— Fomos a um bar tranquilo que eu conheço e tomamos uma garrafa de vinho. Ela se desculpou pelo modo como tinha se comportado da última vez que nos viu. Ficou magoada porque a minha mãe não quer mais saber dela, o que restringiu o círculo social que ela frequentava, mas compreende. Falamos sobre o negócio, que está indo bem apesar da recessão… E eu mencionei que você gostaria de ter filhos.
Franzo o cenho.
— Pensei que você tinha contado a ela que eu estava grávida.
Ele me observa, o rosto com uma expressão sincera.
— Não, não contei.
— Por que não me disse isso antes?
Ele dá de ombros.
— Não tive oportunidade.
— Teve sim.
— Não consegui encontrar você na manhã seguinte, Ana. E quando encontrei, você estava tão furiosa comigo…
Ah, sim.
— Estava mesmo.
— Enfim, em algum momento daquela noite, já no meio da segunda garrafa de vinho, ela se inclinou para me tocar. E eu fiquei paralisado — murmura ele, jogando o braço por cima dos olhos.
Meu couro cabeludo começa a pinicar. O que é isso?
— Ela viu que eu me retraí com o seu toque. Nós dois ficamos chocados. — A voz dele está baixa, muito baixa.
Christian, olhe para mim! Eu puxo seu braço, e ele se vira para me encarar. Merda. Seu rosto está pálido, os olhos arregalados.
— E aí? — falo baixinho.
Ele franze a testa e engole em seco.
Ah… O que ele não está me contando? Será que eu quero saber?
— Ela me passou uma cantada. — Ele está chocado, dá para perceber.
Todo o ar se esvai do meu corpo. Sinto-me exaurida e acho que meu coração parou de bater. Aquela Monstra Filha da Mãe!
— Foi só um instante, suspenso no tempo. Ela viu minha expressão e percebeu que tinha ido longe demais. Eu disse… não. Não penso nela naqueles termos há anos, e além do mais — ele engole em seco —, eu amo você. Eu disse a ela que eu amo a minha mulher.
Eu o fito. Não sei o que dizer.
— Ela recuou imediatamente. Pediu desculpas mais uma vez, fez parecer que tinha sido uma brincadeira. Sabe, ela disse que estava feliz com o Isaac e com o negócio, e que não queria causar mal a nós dois. Disse que sentia falta da minha amizade, mas que entendia que minha vida agora era com você. E foi muito estranho, tendo em vista o que aconteceu na última vez que estivemos no mesmo ambiente. Concordei inteiramente com ela. Então nos despedimos, dissemos um adeus definitivo. Eu disse que nunca mais iria procurá-la, e ela foi embora.
Engulo em seco, o medo trespassando meu coração.
— Vocês se beijaram?
— Não! — grunhe ele. — Eu não conseguiria ficar assim tão perto dela.
Ah, bem.
— Eu me sentia horrível e queria vir para casa, para perto de você. Mas… eu sabia que tinha agido muito mal. Então fiquei no bar e acabei com a garrafa, e depois comecei a tomar bourbon. Enquanto eu estava bebendo, me lembrei do que você me disse um tempo atrás: “Se fosse meu filho…” E comecei a pensar no Júnior e em como tinha começado a minha relação com Elena. E isso me deixou… desconfortável. Eu nunca tinha pensado nisso dessa forma.
Uma lembrança surge em minha mente: uma conversa sussurrada quando eu estava semiconsciente — a voz de Christian: “Mas me encontrar com ela finalmente colocou tudo numa nova perspectiva para mim. Você sabe… com relação à criança. Pela primeira vez eu senti… O que nós dois fizemos… foi errado.” Ele estava falando com Grace.
— E foi só isso?
— Basicamente.
— Ah.
— Ah?
— Acabou?
— Acabou. Acabou desde que eu pus os olhos em você. Finalmente eu percebi naquela noite, e ela também.
— Desculpe — balbucio.
Ele franze a testa.
— Pelo quê?
— Por ter ficado tão furiosa no dia seguinte.
Ele solta um gemido rouco.
— Baby, eu entendo a fúria. — Ele faz uma pausa e suspira. — Sabe, Ana, eu quero você só para mim. Não quero dividir você. O que nós temos… eu nunca tive antes. Quero ser o centro do seu universo, pelo menos por um tempo.
Ah, Christian.
— E você é. Isso não vai mudar.
Ele me dá um sorriso triste, indulgente e resignado.
— Ana — murmura ele. — Isso simplesmente não é verdade.
Fico com os olhos marejados.
— Como é possível? — continua ele.
Ah, não.
— Merda… não chore, Ana. Por favor, não chore. — Ele acaricia meu rosto.
— Sinto muito. — Meu lábio inferior treme, e ele esfrega o polegar na minha boca, tranquilizando-me.
— Não, Ana, não. Não fique assim. Você vai ter alguém mais para amar também. E você tem razão. É assim que deve ser.
— O Pontinho também vai amar você. Você vai ser o centro do mundo do Pontinho… do Júnior — murmuro. — Os filhos amam os pais incondicionalmente, Christian. É assim que eles vêm ao mundo. Programados para amar. Todos os bebês… até você. Pense naquele livro infantil de que você gostava quando era criança. Você ainda queria a sua mãe. Você a amava.
Ele franze o cenho e puxa a mão, fechando-a e apoiando-a no queixo.
— Não — sussurra ele.
— Sim. Você a amava. — Minhas lágrimas agora descem livremente. — É claro que amava. Você não tinha escolha. É por isso que é tão doloroso.
Ele me olha fixamente, com uma expressão inflamada.
— É por isso que você é capaz de me amar — murmuro. — Perdoe a sua mãe. Ela tinha a própria dor para suportar. Ela foi uma péssima mãe, mas você a amava.
Ele me olha sem dizer uma palavra, os olhos assombrados — por lembranças que não posso nem sonhar em desvendar.
Ah, por favor, não pare de falar.
Após um tempo, ele diz:
— Eu costumava escovar o cabelo dela. Ela era bonita.
— Basta olhar para você que ninguém duvida.
— Ela foi uma péssima mãe. — Sua voz está quase inaudível.
Concordo, e ele fecha os olhos.
— Tenho medo de ser um péssimo pai.
Acaricio seu querido rosto. Ah, meu amor, meu amor.
— Christian, como você pode pensar que eu deixaria você ser um péssimo pai?
Ele abre os olhos e me encara por um tempo que parece uma eternidade. E começa a sorrir quando o alívio pouco a pouco ilumina seu rosto.
— É mesmo, você não deixaria. — Ele acaricia meu rosto com as costas da mão, olhando-me com admiração. — Meu Deus, você é tão forte, Sra. Grey. Eu amo tanto você. — Ele beija minha testa. — Nunca pensei que fosse capaz.
— Ah, Christian — murmuro, tentando conter minha emoção.
— Bom, e esse é o fim da minha história.
— Foi uma história e tanto…
Ele sorri melancolicamente, mas acho que está aliviado.
— Como está a sua cabeça?
— Minha cabeça? — Na verdade, está a ponto de explodir, com tudo o que você me contou!
— Ainda dói?
— Não.
— Ótimo. Acho que é bom você dormir agora.
Dormir! Como vou conseguir dormir depois de tudo isso?
— Durma — ordena ele, severo. — Você precisa.
Faço beicinho.
— Tenho uma pergunta.
— Ah, é? Qual? — Ele me olha com cautela.
— Por que você de repente ficou tão… comunicativo, por falta de palavra melhor?
Ele enruga a testa.
— Está me contando tudo isso, quando normalmente extrair informação de você é uma tarefa bastante difícil e cansativa.
— É?
— Você sabe que é.
— Por que estou sendo comunicativo? Não sei dizer. Talvez por ter visto você praticamente morta no chão frio de concreto. Ou porque vou ser pai. Não sei. Você disse que queria saber, e eu não desejo que a Elena se torne um problema entre nós. Ela não pode. Ela agora é passado, e eu já lhe disse isso muitas e muitas vezes.