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— Só... febre... sinto-me péssimo. — Peter Marlowe recostou-se na cama de Tex, e forçou um débil sorriso. — Aquele maldito amarelo quase me mata de susto.

— A mim também.

Grey revistou as roupas do Rei, e a caixa preta, as prateleiras e o saco de feijões, e os homens ficaram espantadíssimos quando não foi achado o diamante.

— Marlowe! — Grey estava parado diante dele.

Os olhos de Peter Marlowe estavam injetados, mal podia enxergar.

— Sim?

— Quero revistá-lo.

— Ouça, Grey — disse Brough. — Está no seu direito de fazer a revista aqui, estando eu presente. Mas não tem autoridade...

— Tudo bem — falou Peter Marlowe. — Não me importo. Se eu... não deixar... ele vai... pensar... Ajude-me aqui, sim?

Peter Marlowe tirou o sarongue, e jogou-o sobre a cama, junto com o bolo de notas.

Grey examinou cuidadosamente as bainhas. Irado, jogou de volta o sarongue.

— Onde conseguiu este dinheiro?

— Jogando — respondeu Peter Marlowe, pegando o sarongue.

— Você! — Grey dirigiu-se ao Rei, com brusquidão. — E quanto a isto? — Mostrava mais um grosso bolo de notas.

— Jogando, senhor — disse o Rei, inocentemente, enquanto se vestia, e Brough disfarçou um sorriso.

— Onde está o diamante?

— Que diamante? Senhor.

Brough levantou-se e dirigiu-se para a mesa de pôquer.

— Parece que não há diamante.

— E então, de onde veio tanto dinheiro?

— O homem disse que é dinheiro de jogo. Não há lei que proíba o jogo. Claro que também não aprovo o jogo — acrescentou, com um sorriso seco, olhos fitos no Rei.

— Sabe que isso não é possível! — disse Grey.

— Não é provável, é o que quer dizer — interrompeu Brough. Tinha pena de Grey... com os olhos brilhantes demais, a boca crispada, as mãos trêmulas... tinha pena dele. — Quis fazer uma revista aqui, já a fez, e não há diamante algum. — Interrompeu-se ao ver Peter Marlowe dirigir-se cambaleante para a porta. O Rei agarrou-o antes que caísse ao chão.

— Deixe, eu ajudo — falou o Rei. — É melhor eu levá-lo para a cabana dele.

— Fique aqui — ordenou Brough. — Grey, quem sabe você o ajudaria.

— Para mim, ele pode até cair morto. — Os olhos de Grey fitaram o Rei. — Você também! Mas não antes que eu o pegue. E vou pegar.

— Quando o fizer, vou puni-lo exemplarmente — disse Brough, olhando para o Rei. — Certo?

— Sim, senhor.

Brough voltou a olhar para Grey.

— Mas até que o faça... ou até que ele desobeça as minhas ordens... nada pode ser feito.

— Então, ordene-lhe que pare de vender no mercado negro — falou Grey. Brough se manteve calmo.

— Tudo por uma vida pacífica — falou, e sentiu o desprezo dos seus homens, e sorriu intimamente. Filhos da puta. — Você! — falou para o Rei. — Estou-lhe ordenando que pare de vender no mercado negro. No meu entender, no mercado negro vendem-se comida, mercadorias, qualquer coisa, para o seu próprio pessoal... com fins lucrativos. Você não pode vender nada para nós com fins lucrativos.

— Lidar com contrabando, isso é mercado negro.

— Capitão Grey, vender com fins lucrativos ou até mesmo roubar do inimigo não é mercado negro. Não há mal nenhum num comerciozinho.

— Mas contraria as ordens!

— Ordens japonesas! E não aceito ordens inimigas. E eles são o inimigo.

— Brough queria acabar logo com aquela besteirada. — Nada de mercado negro. É uma ordem.

— Vocês, americanos, são unidos... isso não se pode negar.

— Faça o favor de não começar. Já chega o que agüentei de Yoshima. Não há ninguém aqui vendendo no mercado negro ou infringindo leis que sejam leis... ao que me conste. Agora, o assunto está encerrado. Se eu pegar alguém roubando ou vendendo comida com fins lucrativos, ou drogas com fins lucrativos, quebro eu mesmo o braço dele e enfio garganta abaixo. E sou o oficial americano mais antigo e esses são os meus homens e essa é a minha palavra. Entendeu?

Grey fitou Brough e prometeu a si mesmo que também ficaria de olho nele. Gente nojenta, oficiais nojentos. Virou-se e saiu em largas passadas da choça.

— Ajude Peter a voltar para o beliche dele, Tex — falou Brough.

— Claro, Don. — Tex ergueu-o nos braços e abriu um sorriso para Brough.

— Como um bebê, senhor — falou, retirando-se.

Brough fitou o dinheiro na mesa de pôquer.

— É — disse, balançando a cabeça, como se falasse consigo mesmo — o jogo não presta. Não presta rriesmo. — Ergueu os olhos para o Rei, e disse, docemente: — Sou contra o jogo, e você?

Tome cuidado, disse o Rei para si mesmo, Brough está com aquela cara de oficial safado. Por que será que só os oficiais filhos da puta ficam com aquela cara, e como é que a gente sempre sabe... e sente o cheiro do perigo a seis metros de distância?

— Bem — falou o Rei, oferecendo um cigarro a Brough, e segurando o fogo para acendê-lo — acho que depende do modo de se encarar.

— Obrigado. Nada como um cigarro comprado pronto. — Mais uma vez, os olhos de Brough ficaram fitos nos do Rei. — E como você o encara, Cabo?

— Se estou ganhando, é uma boa; se estou perdendo, já é diferente. — E acrescentou, mentalmente: Seu filho da puta, que diabo está pretendendo?

Brough resmungou e olhou para a pilha de notas diante da cadeira em que o Rei estivera sentado. Balançando a cabeça, pensativo, manuseou-as com o polegar e tomou-as na mão. Todas elas. Seus olhos viram as altas pilhas diante de todos.

— Parece que aqui todo o mundo está ganhando — disse, pensativo, sem se dirigir a ninguém em especial.

O Rei não respondeu.

— Parece que uma contribuição não lhes fará falta.

— Hã?

— É, hã, merda! — Brough levantou o maço de notas. — Um tanto assim. Para a “caixinha”. Dos oficiais e soldados.

O Rei gemeu. Quase 400 dólares.

— Porra, Don...

— Jogar é um mau hábito. Como praguejar, porra. Se você joga cartas, pode apenas perder o dinheiro, e como ficaria? Já uma contribuição salvaria sua alma para coisas melhores.

Pechinche, seu idiota, disse o Rei para si mesmo. Concorde com a metade.

— Puxa, teria prazer em...

— Ótimo. — Brough virou-se para Max. — Você também, Max.

— Mas, senhor — começou o Rei, acaloradamente.

— Já falou o que tinha que falar.

Max tentou não olhar para o Rei, e Brough disse:

— Isso mesmo, Max. Olhe para ele. Um bom homem. Deu sua contribuição, por que, diabo, você não pode fazer o mesmo?

Brough tirou três quartos das notas de cada pilha e contou rapidamente o dinheiro. Diante deles. O Rei teve que se sentar e ficar olhando.

— Isso dá dez dólares por cabeça por semana, durante seis semanas — falou Brough. — Quinta-feira é o dia do pagamento. Ah, sim, Max! Reúna todos os cantis e leve-os à casa da guarda. Imediatamente! — Enfiou o dinheiro no bolso, depois foi andando para a porta. Ao chegar lá, teve uma súbita inspiração. Pegou de novo as notas e tirou do maço uma única nota de cinco dólares. Olhando para o Rei, jogou-a no meio da mesa.

— Dinheiro para o enterro. — O sorriso dele era angélico. — Boa-noite, rapazes.

Por todo o campo, procedia-se a coleta dos cantis. Mac, Larkin e Peter Marlowe achavam-se no bangalô. Na cama, ao lado de Peter Marlowe, estavam os seus cantis.

— Poderíamos tirar o rádio de dentro deles, e jogá-los vazios numa fossa — falou Mac. — Vai ser um bocado difícil esconder agora estes malditos cantis.

— Poderíamos jogá-los como estão dentro de uma fossa — falou Larkin.

— Está falando sério, Coronel? — quis saber Peter Marlowe.

— Não, meu camarada. Mas falei, e todos devemos decidir o que fazer. Mac pegou um dos cantis.

— Talvez devolvam os outros dentro de um dia ou dois. Não podemos arranjar um esconderijo melhor para as entranhas dos cantis. — Ergueu os olhos, e falou, malignamente: — Mas quem será o filho da mãe que sabe?