Peter Marlowe levantou-se e chamou Townsend, e os dois juntos saíram de sob o toldo e foram esperar na escuridão. E à sua volta podiam sentir os olhares de centenas de pessoas.
— Puta merda — disse Townsend, com uma careta — antes nunca tivesse pegado este diamante. A tensão está-me matando, puta que o pariu. — Seus dedos trêmulos tocaram o barbante e a jóia, certificando-se pela milionésima vez de que estavam ao redor do seu pescoço. — Graças a Deus, esta é a última noite.
O Rei observava com crescente excitação enquanto Shagata abria a bolsa de munição e tirava de lá oito centímetros de notas; abria a camisa e apanhava um maço de cinco centímetros, e pegava nos bolsos laterais mais bolos de notas, até formar duas pilhas, cada uma com 15 centímetros de altura. Rapidamente, o Rei começou a contar as notas, e Shagata fez uma rápida e nervosa reverência, e saiu. Quando já estava na trilha novamente é que se sentiu mais seguro. Ajeitou o fuzil no ombro e começou a percorrer o campo e quase derrubou Grey, que vinha andando rapidamente.
Grey praguejou e continuou a caminhar ligeiro, ignorando a torrente de ofensas de Shagata. Desta feita, Shagata não saiu atrás do sacana nojento do prisioneiro, como devia, para dar-lhe umas porradas e ensinar-lhe a ser cortês, pois estava satisfeito por estar longe do Rei, e ansioso para voltar a seu posto.
— Tiras — sussurrou Max urgentemente, do lado de fora da lona.
O Rei agarrou as notas e se mandou de sob o toldo, sussurrando para Townsend, enquanto corria:
— Desapareça. Diga ao Timsen que estou com o dinheiro na mão, e que vamos efetuar o pagamento logo mais, quando a pressão diminuir.
Townsend sumiu na escuridão.
— Vamos indo, Peter.
O Rei ia na frente, por baixo da choça, quando Grey dobrou a esquina.
— Parem onde estão, vocês dois! — berrou Grey.
— Sim, senhor! — respondeu Max, ostensivamente, de dentro das sombras, e meteu-se no caminho, com Tex ao lado, dando cobertura ao Rei e a Peter Marlowe.
— Vocês dois, não. — Grey tentou passar por eles.
— Mas o senhor queria que a gente parasse... — começou a dizer Max, naturalmente, bloqueando de novo o caminho de Grey.
Este empurrou Max furiosamente e se meteu sob a choça, em perseguição. O Rei e Peter Marlowe já tinham pulado para dentro da vala e subido para o outro lado. Outro grupo apareceu para dar cobertura, enquanto Grey corria atrás deles.
Grey viu os dois correndo junto ao muro da cadeia, e soprou o apito, alertando os PMs já em posição. Os PMs apareceram e ficaram de guarda na área que ia do muro da cadeia ao muro da cadeia, e do muro da cadeia à cerca de arame farpado.
— Por aqui — disse o Rei, saltando pela janela da choça de Timsen. Ninguém lá dentro prestou atenção neles, mas muitos viram a saliência na camisa do Rei.
Atravessaram a choça correndo, e saíram porta afora. Um outro grupo de australianos apareceu para cobrir sua retirada, bem na hora em que Grey chegava à janela, ofegante, enxergando-os de relance. Deu a volta na cabana, correndo. Os australianos haviam coberto a fuga deles. Grey gritou, abruptamente:
— Para que lado foram? Digam! Para que lado? Um coro de “Quem?”, “Quem, senhor?”
Grey abriu caminho entre eles e foi para o campo aberto.
— Todos em posição, senhor — disse um PM, correndo para ele.
— Ótimo. Não podem ir longe. E não terão coragem de largar o dinheiro. Vamos começar a cercá-los. Avise os outros.
O Rei e Peter Marlowe correram para a extremidade norte da cadeia e pararam.
— Puta que o pariu! — exclamou o Rei.
No local onde deveria estar uma falange de australianos para lhes dar cobertura, agora havia somente um grupo de PMs. Cinco deles.
— E agora? — perguntou Peter Marlowe.
— Vamos ter que voltar. Depressa!
Movendo-se rapidamente, o Rei se perguntava: Porra, o que dera errado? E então descobriu. Quatro homens bloquearam o caminho deles, com o rosto coberto por lenços, e pedaços de pau nas mãos.
— É melhor passar o dinheiro, meu chapa, se não quiser machucar-se.
O Rei se desviou, depois atacou, com Peter Marlowe ao lado. O Rei entrou firme num dos homens, e chutou o outro na virilha. Peter Marlowe desviou-se de um golpe, mordendo um grito na garganta, quando o golpe passou de raspão no seu braço, e arrancou o pau das mãos do sujeito. O outro atacante deu no pé, e foi engolido pela escuridão.
— Puta que o pariu! — exclamou o Rei, sem fôlego — vamos dar o fora daqui.
Saíram correndo, mais uma vez. Podiam sentir os olhares que os seguiam, e esperavam novo ataque a qualquer momento. O Rei parou de chofre.
— Cuidado! Grey!
Deram meia-volta e, mantendo-se grudados ao lado de uma das choças, enfiaram-se sob ela. Ficaram deitados por um momento, ofegantes. Viram pe’s passarem correndo, e ouviram trechos de murmúrios irados:
— Foram para lá. Temos que pegá-los antes dos malditos tiras.
— Todo o campo está atrás da gente — disse o Rei.
— Vamos deixar o dinheiro aqui — falou Peter Marlowe, impotente. — Podemos enterrá-lo.
— Arriscado demais. Num minuto o encontrariam. Merda, tudo ia indo bem. Exceto que aquele filho da mãe do Timsen deixou a gente na mão. — 0 Rei enxugou o suor e a sujeira do rosto. — Pronto?
— Para que lado?
O Rei não respondeu. Arrastou-se silenciosamente de sob a choça e correu junto com as sombras, com Peter Marlowe logo atrás. Atravessou a trilha em segurança, e saltou para a funda vala de escoamento junto à cerca. Foi-se arrastando por ela até estarem quase em frente da choça americana, depois parou e se recostou na parede da vala, com a respiração aos arrancos. À volta e acima deles ouvia-se um tumulto sussurrado.
— O que houve?
— O Rei está fugindo junto com Marlowe... carregando milhares de dólares.
— Puta que o pariu! Rápido, quem sabe podemos pegá-los!
— Vamos logo!
— Vamos pegar o dinheiro.
E Grey recebia informações, Smedly-Taylor também, e Timsen também, e as informações eram confusas e Timsen praguejava e sibilava, ordenando a seus homens que os encontrassem antes dos homens de Grey ou Smedly-Taylor.
— Peguem aquele dinheiro!
Os homens de Smedly-Taylor estavam esperando, de olho nos australianos de Timsen, e também estavam confusos. Para que lado tinham ido? Onde deviam procurar?
E Grey estava esperando. Sabia que os dois caminhos de fuga achavam-se bloqueados, norte e sul. Era apenas questão de tempo. E agora o cerco se fechava. Grey sabia que os tinha encurralado, e quando os pegasse, estariam com o dinheiro. Não teriam coragem de largá-lo, não agora. Era dinheiro demais. Mas Grey não estava sabendo dos homens de Smedly-Taylor ou dos australianos de Timsen.
— Olhe — disse Peter Marlowe, ao levantar a cabeça com cuidado e espiar para dentro da escuridão.
Os olhos do Rei se estreitaram, vasculhando a noite. Foi então que viu o PM a uns 50 metros de distância. Virou-se bruscamente. Havia muitos outros fantasmas, andando apressados, procurando, buscando.
— Estamos ferrados — disse, desesperadamente.
Foi então que o Rei olhou por cima da cerca. A selva estava às escuras. E havia um guarda, arrastando os pés, do outro lado da cerca. Muito bem, falou consigo mesmo. O último plano. O plano do vai-ou-racha.
— Tome — disse, urgentemente, pegando todo o dinheiro e enfiando-o nos bolsos de Peter Marlowe. — Dou-lhe cobertura. Atravesse a cerca. É a nossa única chance.
— Santo Deus, não vou conseguir. O guarda vai-me ver...
— Vá, é a nossa única chance.
— Não vou conseguir, de jeito nenhum.
— Quando chegar ao outro lado, enterre o dinheiro e volte pelo mesmo caminho. Eu dou cobertura. Mas que merda, você tem que ir.
— Pelo amor de Deus, ele vai-me matar. Está a menos de quinze metros de distância! — exclamou Peter Marlowe. — Vamos ter que desistir!
Olhou ao derredor, procurando, alucinado, um outro meio de fuga, e o súbito movimento descuidado fez com que batesse o braço ferido na parede do esgoto, gemendo de dor.