Выбрать главу

“O resultado desta conversa foi Chislev abandonar a sua floresta e, assumindo a forma mortal, perambular pelo mundo. O que viu, deixou-a num estado de extrema perturbação. A noite era rasgada pelos clarões rubros das forjas, que ardiam em fúria. Os Elfos poliam as espadas recém-adquiridas. Os Humanos contavam o dinheiro. Os Ogros praticavam a decapitação de cabeças. Desgostosa, Chislev decidiu que algo tinha de ser feito.

“Chislev ainda considerou a hipótese de discutir o assunto com Zivilyn, seu esposo e o deus que pode enxergar todos os planos e todos os tempos, passados e futuros. Mas, por experiência, Chislev sabia ser difícil obter de Zivilyn um simples “sim” ou “não”, pois ele, sempre com a mente assoberbada com a feitura de alguma coisa, quando a analisava de outro ângulo, mudava de idéia e ocupava-se com outra qualquer, mas vendo-a de outra perspectiva, de novo alterava o parecer, e assim por diante até acabar por não fazer coisa nenhuma.

“Este assunto exigia ação, e Chislev decidiu tomá-la. Avistou-se pessoalmente com Reorx.

“Nunca nenhum dos deuses visitara Reorx, um dos motivos que o levava a passar o tempo na companhia dos Humanos. Ficou estupefato e agradado por receber esta visita, sobretudo por Chislev possuir uma tão delicada beleza e um temperamento doce.

“Por seu turno, a deusa ficou atônita com o comportamento de Reorx, que a cumulou de atenções, andando numa roda viva pela casa, a confeccionar bolos, tropeçar na mobília, esquecer-se onde pusera o bule, oferecer-lhe tudo o que existisse no Universo e que ela quisesse comer.

“Chislev sentiu uma pontinha de remorsos ao constatar a solidão do deus, e censurou-se por tê-lo esquecido. Prometendo a si mesma que no futuro o visitaria com mais assiduidade, Chislev bebeu o chá e expôs o seu pedido.

“Reorx exultou. Ela queria uma pedra preciosa? Daria uma, cem pedras preciosas! As mais lindas do Universo!

“Corando, Chislev replicou que pretendia apenas uma pedra preciosa, uma gema simples, que funcionasse como receptáculo da neutralidade.

“Reorx cofiou a barba e franziu o cenho, imerso em pensamentos.

“— E essa tal o que seria, exatamente?

“Chislev ficou algo perplexa.

“— Ora — respondeu —, a essência da neutralidade seria... bom...

“— O Caos? — sugeriu Reorx.

“Chislev ponderou o assunto e, um pouco receosa, relanceou o olhar em redor, caso o Pai de Tudo e de Nada — a personificação do Caos — estar ouvindo. — Acha possível conseguir só uma pequena porção? Não muita. O suficiente para manter a neutralidade presa a este mundo.

“— Dona, é como se a tarefa já estivesse concluída! — exclamou Reorx, revelando um desassombro espantoso. — Onde devo entregar a pedra preciosa?

“Chislev, que ponderara longamente o assunto, respondeu:

“— Entregue-a a Lunitari. É quem está mais próxima do mundo. Como se encontra permanentemente envolvida com os Mortais e os seus afazeres, deverá ficar com a guarda dela.

“Reorx concordou. Beijando-lhe a mão, caiu em cima de um canapé, entornou a xícara e, de rosto afogueado, dirigiu-se imediatamente para a forja.

“Chislev voltou para a sua floresta de coração aliviado.

“Desconhece-se como Reorx conseguiu capturar e encerrar um pedacinho de Caos na pedra preciosa. Mas, de acordo com o que aconteceu mais tarde, tornou-se óbvio que possuía capacidades para fazê-lo. Criou o que designou por Pedra Preciosa Cinzenta, e depois de concluída, confiou-a aos cuidados de Lunitari. Esta se sentiu atraída pela gema de imediato e depositou-a no centro da Lua Vermelha. Raramente a perdia de vista, pois a pedra exercia, em quem a olhasse, o estranho efeito de cobiçá-la.

“Infelizmente, Reorx, o seu criador, também lhe era vulnerável. Mal entregou a pedra a Lunitari, constatou, desconcertado, que, noite após noite, sonhava com a jóia. Arrependendo-se de tê-la dado, apresentou-se junto de Lunitari e, com modos humildes, pediu-lhe que a restituísse.

“Lunitari recusou. Também ela sonhava, noite após noite, com a gema, e gostava de acordar e vê-la cintilar na Lua Vermelha.

“Reorx agastou-se, quase soltou faíscas, e pôs-se a conjurar uma forma de sonegar a Pedra Preciosa Cinzenta. Assumindo a forma mortal, apareceu entre os Gnomos, a raça por ele criada. Escolheu um deles, cujas invenções haviam sido, no mínimo, calamitosas para a vida, o limbo e os valores patrimoniais e, em sonhos, mostrou a esse gnomo a Pedra Preciosa Cinzenta.

“É evidente que o gnomo ficou a desejá-la mais do que qualquer outra coisa na face de Krynn, excetuando, possivelmente, uma chave de fendas de cabeças múltiplas acionada a vapor. Encontrando-se esta última inacessível (por estar ligada a uma junta), o gnomo decidiu capturar a Pedra Cinzenta. O relato de como o conseguiu insere-se noutras histórias, mas o esforço de recuperação inclui uma escadinha mágica, vários molinetes e roldanas, uma rede mágica e um impulso por parte de Reorx.

“Basta dizer que o gnomo capturou a Pedra Cinzenta recorrendo a uma rede mágica, aproveitando um momento em que Lunitari se encontrava no outro extremo do mundo.

“— Justamente o que faltava — observou o gnomo, examinando, com ar de admiração, a pedra — para dar energia ao meu combinado picador de picles/máquina de barbear com lâminas rotativas.

“Preparava-se o gnomo para introduzir a pedra no invento, quando apareceu Reorx, disfarçado de gnomo, que a pediu para si.

“Seguiu-se uma luta entre os dois e, durante a contenda, a Pedra Preciosa Cinzenta resvalou da rede e libertou-se.

“Foi este o primeiro indício de constituir a Pedra Cinzenta algo mais do que Reorx, Lunitari, o gnomo ou alguém mais haviam imaginado.

“Atônito, Reorx viu a pedra sulcar o ar. Precipitou-se no seu encalço (secundado pelo gnomo e por uma turba de conhecidos seus), mas nenhum conseguiu capturá-la. A Pedra Cinzenta circundou, com truculência, a superfície de Krynn, semeando um rasto de destruição. Alterou animais e plantas, influenciou os poderes mágicos dos feiticeiros e causou grande burburinho com a sua presença.

“Todos os deuses sabiam agora da existência da Pedra Preciosa Cinzenta. Paladino e Takhisis estavam furiosos com Reorx por tê-la forjado sem consultá-los antes. Chislev admitiu, com frontalidade, a sua participação no conluio e atribuiu a responsabilidade a Hiddukel, que se limitou a encolher os ombros e a rir despudoradamente.

“A sua maquinação funcionara. Em vez de garantir o equilíbrio, a Pedra Cinzenta tornara-a ainda mais periclitante. Os Elfos planejavam entrar em guerra com os Humanos, os Humanos preparavam-se para combater os Elfos, e os Ogros ansiavam envolver-se em luta com todos os intrusos.

“Para resumir esta história, um humano, de nome Gargath, conseguiu capturar a Pedra Cinzenta. Mediante vários dispositivos mágicos, aprisionou-a no seu castelo. (Ou assim pensou, mas sou de opinião de que a Pedra Cinzenta permitiu que a capturassem, pois nenhuma magia humana que conheço teria o poder de dominá-la por tanto tempo.)

“Os Gnomos, que há décadas se empenhavam na perseguição da Pedra Cinzenta, montaram cerco ao castelo de Gargath. Conseguindo (por casualidade) penetrar pelas muralhas, precipitaram-se para o pátio e avidamente se apossaram da Pedra. Parte dos gnomos exigiu que a pedra fosse quebrada no próprio local, pois ardiam de curiosidade por saber o que continha. A outra parte pretendia levá-la para a região onde habitavam e trancá-la, devido ao seu valor.

“Um vivo clarão cinzento iluminou o pátio, cegando a tods. Quando recuperaram a vista, deram com os dois grupos de gnomos envolvidos em luta. Porém, o mais espantoso era que os gnomos tinham deixado de sê-lo. O poder da Pedra Cinzenta alterara-os, transformando os que a cobiçavam em Duendes e os que a queriam por mera curiosidade em Kenders.