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— Trinta Kassih... obrigado. — O Rei estendeu a mão para Cheng San. — Como tem passado, Cheng San?

— Eu bom tempo todo. Sabe, eu... — Cheng San buscou a palavra, e então ela apareceu. — Aqui, quem sabe tempo bom também.

O Rei indicou Peter Marlowe.

— Ichi-bon amigo. Peter, diga-lhes alguma coisa, sabe como é, saudações e essa coisa toda. Ao trabalho, rapaz. — Sorriu, puxou um maço de Kooas e ofereceu ciganos a todos.

— Meu amigo e eu vos agradecemos a acolhida — começou Peter Marlowe. — Apreciamos a gentileza do vosso convite para comermos convosco, sabendo da escassez que há atualmente. Certamente apenas uma cobra da selva recusar-se-ia a aceitar a generosidade de vossa oferta.

Tanto Cheng San quanto o chefe abriram enormes sorrisos.

— Wah-lah — disse Cheng San. — Vai ser bom poder dizer através de vós ao meu amigo Rajá todas as palavras que estão na minha boca miserável. Muitas vezes tive vontade de dizer coisas, mas nem eu nem meu bom amigo Sutra conseguíamos achar as palavras para dizê-las. Diga ao Rajá que é um homem sábio e astuto de encontrar um intérprete tão fluente.

— Ele disse que sou um bom porta-voz — falou Peter Marlowe satisfeito, agora sentindo-se calmo e seguro. — E está contente que agora pode mandar brasa direto.

— Pelo amor de Deus, continue falando o seu inglês bem-educado. Esse papo de porta-voz está fazendo você parecer um vagabundo.

— Oh, e tenho estudado Marx com muita assiduidade — disse Peter Marlowe, vexado.

— Pois então pare.

— Ele também o chamou de Rajá. Vai ser o seu apelido daqui pra frente. Quero dizer, “de agora em diante”.

— Vá à merda, Peter!

— Vá tomar no..., irmão!

— Vamos, Peter, não temos muito tempo. Diga isso ao Cheng San. Quanto à nossa transação. Vou...

— Ainda não pode falar de negócios, meu velho — disse Peter Marlowe, chocado. — Vai estragar tudo. Primeiro, teremos que tomar café, depois comer alguma coisa, e só então começar.

— Diga-lhes agora.

— Se o fizer, ficarão muito ofendidos. Ofendidíssimos. Escute o que lhe digo.

O Rei pensou por um momento. Bem, disse consigo mesmo, se você compra um “crânio”, não é bom negócio não usá-lo... salvo se você tiver um palpite. É aí que o negociante esperto se faz ou se destrói... quando vai pelo seu palpite, e não pelo “crânio”. Mas, no presente caso, não tinha nenhum palpite, portanto concordou.

— Tudo bem. Faça como quiser.

Ficou fumando seu cigarro, escutando Peter Marlowe falar com eles. Examinava Cheng San de banda. Suas roupas eram melhores do que da última vez. Usava um anel novo que parecia uma safira, talvez cinco quilates. Seu rosto limpo, imberbe, era da cor do mel, e seu cabelo, bem cuidado. É, o Cheng San estava-se virando, numa boa. Quanto ao velho Sutra, não se está saindo tão bem. O sarongue dele está velho, desfiado na bainha. Nenhuma jóia. Da vez passada, tinha um anel de ouro. Agora, não tem mais, e a marca deixada pelo anel era quase imperceptível, o que significava que não o havia tirado só para a transação desta noite.

Ouviu as mulheres no outro canto da choça tagarelando baixinho, e do lado de fora, a quietude da aldeia à noite. Pela janela sem vidros chegava o cheiro do porco assado. Isso significava que a aldeia estava realmente necessitada de Cheng San — o seu atravessador no mercado negro para o peixe que a aldeia devia vender diretamente para os japoneses — e presenteava-o com o porco. Ou quem sabe o velho que pegara o porco selvagem estava dando uma festa para os amigos. Mas o pessoal em volta do fogo estava esperando ansiosamente, tão ansiosamente quanto nós. Claro que estão com fome. 0 que quer dizer que as coisas andam brabas em Cingapura. A aldeia devia ter um bom estoque de comida, bebida e tudo o mais. Cheng San não devia estar fazendo um bom trabalho em contrabandear o peixe deles para os mercados. Quem sabe os nipônicos já estavam de olho nele. Quem sabe não vai durar muito neste mundo!

Então, quem sabe precisa da aldeia mais do que a aldeia precisa dele. E se está ostentando para eles: roupas novas e jóias. Quem sabe Sutra já está de saco cheio com os negócios ruins e está pronto para trocá-lo por outro sujeito que lide com o mercado negro.

— Ei, Peter — falou. — Pergunte a Cheng San como vai o comércio de peixes em Cingapura.

Peter Marlowe traduziu a pergunta.

— Disse que o comércio vai bem. A escassez de alimentos é de tal ordem que ele consegue obter os melhores preços da ilha. Mas disse que os japoneses estão severíssimos. Está ficando mais difícil a cada dia comerciar. E infringir as leis do mercado está-se tomando cada vez mais caro.

A-rá! Peguei-o. O Rei ficou exultante. Então Cheng não viera apenas por causa do meu negócio! É o peixe e a aldeia. Como posso tirar vantagem disso? Aposto que Cheng San está tendo dificuldades em entregar a mercadoria. Quem sabe os japoneses interceptaram alguns barcos, e engrossaram. O velho Sutra não é nenhum tolo. Sem dinheiro não há negócio, e Cheng San sabe disso. Não faz transação, não faz mais negócio, e o velho Sutra vai vender para outro. Sim, senhor. Portanto, o Rei sabia que podia explorar, e mentalmente subiu seu preço inicial.

E então a comida chegou. Batata-doce assada, berinjela frita, água de coco, fatias grossas de porco assado, cheias de óleo. Bananas. Mamões. O Rei notou que não havia o “repolho do milionário” ou o cordeiro ou a carne de boi ou os doces que os malaios tanto apreciavam. É, as coisas estavam mesmo difíceis.

A comida estava sendo servida pela primeira mulher do chefe, uma velha enrugada. Era ajudada por uma das filhas dele, Sulina. Bonita, macia, curvilínea, pele cor de mel. Cheirosa. Usando um sarongue novo, em homenagem aos visitantes.

— Tabe, Sam — disse o Rei para Sulina, piscando o olho.

A garota estourou na risada, e tentou disfarçar timidamente seu embaraço.

— Sam? — disse Peter Marlowe, fazendo careta.

— Claro — respondeu o Rei, secamente. — Ela me lembra o meu irmão.

— Irmão?

— Gozação. Não tenho irmão nenhum.

— Ah! — Peter Marlowe pensou por um momento, depois perguntou: — Por que Sam?

— O velhote não me quis apresentar — disse o Rei, sem olhar para a garota — então eu lhe dei um nome. Acho que combina com ela.

Sutra sabia que o que eles estavam dizendo tinha algo a ver com a filha. Sabia que errara deixando-a entrar ali. Talvez, em outra época, ele tivesse gostado que um dos tuan-tuan a notasse, e a levasse para o seu bangalô, para ser sua amante por um ou dois anos. Então, ela voltaria para a aldeia conhecendo bem os homens, com um belo dote, e seria fácil para ele achar um bom marido para a filha. Assim é que teria sido, no passado. Mas agora, o romance significava apenas encontros casuais no meio do mato, e Sutra não queria isso para a filha, embora estivesse na hora dela tornar-se mulher.

Inclinou-se para a frente e ofereceu a Peter Marlowe um pedaço especial de porco.

— Quem sabe isto aguçaria o vosso apetite?

— Agradeço-vos.

— Pode ir, Sulina.

Peter Marlowe percebeu o tom de decisão na voz do velho, e notou a sombra de tristeza que toldou o rosto da garota. Esta inclinou-se, porém, e saiu. A velha mulher continuou lá para servir os homens.

Sulina, pensou Peter Marlowe, sentindo uma ânsia há muito esquecida. Não é tão bonita quanto N’ai, que era a perfeição, mas é da mesma idade, e bonita. Uns 14 anos, e no ponto. Meu Deus, bem no ponto.

— A comida não vos agrada? — perguntou Cheng San, divertindo-se com a atração óbvia de Peter Marlowe pela jovem. Talvez pudesse tirar proveito disso.

— Pelo contrário. Talvez seja boa demais, pois meu paladar já se desacostumou à boa comida, comendo como comemos. — Peter Marlowe lembrou-se que, para salvaguardar o bom gosto, os javaneses só falavam em parábolas sobre as mulheres. Virou-se para Sutra. — Há muito tempo, um sábio guru disse que há muitas espécies de alimento. — Alguns para o estômago, outros para os olhos, outros para o espírito. Hoje, tive alimentos para o estômago. E as vossas palavras, e as do Tuan Cheng San foram alimentos para o espirito. Estou repleto. Mesmo assim, ofereceram-me... ofereceram-nos... alimentos para os olhos. Como agradecer-vos por vossa hospitalidade?