlett começou a respirar mais serenamente. — O que vai fazer amanhã?

— Sobre o quê?

— A Bolsa de Valores. Como vai derrotar o Gornt? — Escutou com assombro crescente enquanto Dunross lhe contava sobre o dinheiro do Banco da China, a festa de Plumm, e o seu desafio ao Gornt, apoiado pelo seu novo fundo de cinqüenta milhões. — Fantástico! Quem está bancando você, Ian?

— Papai Noel. Bartlett achou graça.

— Com que então Murtagh salvou a pátria? Escutou o silêncio e sorriu de novo.

— Casey lhe contou?

— Não. Não, foi o que imaginei. Já lhe disse que a Casey é viva pra burro. Então você está completamente salvo. Parabéns! — falou com um sorriso amplo, e com sinceridade.

— Pensei que o tinha pegado pelo pé, Ian. — Bartlett riu.

— Acha mesmo que suas ações vão abrir a 30?

— Estou torcendo.

— Se está torcendo, isso quer dizer que você e seus amigos já estão com tudo acertado. Mas o Gornt é sabido. Você não vai pegá-lo.

— Ah, vou, sim.

— Não vai, não! E quanto ao nosso acordo?

— A Par-Con? Continua de pé, é claro. Pensei que isso já estivesse definido.

Bartlett notou o tom de inocência seca.

— O Quillan deve estar quase tendo um troço!

— E está! Está aqui em cima, ajudando, também.

— Por quê? — perguntou Bartlett, surpreso. Houve uma pausa.

— O Quillan é um calhorda de primeira, de vinte e quatro quilates, mas... não sei. Talvez goste de você!

— Foda-se você também! — retrucou Bartlett, igualmente bem-humorado. — O que vai fazer quanto ao Quillan?

— Fiz-lhe uma proposta — falou Dunross, contando qual fora.

Bartlett soltou um resmungo.

— Quer dizer que os meus dois milhões entraram pelo cano?

— Naturalmente. Aqueles dois milhões. Mas sua parte na compra de controle da General Stores lhe dará cinco, talvez mais, e o nosso negócio Struan-Par-Con muito mais.

— Calcula mesmo cinco?

— Sim. Cinco para você, cinco para Casey.

— Ótimo! Sempre quis que ela tivesse o seu dinheiro do dane-se. — "O que será que ela vai fazer agora?", ele se perguntou. — Ela sempre quis ser independente, e agora é. Formidável! O que foi? — perguntou, pois não escutara o que Dunross acabara de dizer.

— Disse: não quer falar com ela? É meio complicado, mas ela pode vir em segurança.

— Não — disse Bartlett, com firmeza. — Basta dizer-lhe um "oi"; falarei direito com ela quando sair.

— Casey falou que não vai se mexer até você sair. — Uma ligeira pausa. — A Orlanda também. E quanto a ela? Quer dizer um alô, ou coisa parecida?

— Não, obrigado. Haverá tempo de sobra mais tarde. Mande as duas irem para casa.

— Não irão. Ao que parece, você é muito popular. Bartlett riu, sentou-se e bateu com a cabeça. Uma dor lhe desceu pelas costas e ele gemeu, depois ajeitou-se mais confortavelmente, a cabeça quase tocando o teto.

Dunross estava apertado num espaçozinho não muito afastado, no fim da passagem sinuosa, odiando o abafamento, a claustrofobia nauseante, um suor gelado a ensopá-lo por causa dela. Não via sinal de Bartlett, mas notara que a voz dele soara forte e confiante. Hooks pedira-lhe para manter Bartlett conversando enquanto descansavam, para o caso de o gás o estar entorpecendo.

— A gente nunca sabe, tai-pan, o gás é traiçoeiro. Precisamos dele alerta. Daqui a pouco vamos precisar da ajuda dele.

O tai-pan se contorceu, inquieto, pressentindo perigo. Alguém vinha descendo, o entulho cascateando à sua passagem. Era Hooks. Parou a curta distância dele.

— Pronto, tai-pan. É melhor sair agora, vou mandar os meus rapazes voltarem.

— Já estou saindo, Linc! Fique acordado. Vamos recomeçar.

— Certo, tudo bem. Escute, Ian, aceitaria ser padrinho de casamento?

— Sem dúvida — respondeu imediatamente, o cérebro gritando: "Qual delas?" — Seria uma honra.

— Obrigado — ouviu Bartlett responder, e por mais vontade que tivesse de saber, sabia que jamais lhe perguntaria. Tinha certeza de que Bartlett iria dizer o nome. Mas tudo o que ele disse foi: — Obrigado. É, muito obrigado.

Sorriu, surpreso. "O Linc está aprendendo", disse com seus botões. "Será bom tê-lo como sócio... e como sócio votante do Turf Club. A Casey também..."

— Num instantinho o tiraremos daí! Enquanto ia se afastando, ouviu:

— Não seria ótimo se elas pudessem ser amigas? Será que é demais esperar isso?

Dunross não tinha certeza se as palavras tinham sido ditas para ele.

— O quê? — chamou.

— Nada — replicou Bartlett. — Puxa, Ian, temos um bocado de coisas para fazer esta semana! Ei, estou contente de que você tenha ganho do Gornt!

"É", falou consigo mesmo, satisfeito. "Vai ser bom manobrar com você, vigiando-o atentamente, construindo a nossa Casa Nobre."

A uns oito metros de distância, e poucos metros acima, Dunross virou-se desajeitadamente e recomeçou a subir.

Quase uns cinco metros acima dele, Gornt e os outros esperavam junto à boca grandemente ampliada da cova. A aurora clareava o leste, uma nesga de céu aparecendo agora entre as nuvens. Por toda a encosta, homens cansados ainda cavavam, procuravam, chamavam e escutavam. Exausto, Hooks arrastou-se para fora da cova profunda. Naquele momento, houve um barulho tremendo vindo Iá de cima, de perto da Po Shan Road. Todas as cabeças se viraram bruscamente. Então, bem acima e à esquerda, viram parte da encosta se mover. O barulho aumentou, então uma parede de água e lama apareceu por trás da curva da colina na Kotewall Road e, ganhando velocidade, correu para cima deles. Homens começaram a correr enquanto a crista do aluvião descia até onde estivera o saguão, e se derramava por sobre a encosta e os escombros, inundan-do-os, a imensa massa de lodo forçando a crista para a frente e para baixo. Gornt viu-a vindo e se agarrou a uma viga mestra; os outros se agarraram onde podiam. O lodo fétido chegou até eles e passou, Gornt enterrado até os joelhos, mas agarrando-se firme contra a sucção. A onda seguiu em frente, cobrindo tudo com centímetros de lama, Hooks e os outros safando-se do lodaçal, tudo o mais momentaneamente esquecido.