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Silêncio. Ficou parada um instante, as gotas de água reluzindo sobre todo o corpo, depois se enxugou ligeiro e entrou no quarto, cautelosa, tudo parecia normal. A minha imaginação idiota outra vez! Preciso me vestir logo. Foi até a gaveta de lingerie, abriu-a e ficou olhando, incrédula. Alguém tinha mexido em suas roupas íntimas. Seus sutiãs e calcinhas estavam empilhados, todos juntos. Ela sempre guardava as peças arrumadas em separado. Ashley sentiu um nó no estômago. Teria ele aberto a própria calça, pegado uma calcinha dela e a esfregado contra o corpo? Teria se dado à fantasia de estuprá-la? Ela sentiu dificuldade para respirar. Eu deveria ir à polícia, mas eles ririam de mim. Você quer que nós façamos uma investigação porque está achando que alguém mexeu na sua gaveta de lingerie? Alguém anda me seguindo. Você já viu quem é? Não. Alguém a ameaçou? Não. Você sabe por que alguém iria querer lhe fazer mal? Não.

Não adianta, pensou Ashley, à beira do desespero. Não posso procurar a polícia. Eles me fariam exatamente estas perguntas, e eu iria passar por boba. Ela se vestiu o mais rápido que pôde, tomada por uma ânsia de fugir do apartamento. Vou ter de me mudar. Morar num lugar qualquer onde ele não consiga me encontrar. Mas embora entabulasse esses pensamentos, Ashley tinha a sensação de que seria impossível. Ele sabe onde eu moro, sabe onde eu trabalho. E o que eu sei sobre ele? Nada. Ela se recusava a ter uma arma no apartamento, pois detestava violência. Mas agora eu preciso de proteção, pensou. Foi até à cozinha, pegou a faca de cortar carne e levou-a para o quarto, colocando-a na gaveta da cômoda, ao lado de sua cama. É possível que eu mesma tenha misturado as calcinhas com os sutiãs. Só pode ter sido isso! Ou seria pensamento ansioso?

Havia um envelope em sua caixa de correspondência na portaria do prédio. O endereço do remetente era: "Escola de Segundo Grau da Região Administrativa de Bedford, Bedford, Pensilvânia". Ashley leu o convite duas vezes.

Reunião de Dez Anos da Turma!

Rico, pobre, mendigo, ladrão. Você não vive se perguntando como os seus colegas de turma se saíram nesses últimos dez anos? Eis a chance de descobrir. Vamos fazer uma reunião fantástica no fim de semana de 15 de junho. Comida, bebida, orquestra e baile. Venha se divertir. Basta enviar o cartão de resposta pelo correio para confirmar a sua presença. Todos estão ansiosos para rever você.

A caminho do trabalho, Ashley foi pensando no convite. "Todos estão ansiosos para rever você". Todos exceto Jim Cleary, pensou ela, com amargura.

"Eu quero me casar com você. O meu tio me ofereceu um emprego muito bom em Chicago, na agência de publicidade dele... Tem um comboio que sai para Chicago as sete da manhã. Você topa?" E ela se recordou da angústia da espera na estação ferroviária, acreditando nele, confiando nele. Jim mudara de idéia e não fora homem o suficiente para ir lhe dizer. Em vez disso, deixara-a sentada numa estação ferroviária, sozinha. É melhor esquecer o convite. Eu não vou.

Ashley almoçou com Shane Miller no TGI Friday's. Eles ficaram num dos compartimentos reservados, comendo em silêncio.

- Você está com um ar preocupado - falou Shane.

- Desculpe. - Ashley hesitou um instante. Ficou tentada a lhe contar sobre a lingerie, mas a história pareceria idiota. Alguém mexeu nas suas gavetas? - Em vez disso, falou: - Recebi um convite para a reunião de dez anos da minha turma do segundo grau.

- Você vai?

- Certamente que não. - A frase saiu com mais entonação do que Ashley pretendera.

Shane Miller olhou para ela, curioso.

- Por que não? Essas reuniões costumam ser divertidas.

Será que Jim Cleary estaria lá? Levaria mulher e filhos? O que me diria? "Desculpe! Eu não consegui ir me encontrar com você na estação ferroviária. Sinto muito por ter mentido para você quando lhe falei sobre casamento"?

- Eu não vou.

Mas Ashley não conseguiu tirar o convite da cabeça. Seria bom rever alguns dos meus colegas de turma, pensava ela. Tinha sido muito íntima de alguns. Em particular, de Florence Schiffer. Eu gostaria de saber como ela anda. E ficou curiosa por saber se a cidade de Bedford havia mudado.

Ashley Paterson crescera em Bedford, Pensilvânia, uma cidadezinha a duas horas de Pittsburgh, em direção ao leste, entranhada na serra de Allegheny. Seu pai foi diretor do Memorial Hospital do condado de Bedford, um dos cem melhores hospitais do país.

Bedford tinha sido um lugar maravilhoso para passar a infância. Cheia de parques para se fazer piquenique, de rios onde a pesca era boa e de eventos sociais ao longo do ano inteiro. Ashley gostava de visitar o Grande vale, onde havia uma colônia amish. Era comum ver cavalos puxando carruagens com tetos de cores diferentes, que dependiam do grau de ortodoxia dos seus donos.

Havia as festas noturnas da Vila do Mistério, as apresentações de teatro e o Grande Festival da Abóbora. Ashley sorriu só de pensar nos bons tempos que passou ali. Talvez eu vá, pensou. Jim Cleary não terá o desplante de aparecer.

Ashley contou sua decisão a Shane Miller

- Vai ser na sexta-feira seguinte a esta - disse ela. - Vou voltar domingo à noite.

- Que bom! Se você me avisar à hora em que vai chegar, vou buscá-la no aeroporto.

- Obrigada Shane!

Quando voltou do almoço, Ashley entrou em seu cubículo e ligou o computador. Para sua surpresa, uma súbita chuva de pixels se espalhou pela tela, formando uma imagem. Ela olhou para aquilo, perplexa. Os pixels estavam formando a imagem dela. Enquanto observava horrorizada, a mão de alguém, segurando uma faca de cortar carne, apareceu no alto da tela. A mão se aproximou rapidamente de sua imagem, disposta a esfaqueá-la no peito.

Ashley soltou um berro:

- Não!

Desligou o monitor, assustada, e se pôs de pé num pulo.

Shane Miller correu para perto dela.

- Ashley! O que foi?

Ela estava trêmula.

- Na... Na minha tela...

Shane ligou o computador. Apareceu a imagem de um gatinho, correndo pela grama atrás de um novelo de lã.

Shane olhou para Ashley, confuso.

- O que...?

- Mas... Sumiu - falou ela, com um sussurro de voz.

- O que foi que sumiu?

Ela balançou a cabeça.

- Nada. Eu tenho andado muito estressada ultimamente, Shane. Desculpe!

- Por que você não vai fazer uma consulta com o Dr. Speakman?

Ashley já havia se consultado com o Dr. Speakman antes. Era o psicólogo da empresa, contratado para acompanhar e orientar os funcionários abalados pelo estresse da informática. Não era um médico, mas era inteligente e compreensivo, e conversar com alguém sempre adiantava alguma coisa.

- Vou, sim - disse Ashley.

O Dr. Ben Speakman era um cinquentão, um patriarca da fonte da juventude. Seu consultório era um oásis tranqüilo, situado na extremidade mais longínqua do prédio, um local confortável e acolhedor.

- Eu tive um sonho terrível ontem à noite - disse Ashley. E fechou os olhos, revivendo as sensações. - Eu estava correndo. Estava num jardim enorme, cheio de flores... Elas tinham rostos estranhos, feios... Gritavam comigo... Eu não conseguia ouvir o que estavam dizendo. Só continuava correndo em direção a alguma coisa... Não sei o quê... - Ela parou de falar e abriu os olhos.

- Será que você não estava correndo de alguma coisa? Não havia nada que a estivesse perseguindo?

- Não sei. Eu... Eu acho que estou sendo seguida, Dr. Speakman. Parece maluquice, mas... Eu acho que alguém quer me matar. Ele a estudou durante alguns instantes.

- E quem poderia estar querendo matá-la?

- Não... Não faço a menor idéia.

- Você já viu alguém seguindo você?

- Não.

- Você mora sozinha, não é?

- Moro.

- Está saindo com alguém? Algum envolvimento romântico?

- Não. Agora, não.