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O sorriso do Rei era amplo.

— Então você é o único que sabe como fazê-lo.

— Ah, não! — exclamou Peter Marlowe, e o coração do Rei pareceu afundar. — É um costume nativo, espalhado por Java inteira.

— Mas aqui ninguém o conhece, certo? — indagou o Rei, animando-se.

— Não sei, nunca me preocupei com isso.

O Rei soltou a fumaça pelas narinas e sua cabeça funcionava a 1.000 por hora. Ora, disse consigo mesmo, este é meu dia de sorte.

— Escute aqui, Peter. Tenho uma proposta comercial para lhe fazer. Mostre-me exatamente como se faz, e eu lhe darei... — hesitou. — Dez por cento.

— Como?

— Está certo. Vinte e cinco.

— Vinte e cinco?

— Está bem — disse o Rei, olhando para Peter Marlowe com novo respeito. — Você se vende caro, e isso é bom. Organizo a transa toda. Compraremos grandes quantidades. Teremos que montar uma fábrica. Você supervisiona a produção e eu cuido das vendas. — Estendeu a mão. — Seremos sócios... rachando meio a meio. Negócio fechado.

Peter Marlowe olhou para a mão estendida do Rei. Depois, para seu rosto. Falou, decisivamente:

— Fechado coisa nenhuma!

— Porra — explodiu o Rei — essa é a melhor oferta que vai receber. O que podia ser mais justo? Vou levantar a grana; terei que... — Deteve-se, tomado por um pensamento repentino. — Peter — disse, após um momento, magoado, mas sem deixar transparecer — ninguém tem que saber que somos sócios. Basta mostrar-me como preparar o fumo, e terá sua parte. Pode confiar em mim.

— Sei disso — replicou Peter Marlowe.

— Então, rachamos meio a meio — repetiu o Rei, sorriso de orelha a orelha.

— Não rachamos, não.

— Santo Deus! — exclamou o Rei, sentindo-se pressionado. Mas controlou-se e pensou no negócio. E quanto mais pensava... Olhou à sua volta para se certificar de que não havia ninguém escutando. Depois baixou a voz e disse, roucamente: — Sessenta-quarenta, e jamais ofereci isso a ninguém, na vida: sessenta-quarenta.

— Nada feito.

— Como? — explodiu o Rei, chocado. — Também tenho que tirar algum lucro no negócio. Que diabo está querendo pelo processo? Dinheiro à vista?

— Não estou querendo nada — falou Peter Marlowe.

— Nada? — 0 Rei sentou-se debilmente, destroçado. Peter Marlowe estava confuso.

— Sabe — falou, hesitante — não entendo por que você fica tão entusiasmado com certas coisas. Não posso vender o processo, não me pertence. É um simples costume nativo. Por isso, não poderia aceitar nada de você. Não seria correto. De modo algum. E além disso, eu... — Peter Marlowe se deteve e perguntou, rapidamente. — Quer que lhe ensine, agora?

— Espere aí. Está querendo dizer que não quer nada por me mostrar o processo? Quando ofereci para racharmos sessenta-quarenta? Quando lhe estou dizendo que posso ganhar dinheiro com o negócio? — Peter Marlowe fez que sim com a cabeça. — Mas é uma loucura — falou o Rei, abobado. — Está errado, não entendo.

— Não há o que entender — retrucou Peter Marlowe, com um débil sorriso. — Faça de conta que estou com insolação.

O Rei o examinou por um longo momento:

— Quer dar-me uma resposta franca a uma pergunta franca?

— Claro que sim.

— É por minha causa, não é?

As palavras pesaram no calor, entre os dois.

— Não — respondeu Peter Marlowe, quebrando o silêncio. E havia verdade entre eles.

Uma hora mais tarde, Peter Marlowe estava vendo Tex cozinhar a segunda leva de tabaco. Desta feita, Tex o fazia sem ajuda, e o Rei cacarejava por perto, como uma galinha velha.

— Tem certeza de que ele botou a quantidade certa de açúcar? — perguntou o Rei a Peter Marlowe, ansioso.

— Certíssima.

— Quanto tempo ainda demora?

— Quanto tempo você acha, Tex?

Este devolveu o sorriso de Peter Marlowe e esticou o corpo desengonçado de mais de 1,90m.

— Mais ou menos uns cinco, seis minutos.

— Onde fica a casinha? — perguntou Peter Marlowe, levantando-se.

— A privada? Nos fundos, pelo lado de fora. — O Rei apontou. — Mas não dá para esperar até o Tex terminar? Quero ter certeza de que fez tudo direito.

— O Tex está indo muito bem — disse Peter Marlowe, afastando-se. Quando voltou, Tex tirou a frigideira do fogo.

— Pronto — falou, nervoso, e olhou para Peter Marlowe, para ver se agira na hora certa.

— No ponto — disse Peter Marlowe, examinando o tabaco preparado. Todo excitado, o Rei enrolou um cigarro com papel de arroz. Tex e Peter Marlowe fizeram o mesmo. Acenderam os cigarros. Com o Ronson. Mais uma risada gostosa. E então, silêncio, enquanto cada homem se tornava um con-noisseur.

— Muito bom — declarou Peter Marlowe. — Disse-lhe que era bem simples, Tex.

Tex soltou um suspiro de alívio.

— Nada mau — falou o Rei, pensativo.

— Mas de que diabo está falando — explodiu Tex. — Está danado de bom!

Peter Marlowe e o Rei dobravam-se de rir. Explicaram por que, e Tex também começou a rir.

— Temos que dar um nome ao produto. — O Rei pensou por um momento. — Já sei. Que tal Três Reis? Um pela Real Força Aérea, um pelo Rei Texas, e um por por mim.

— Nada mau — disse Tex.

— Vamos começar a fabricação amanhã. Tex sacudiu a cabeça.

— Fui destacado para um grupo de trabalho.

— Ele que vá para o diabo! Vou mandar o Dino substituí-lo.

— Não, deixe que peço a ele. — Tex levantou-se e sorriu para Peter Marlowe. — Prazer em conhecê-lo, senhor.

— Vamos esquecer o senhor, está bem? — falou Peter Marlowe.

— Claro. Obrigado.

Peter Marlowe ficou olhando Tex afastar-se.

— Gozado — comentou, suavemente, com o Rei. — Nunca vi tantos sorrisos numa só cabana, antes.

— Não há por que não sorrir, não é mesmo? As coisas podiam ser bem piores. Você foi abatido voando sobre a corcova?

— Refere-se à rota Calcutá-Chungking? Sobre o Himalaia?

— É. — O Rei fez sinal para o tabaco. — Encha sua caixa.

— Obrigado. Se não se importa...

— Sempre que estiver com pouco fumo, venha servir-se.

— Obrigado, aceito. É muito gentil. — Peter Marlowe queria mais um cigarro, mas sabia que estava fumando demais. Se fumasse outro agora, a fome ainda seria maior. Melhor ir com calma. Olhou para a sombra do Sol e prometeu-se que não fumaria de novo até que a sombra se mexesse cinco centímetros. — Não fui abatido. A minha pandorga... o meu avião foi atingido num ataque aéreo a Java. Não consegui levantá-lo. Um saco — acrescentou, tentando disfarçar o amargor.

— Não foi tão ruim assim — disse o Rei. — Você podia ter estado dentro dele. Está vivo, e é isso que conta. Que tipo de avião pilotava?

— Um Hurricane. Avião de combate de um só lugar. Mas o meu avião regular é um Spit... Spitfire.

— Já ouvi falar deles... mas nunca vi nenhum. Vocês deixaram os alemães com cara de besta, hem?

— Foi — disse Peter Marlowe, baixinho. — Deixamos mesmo. O Rei ficou surpreso.

— Você não esteve na Batalha da Inglaterra, esteve?

— Estive. Recebi as minhas asas em 1940... bem na horinha.

— Quantos anos tinha?

— Dezenove.

— Puxa, olhando para sua cara, diria que você tinha pelo menos trinta e oito anos, e não vinte e quatro!

— Ora, vá tomar no...! — Peter Marlowe riu. — Quantos anos você têm?

— Vinte e cinco. Que merda! — exclamou o Rei. — Os melhores anos da minha vida, e cá estou eu trancafiado numa cadeia fedorenta!

— Você não está trancafiado. E me parece estar-se saindo muito bem.

— Ainda estamos trancafiados, de um jeito ou de outro. Quanto tempo acha que isso ainda vai durar?

— Botamos os alemães para correr. Não vai demorar muito.