Há uma espécie de promessa silenciosa em suas palavras. O que ele quer dizer? Deixo a mesa, me perguntando por um momento se eu deveria pedir licença, mas descarto a ideia. Parece um precedente perigoso para se abrir. Volto para o quarto dele. Uma ideia me detém.
— Onde você dormiu ontem à noite?
Viro-me para olhar para ele ainda sentado na cadeira da sala de jantar. Não vejo mantas nem lençóis por aqui — talvez ele tenha mandado guardá-los.
— Na minha cama — diz ele simplesmente, o olhar impassível de novo.
— Ah.
— Sim, foi uma grande novidade para mim também. — Ele sorri.
— Não fazer... sexo. — Pronto, eu disse a palavra. Enrubesço, é claro.
— Não. — Ele balança a cabeça e franze a testa como se estivesse se recordando de algo incômodo. — Dormir com alguém.
Ele pega o jornal e continua a ler.
Pelo amor de Deus, o que isso quer dizer? Ele nunca dormiu com ninguém? É virgem? Por algum motivo, duvido que seja. Fico olhando para ele, incrédula. É a pessoa mais desconcertante que já conheci. Quando me dou conta de que dormi com Christian Grey quero arrancar os cabelos — o que eu daria para estar consciente e poder observá-lo dormindo? Vê-lo vulnerável. De alguma maneira, acho isso difícil de imaginar. Bem, supostamente, tudo será revelado hoje à noite.
No quarto, procuro em uma cômoda e encontro o secador. Usando os dedos, seco o cabelo da melhor maneira possível. Quando termino, entro no banheiro. Quero escovar os dentes. Olho a escova de Christian. Seria como tê-lo em minha boca. Hum... Olhando por cima do ombro para a porta com um sentimento de culpa, sinto as cerdas da escova de dentes. Estão molhadas. Ele já deve ter usado a escova. Pego-a depressa, espremo a pasta nas cerdas e escovo os dentes rapidinho. Sinto-me muito travessa. É muita emoção.
Pego a camiseta, o sutiã e a calcinha usados e coloco tudo na sacola de compras que Taylor trouxe. Volto para a sala de estar à procura da minha bolsa e da jaqueta. Que felicidade! Tenho um prendedor de cabelo na bolsa. Com uma expressão inescrutável, Christian me observa fazer um rabo de cavalo. Sinto seus olhos me seguirem quando me sento para esperá-lo terminar. Ele está no BlackBerry falando com alguém.
— Eles querem dois?... Quanto vai custar isso?... Tudo bem, e que medidas de segurança temos finalizadas?... E eles vão via Suez? Até que ponto Ben Sudan é seguro? E quando chegam em Darfur? Tudo bem, vamos fazer. Mantenha-me a par da evolução.
Ele desliga.
— Pronta para partir?
Balanço a cabeça assentindo. Pergunto-me sobre o que era essa conversa. Ele veste um paletó azul-marinho de risca de giz, pega as chaves do carro e se encaminha para a porta.
— Pode passar, Srta. Steele — murmura ele, abrindo a porta para mim.
Sua elegância é descontraída.
Demoro-me um pouco mais do que deveria, absorvendo sua imagem. E pensar que dormi com ele a noite passada e, depois de toda aquela tequila e de todo aquele vômito, ele continua aqui. E ainda por cima quer me levar para Seattle. Por que eu? Não entendo. Passo pela porta relembrando as palavras dele — Por algum motivo não consigo ficar longe de você — bem, o sentimento é absolutamente recíproco, Sr. Grey, e meu objetivo é descobrir o seu segredo.
Caminhamos em silêncio em direção ao elevador. Enquanto esperamos, olho discretamente para ele, e ele me olha de rabo de olho. Sorrio, e os lábios dele se contraem.
O elevador chega. Estamos a sós. De repente, por alguma razão inexplicável, possivelmente a proximidade num espaço tão apertado, o clima fica elétrico, carregado de expectativa e excitação. Minha respiração se altera conforme meu coração dispara. Ele vira a cabeça para mim ligeiramente, os olhos escuros cor de ardósia. Mordo o lábio.
— Ah, foda-se a papelada — resmunga ele.
Ele se atira em cima de mim, empurrando-me contra a parede do elevador. Quando me dou conta, uma das mãos dele já está apertando com força minhas mãos acima da minha cabeça. Puta merda. Sua outra mão agarra meu cabelo e o puxa para baixo, deixando-me com o rosto virado para cima, e seus lábios colam nos meus. Não é exatamente doloroso. Solto um gemido em sua boca, proporcionando uma abertura para sua língua. Ele aproveita inteiramente o espaço, a língua explorando habilmente minha boca. Nunca fui beijada assim. Minha língua afaga timidamente a dele e as duas se unem numa dança lenta e erótica se encostando e se sentindo. Ele levanta a mão para segurar meu queixo e me mantém no lugar. Estou indefesa, as mãos presas, a cabeça imobilizada, e os quadris dele me comprimindo. Sua ereção pressiona minha barriga. Minha nossa... Ele me quer. Christian Grey, deus grego, me quer, e eu o quero, aqui, agora, dentro do elevador.
— Você. É. Muito. Gostosa — murmura ele, cada palavra um staccato.
O elevador para, a porta se abre, e ele se afasta de mim num piscar de olhos, deixando-me em suspenso. Três executivos de terno nos olham e dão um sorrisinho ao entrar. Minha pulsação está nas alturas, e sinto como se tivesse apostado uma corrida ladeira acima. Quero me encolher e segurar os joelhos... mas isso é simplesmente óbvio demais.
Olho para ele. Parece muito calmo e tranquilo, como se estivesse fazendo as palavras cruzadas do Seattle Times. Que injustiça. Será que minha presença não o afeta em nada? Ele me olha de rabo de olho, e delicadamente dá um suspiro profundo. Ah, afeta sim — e minha pequenina deusa interior se agita num delicado samba vitorioso. Os executivos descem no segundo andar. Para nós ainda falta mais um.
— Você escovou os dentes — diz ele, me olhando.
— Usei sua escova.
Seus lábios se contraem num sorrisinho.
— Ah, Anastasia Steele, o que eu vou fazer com você?
A porta abre no primeiro andar, ele pega minha mão e me puxa para fora.
— O que será que os elevadores têm? — murmura, mais para si mesmo do que para mim, ao atravessar o saguão. Esforço-me para acompanhar seu passo, porque meu juízo ficou total e completamente espalhado pelo chão e pelas paredes do elevador três do Hotel Heathman.
CAPÍTULO SEIS
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Christian abre a porta do carona do Audi SUV preto para mim. É um carro incrível. Ele não menciona o surto de paixão que explodiu no elevador. Será que eu deveria? Será que eu deveria mencionar isso ou fingir que nada aconteceu? Não parece real, meu primeiro beijo de verdade sem qualquer restrição. Com o passar do tempo, atribuo-lhe um status mítico, de lenda arturiana e Cidade Perdida de Atlântida. Nunca aconteceu, nunca existiu. Talvez eu tenha imaginado tudo. Não. Toco meus lábios, inchados pelo beijo. Definitivamente aconteceu. Sou outra mulher. Quero desesperadamente este homem, e ele me quer.
Olho para ele. Christian é o mesmo de sempre, educado e ligeiramente distante.
Que confuso.
Ele liga o carro e sai de ré da vaga do estacionamento. Liga o som. Uma música mágica e doce, cantada por duas vozes femininas, toma conta do interior do carro. Minha nossa... meus sentidos estão todos bagunçados, por isso a música me afeta em dobro, provocando arrepios deliciosos que sobem pela minha espinha. Christian pega a Avenida Southest Park, e dirige sem pressa, com tranquilidade e segurança.
— O que estamos ouvindo?
— É o “Dueto das Flores”, de Delibes, da ópera Lakmé. Gosta?
— Christian, é maravilhoso.
— É mesmo, não é? — Ele sorri, olhando para mim.
E, por um instante fugaz, aparenta a idade que tem: jovem, descontraído e lindo de morrer. Será que a chave para desvendá-lo é essa? Música? Fico ouvindo as vozes angelicais me provocando e me seduzindo.