— Preciso tomar um banho.
— E já chega do meu espetáculo de cabaré.
— É um ótimo espetáculo, aliás — sussurra ele, e dá um passo à frente. Novamente eu dou um passo para trás.
— Não ouse.
— Odeio quando não me deixa tocar em você.
— Que ironia, não?
Seus olhos se estreitam ainda mais.
— Não decidimos muita coisa, não é?
— Eu diria que não. Só decidi me mudar para o outro quarto.
Os olhos dele se arregalam e brilham por um breve instante.
— Ela não significa nada para mim.
— A não ser quando você precisa dela.
— Eu não preciso dela. Preciso de você.
— Você não precisou de mim ontem. Aquela mulher é um limite rígido para mim, Christian.
— Ela não faz mais parte da minha vida.
— Como eu queria acreditar em você.
— Puta que pariu, Ana.
— Por favor, preciso terminar de me vestir.
Ele suspira e passa a mão no cabelo novamente.
— Vejo você à noite — diz, a voz fria e destituída de qualquer emoção.
E por um breve momento tenho vontade de envolvê-lo em meus braços e tranquilizá-lo… mas resisto, porque estou irada demais. Ele se vira e se dirige ao banheiro. Permaneço estática até ouvir a porta se fechar.
Vou cambaleante até a cama e me jogo. Não recorri a lágrimas ou gritos ou homicídio, nem sucumbi a seus encantos de especialista em sexo. Mereço uma medalha de honra; no entanto, me sinto lá no chão. Merda. Não resolvemos nada. Estamos à beira de um precipício. Será que nosso casamento está correndo perigo? Como é que ele não consegue perceber que agiu como um completo babaca quando foi se encontrar com aquela mulher? E o que ele quer dizer ao afirmar que nunca mais vai vê-la de novo? Afinal, como é que eu vou conseguir acreditar nisso? Olho para o relógio: oito e meia. Droga! Não quero me atrasar. Inspiro profundamente.
— O segundo assalto terminou em empate técnico, Pontinho — sussurro, afagando a barriga. — O papai talvez seja uma causa perdida, mas espero que não. Por que, Pontinho, por que você veio tão cedo? Agora é que as coisas estavam ficando boas. — Meus lábios tremem, mas respiro fundo para me recuperar e controlar minhas emoções. — Vamos, Pontinho. Vamos lá arrasar no trabalho.
* * *
NÃO ME DESPEÇO de Christian. Ele ainda está no chuveiro quando Sawyer e eu saímos. Fico olhando para fora pelos vidros escuros do SUV, e nesse momento minha postura desaba e meus olhos se enchem de lágrimas. Meu estado de espírito se reflete no céu cinzento e lúgubre, e tenho um mau pressentimento. Não chegamos a conversar sobre o bebê. Tive menos de vinte e quatro horas para assimilar a novidade do meu Pontinho. Christian teve ainda menos tempo.
— Ele nem sabe o seu nome.
Acaricio a barriga e limpo as lágrimas que escorrem pelo meu rosto.
— Sra. Grey. — É Sawyer, interrompendo meus devaneios. — Chegamos.
— Ah. Obrigada, Sawyer.
— Vou dar um pulo na confeitaria, madame. A senhora quer alguma coisa?
— Não, obrigada. Não estou com fome.
* * *
HANNAH ME RECEBE com meu café com leite já pronto. Tomo um golinho e meu estômago fica embrulhado.
— Hmm… pode me trazer um chá, por favor? — murmuro, constrangida.
Eu sabia que havia uma razão para eu nunca ter gostado muito de café. Nossa, que cheiro ruim.
— Você está bem, Ana?
Faço que sim e corro para a segurança do meu escritório. O BlackBerry toca. É Kate.
— Por que Christian estava procurando você? — pergunta ela, sem preâmbulos.
— Bom dia, Kate. Tudo bem?
— Poupe-me do papo furado, Steele. O que aconteceu? — E assim começa o Interrogatório de Katherine Kavanagh.
— Christian e eu brigamos, só isso.
— Ele machucou você?
Reviro os olhos.
— Sim, mas não do jeito que você está pensando. — Não quero me abrir com Kate agora. Sei que vou chorar, e no momento estou orgulhosa de mim mesma por não ter desabado esta manhã. — Kate, eu tenho uma reunião. Depois eu ligo.
— Ok. Você está bem?
— Sim. — Não. — Eu ligo mais tarde.
— Tudo bem, Ana, como quiser. Se precisar, estou aqui.
— Sei disso — sussurro, lutando contra a torrente de emoções que me vêm por causa das palavras amigas de Kate. Não vou chorar. Não vou chorar.
— O Ray está bem?
— Está — murmuro.
— Ai, Ana — sussurra ela.
— Não diga nada.
— Tudo bem. A gente se fala mais tarde.
— Certo.
* * *
NO DECORRER DA MANHÃ, de vez em quando verifico meu e-mail, na esperança de encontrar alguma palavra de Christian. Mas não há nada. À medida que o dia transcorre, percebo que ele simplesmente não vai entrar em contato comigo e que ainda está zangado. Ora, eu também estou zangada. Entrego-me ao trabalho, fazendo uma pausa apenas para comer um sanduíche de salmão e cream cheese na hora do almoço. É impressionante como me sinto melhor depois de conseguir comer alguma coisa.
Às cinco, Sawyer e eu vamos ao hospital fazer uma visita a Ray. Sawyer está mais vigilante do que o normal, chega a ser exageradamente solícito. É irritante. Quando nos aproximamos do quarto de Ray, ele me interpela:
— A senhora quer um chá enquanto visita seu pai?
— Não, obrigada, Sawyer. Estou bem.
— Vou esperar lá fora.
Ele abre a porta para mim, e fico aliviada ao me ver livre dele por alguns instantes. Ray está sentado na cama, lendo uma revista. Está barbeado e usa uma camisa de pijama — parece novamente o Ray que eu conheço.
— Oi, Annie. — Ele sorri. E seu rosto murcha.
— Ah, papai…
Corro para ele e, em um gesto pouco usual de sua parte, ele abre os braços e me acolhe.
— Annie? — sussurra. — O que aconteceu?
Ele me abraça apertado e beija meu cabelo. Enquanto estou assim aninhada em seus braços, percebo como são raros esses momentos entre nós dois. Por que será? E será que é por isso que gosto de ficar no colo de Christian? Depois de um minuto, solto-o e me sento na cadeira ao lado da cama. Ele tem o cenho franzido em uma expressão de preocupação.
— Conte ao seu velho.
Balanço a cabeça. Ele não precisa dos meus problemas nesse momento.
— Não é nada, pai. Você está com uma aparência boa. — Aperto sua mão.
— Já estou me sentindo recuperado, apesar dessa perna engessada me acossando.
— Acossando? — A palavra me faz sorrir.
Ele retribui o sorriso.
— “Acossar” soa melhor que “coçar”.
— Ah, pai, fico tão feliz de ver você bem.
— Eu também, Annie. Ainda vou querer colocar meus netinhos sentados nesse joelho acossado um dia. Não ia perder isso por nada no mundo.
Olho para ele receosa. Merda. Será que ele sabe? E luto contra as lágrimas que teimam em surgir nos cantos dos meus olhos.
— Você e o Christian estão bem?
— Tivemos uma briga — murmuro, tentando falar mesmo com o nó que aperta minha garganta. — Mas a gente supera.
Ray aquiesce.
— Ele é um homem bom, o seu marido — diz ele, para me reconfortar.
— Ele tem seus momentos. O que os médicos disseram?
Não quero continuar a falar sobre o meu marido agora; é um assunto doloroso.
* * *
QUANDO CHEGO EM casa, Christian ainda não voltou.
— Christian ligou e disse que ficaria trabalhando até tarde — informa-me Sra. Jones, em tom de quem pede desculpas.
— Ah. Obrigada por me avisar.
Por que ele próprio não me avisou? Puxa, ele realmente está levando sua pirraça para um patamar acima. Por breves instantes me recordo da briga que tivemos sobre nossos votos de casamento e sobre a fúria que se apoderou dele na ocasião. Mas dessa vez eu é que fui magoada.
— O que gostaria de comer? — A Sra. Jones tem um brilho forte e determinado no olhar.