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Ao meio-dia, Ashley e seu pai pegaram um avião para Londres...

Ela freqüentou uma faculdade em Londres durante dois anos e, quando decidiu que queria trabalhar com computadores, candidatou-se à prestigiada bolsa de estudos para mulheres MEI Wang, no Curso de Engenharia da Universidade da Califórnia, em Santa Cruz. Seu pedido foi aceito e, três anos depois, fora recrutada pela Corporação Global de Computação Gráfica.

No início, Ashley escreveu meia dúzia de cartas para Jim Cleary, mas rasgou-as todas. Os atos e o silêncio dele haviam lhe dito com toda a clareza como ele se sentia em relação a ela.

A voz do pai arremessou-a de volta ao presente.

- Você está a um milhão de quilômetros de distância daqui. Em que está pensando?

Ashley analisou o pai do outro lado da mesa.

- Em nada.

O Dr. Paterson chamou o garçom com um gesto e exibiu um sorriso simpático.

- Agora nós queremos ver o menu - disse.

Só no caminho de volta para o trabalho Ashley se lembrou de que não havia parabenizado o pai por ter saído na capa da Time.

Quando chegou à sua mesa, Dennis Tibble estava à sua espera.

- Fiquei sabendo que você almoçou com seu pai.

Que sujeitinho enxerido! Ele acha que é da sua conta saber de tudo que acontece por aqui.

- Almocei, sim.

- Não deve ter sido muito divertido. - Ele baixou a voz. - Por que você nunca almoça comigo?

- Dennis... Eu já lhe disse. Não estou interessada.

Ele sorriu.

- Mas vai ficar. Aguarde.

Havia algo estranho nele, algo assustador. Ashley tornou a se perguntar se não poderia ser ele quem... Ela balançou a cabeça. Não. Precisava esquecer essa coisa, tinha de seguir em frente.

A caminho de casa, Ashley estacionou o carro em frente à Editora Afile Tarei. Antes de entrar, olhou para a imagem refletida no espelho da vitrine da loja, para ver se havia alguém atrás dela que pudesse reconhecer. Ninguém. Entrou na loja.

Um rapaz veio atendê-la.

- Deseja alguma coisa?

- Eu gostaria... Vocês têm algum livro sobre maníacos que perseguem pessoas?

Ele olhava para ela com estranheza.

- Maníacos?

Ashley sentiu-se uma idiota.

- Isso mesmo. E também quero um livro sobre... Ahn... Jardinagem e... E animais da áfrica - disse ela, rapidamente.

- Maníacos e jardinagem e animais da África?

- Isso - falou ela com firmeza.

Quem sabe? Talvez um dia eu venha a ter um jardim e fazer uma viagem para áfrica!

Quando Ashley voltou para o carro, começou a chover outra vez.

Enquanto ela guiava, a chuva batia contra o pára-brisa, fragmentando o espaço e transformando as ruas à sua frente em imagens pontilhantes surreais. Ashley acionou os limpadores. Eles começaram a deslizar sobre o vidro, dizendo em voz sibilante: Ele vai pegar você... Vai pegar você... Vai pegar você... Mais que depressa, ela os desligou. Não, pensou. Eles estão dizendo: Que nada! Que nada! Que nada!

Ela tornou a ligar os limpadores de pára-brisa. Ele vai pegar você... Vai pegar você... Vai pegar você...

Ashley estacionou o carro na garagem e apertou o botão para chamar o elevador. Dois minutos depois, estava chegando ao seu apartamento. Parou diante da entrada social, enfiou a chave na fechadura, abriu a porta e congelou.

Todas as luzes do apartamento estavam acesas.

Capítulo Dois

"O macaco perseguiu a lontra.

Em volta do pé de amora.

O macaco achou divertido.

Mas a lontra - pluft! - foi embora".

Toni Prescott sabia exatamente por que gostava de cantar essa musiquinha boba. Sua mãe sempre a odiou. "Pare de cantar essa música idiota. Está me ouvindo? Você nem tem a voz para cantar"! "Está bem, mamãe" E Toni cantava repetidas vezes, na surdina. Isso tinha sido há muito tempo atrás, mas a lembrança de desafiar a mãe ainda lhe trazia uma certa alegria.

Toni Prescott detestava trabalhar na Global. Aos vinte e dois anos de idade, era brincalhona, cheia de vivacidade e ousadia. Era uma pessoa muito expansiva. Seu rosto com ar travesso tinha um aspecto zombeteiro; seus olhos castanhos, um ar matreiro; toda a sua figura, um jeito sedutor de ser. Tinha nascido em Londres e falava com um delicioso sotaque britânico. Era atlética e adorava praticar esporte. Especialmente os de inverno: esqui, trenó e patinação no gelo.

Durante o período em que freqüentou a faculdade, em Londres, Toni se vestia de forma conservadora durante o dia, mas à noite usava minissaias e adereços estilo disco e se dava a um comportamento permissivo. Passou inúmeras noitadas, grandes e pequenas, no Electric Ballroom, na Camden High Street, e no Subterania e no Leopard Lounge, enturmada como badalado pessoal de West End. Como tinha uma bela voz, voluptuosa e sensual, dava canjas em algumas boates tocando ao piano e cantando, e o público aplaudia. Foi a época em que se sentiu mais viva.

A rotina nesses lugares seguia sempre o mesmo padrão:

- Sabe que você canta muito bem, Toni?

- Valeu.

- Posso lhe pagar um drinque?

Ela sorria.

- Eu adoraria tomar um Pimm's.

- Com prazer!

E tudo terminava sempre da mesma forma. O candidato acabaria chegando bem pertinho e sussurrando ao seu ouvido:

- Por que a gente não vai para o meu apartamento e fica numa boa?

- Sem essa! - E Toni ia embora. Ficava deitada em sua cama à noite, pensando na estupidez dos homens e em como era espantosamente fácil controlá-los. Os pobres coitados nem sabiam, mas queriam ser controlados. Precisavam ser controlados.

E então veio a mudança de Londres para Cupertino. No início, foi um desastre. Toni detestava a cidade e odiava trabalhar na Global. Era uma chatice ficar ouvindo falar sobre dispositivos de encaixe e definição de imagem, fotogravuras. Ela morria de saudades da agitada vida noturna de Londres. Havia alguns points na área de Cupertino, e Toni os freqüentava: San José Live, P J. Mulligan's ou Hollywood Junction. Usava minissaias apertadas e tops com sapatos abertos de salto dez ou solado alto de cortiça.

Caprichava na maquilagem, aplicando cílios postiços, delineador grosso e escuro nos olhos, além de sombra colorida e batom brilhante. Era como se estivesse tentando ocultar sua beleza.

Havia fins de semana em que pegava o carro e ia até São Francisco, onde a agitação era maior! Buscava os restaurantes e boates com música ao vivo. Estava sempre no Harry Denton's, no One Market e no Califórnia Café, e durante a noite, enquanto os músicos davam um intervalo, ela ia para o piano, tocar e cantar. Os fregueses adoravam. Quando Toni pedia a conta do jantar, os donos diziam:

- Não; fica por conta da casa. Você é maravilhosa! Volte sempre, por favor. Você ouviu isso, mamãe? "Você é maravilhosa! Volte sempre, por favor".

Numa noite de sábado, Toni estava jantando no Salão Francês do Cliff Hotel. Os músicos haviam concluído a primeira parte da apresentação e deixado o palco. O maître olhou para ela e acenou-lhe convidativamente com um leve gesto de cabeça. Toni se levantou e atravessou a sala, em direção ao piano.

Sentou-se e começou a tocar e cantar uma antiga canção de Cole Porter. Quando terminou, todos aplaudiram eufóricos. Ela cantou mais duas músicas e voltou para a mesa.