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— Nós já perseguimos o amanhecer, Anastasia, agora vamos atrás do crepúsculo — sua voz me vem pelos fones de ouvido. Viro-me para ele, boquiaberta.

O que isso quer dizer? Como ele consegue dizer as coisas mais românticas? Ele sorri, e não consigo não lhe retribuir um sorriso tímido.

— Assim como o sol da tarde, há mais para ser visto desta vez — diz.

Na última vez em que voamos até Seattle estava escuro, mas, esta noite, a vista é espetacular, realmente extraordinária. Estamos em meio aos prédios mais altos, subindo cada vez mais.

— Ali fica o Escala — ele aponta um edifício. — Ali é a Boeing, e, lá atrás, dá pra ver o Space Needle.

Viro a cabeça.

— Nunca fui lá.

— Eu levo você, a gente podia comer lá.

— Christian, nós terminamos.

— Eu sei. Mas ainda posso levar você lá e oferecer um jantar — ele me olha.

Balanço a cabeça e fico vermelha, antes de seguir por um caminho menos agressivo.

— É muito bonito aqui, obrigada.

— Impressionante, não é?

— É impressionante que você possa fazer isso.

— Elogios vindos de você, Srta. Steele? Sou um homem de muitos talentos.

— Tenho total consciência disso, Sr. Grey.

Ele se vira e sorri para mim. Pela primeira vez em cinco dias, relaxo um pouco. Talvez isso não vá ser tão ruim.

— Como vai o novo emprego?

— Bem, obrigada. É interessante.

— E como é seu chefe?

— Ah, ele é legal — como poderia dizer a Christian que Jack me deixa desconfortável?

— Qual é o problema? — pergunta ele, virando-se para mim.

— Fora o óbvio, nada.

— O óbvio?

— Ah, Christian, às vezes você é tão burro.

— Burro? Eu? Não sei se gosto do seu tom, Srta. Steele.

— Bem, o problema é seu.

— Senti saudade do seu atrevimento — ele molda os lábios num sorriso.

Suspiro, e minha vontade é gritar bem alto: E eu senti saudade de você por inteiro, e não apenas do seu atrevimento! Mas fico calada, olhando pelas janelas de vidro de Charlie Tango ao seguirmos em direção ao sul. O crepúsculo está a nossa direita, o sol está baixo no horizonte, enorme, flamejante e laranja; e, mais uma vez, eu sou Ícaro, voando perto demais dele.

* * *

O ENTARDECER NOS seguiu desde Seattle, e o céu está tomado de tons de opala, rosa e azul-marinho, perfeitamente entrelaçados de um jeito que só a Mãe Natureza sabe fazer. A noite está clara e nítida, as luzes de Portland brilham, acolhendo-nos à medida que Christian pousa o helicóptero. Estamos no topo do estranho prédio de tijolos marrons do qual saímos há três semanas.

Meu Deus, faz tão pouco tempo. No entanto, sinto como se conhecesse Christian a vida toda. Ele aperta vários botões, desligando os motores de Charlie Tango, até que tudo o que ouço é o som de minha própria respiração nos fones de ouvido. Hum. Por um instante, isso me faz lembrar Thomas Tallis. Fico pálida. Realmente, não quero pensar nisso agora.

Christian solta seu cinto e se inclina para abrir o meu.

— Fez boa viagem, Srta. Steele? — pergunta ele, a voz suave, os olhos cinzentos reluzindo.

— Sim, obrigada, Sr. Grey — respondo, educada.

— Bem, vamos lá ver as fotos daquele garoto — ele me estende a mão e, apoiando-me nele, desço do Charlie Tango.

Um homem de barba e cabelos grisalhos caminha até nós, com um largo sorriso no rosto. Eu o reconheço como o mesmo senhor da última vez em que estivemos aqui.

— Joe — Christian sorri e solta minha mão para apertar a de Joe calorosamente.

— Tome conta dele para Stephan. Ele vai chegar lá pelas oito ou nove.

— Certo, Sr. Grey. Senhora — diz ele, acenando para mim. — Seu carro está esperando lá embaixo, senhor. Ah, e o elevador está quebrado, o senhor vai ter que usar a escada.

— Obrigado, Joe.

Christian pega minha mão, e seguimos até a escada de emergência.

— Nesses saltos, sorte sua serem só três andares — resmunga ele, em desaprovação.

Não brinca.

— Não gostou das botas?

— Gostei muito, Anastasia — seu olhar escurece. Acho que vai dizer mais alguma coisa, mas ele para. — Vamos com calma. Não quero que você caia e quebre o pescoço.

* * *

NOS SENTAMOS EM silêncio, enquanto o motorista nos leva até a galeria. Minha ansiedade voltou com força total, e percebo que o tempo passado dentro de Charlie Tango foi o olho do furacão.

Christian está quieto e taciturno... apreensivo até, nosso bom humor de poucos instantes atrás se dissipou. Tem tanta coisa que quero dizer, mas a viagem é muito curta.

Pensativo, Christian olha para fora da janela.

— José é só um amigo — murmuro.

Christian vira-se para mim, os olhos escuros e cautelosos não deixam transparecer nada. Sua boca — ah, essa boca é uma distração incontrolável. Eu fico me lembrando dela em mim, em todos os lugares. Minha pele fica quente. Ele se ajeita em seu assento e franze a testa.

— Esses lindos olhos estão grandes demais no seu rosto, Anastasia. Por favor, me prometa que você vai comer.

— Prometo que vou comer, Christian — respondo automaticamente, numa espécie de clichê.

— Estou falando sério.

— Ah, é? — não consigo evitar o tom de desdém em minha voz. Sério, a audácia desse cara, esse homem que durante os últimos dias me fez passar por um inferno. Não, não foi isso. Fui eu que me fiz passar por um inferno. Não. Foi ele. Balanço a cabeça, confusa.

— Não quero brigar com você, Anastasia. Quero você de volta, e quero você saudável — diz ele, suavemente.

— Mas nada mudou.

Você ainda é o Cinquenta Tons.

— Chegamos. Na volta a gente conversa.

O carro para na frente da galeria, e Christian desce, deixando-me muda. Ele abre a porta para mim, e salto do carro.

— Por que você faz isso? — minha voz sai mais alta do que eu esperava.

— Isso o quê? — pergunta Christian, surpreso.

— Você fala uma coisa e depois para.

— Anastasia, nós chegamos. No lugar em que você queria estar. Agora nós vamos entrar, e depois a gente conversa. Eu realmente não quero fazer uma cena no meio da rua.

Olho ao redor. Ele está certo. É público demais. Aperto os lábios enquanto ele olha para mim.

— Certo — resmungo, de mau humor.

Segurando minha mão, ele me conduz para dentro do prédio. Estamos em um armazém convertido: paredes de tijolo, piso de madeira escura, teto branco e encanamento branco. É moderno e arejado, e várias pessoas caminham ao longo da galeria, bebendo vinho e admirando o trabalho de José. Por um momento, meus problemas se dissipam à medida que me dou conta de que José realizou um sonho. Parabéns, cara!

— Boa noite e bem-vindos à exposição de José Rodriguez — somos recebidos por uma jovem vestida de preto, o cabelo castanho muito curto, batom vermelho e grandes brincos de argola.

Ela me olha de relance, então encara Christian muito mais do que o estritamente necessário, depois volta o olhar para mim, piscando, e suas faces ficam de um vermelho vivo.

Minha testa se franze. Ele é meu. Ou era. Tento não fazer cara feia para ela. Assim que seu olhar me focaliza de novo, ela pisca mais uma vez.

— Ah, Ana, é você. Nós também vamos querer sua opinião a respeito disso aqui — sorrindo, ela me entrega um folheto e me conduz a uma mesa com bebidas e aperitivos.

— Você a conhece? — Christian fecha a cara.

Nego com a cabeça, igualmente intrigada.

Ele dá de ombros, distraído.

— Vai beber o quê?

— Vinho branco, obrigada.

Ele franze a testa, mas fica quieto e caminha até o bar.