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14

A Dama da Noite acusa.

Palin responde.

Um presságio sinistro.

Os dois cavaleiros que tinham escoltado Steel para o local da execução, ajudavam-no agora a se levantar do cepo. Viram-se forçados a pô-lo de pé e a endireitá-lo. Steel, que desejara tão intensamente transpor o Além, que se entregara em absoluto à morte, sentia-se, em vida, fraco e trêmulo. Caminhou em passos trôpegos e olhou, desvairado à sua volta, interrogando-se sobre o que traria esta nova vida.

O Senhor de Ariakan baixara a espada, embora continuasse a segurá-la. Depois, impôs disciplina às fileiras e ordenou que o clamor se silenciasse.

Palin continuava no lugar onde se materializara. Desde a estrondosa declaração inicial, permanecera estático, sem dizer palavra. Claro que o Senhor de Ariakan interrompera a execução, mas tornava-se óbvio — pelo modo como passeava repetidamente o olhar por Steel e Palin — que Sua Senhoria tinha perguntas a fazer.

Virando-se para os cavaleiros reunidos, Ariakan inquiriu:

— Alguém sabe me dizer o que se passa? Quem é este Veste Branca? É, na verdade, o prisioneiro que procuramos? Poderá, algum dos presentes, identificá-lo?

Avançaram dois cavaleiros, ambos forçando ansiosamente o caminho por entre a multidão, mas motivos distintos determinavam a sua pressa. Um, era o subcomandante Trevalin, recém-chegado do triunfo em Qualinesti. O seu rosto irradiava prazer e, quando se deteve diante do suserano, lançou a Steel um olhar de congratulação. O outro, era a Dama da Noite, que devorava Palin com os olhos.

Trevalin dispunha-se a falar de imediato, mas a Dama da Noite antecipou-se, obrigando-o a refrear a impaciência. Lillith tomou a palavra.

— Meu Senhor Ariakan — disse a Dama da Noite, fazendo uma vênia. Parecia perturbada, ansiosa. — Na realidade, este é Palin Majere, o prisioneiro por quem Steel Montante Luzente empenhou a palavra. Fui eu quem, em batalha, capturou o jovem mago. Conheço-o. Juro perante a nossa Rainha. Contudo, meu senhor, deixe que te afirme que a recuperação deste mago não deveria, em circunstância alguma, influenciar na sentença que ditou contra Steel Montante Luzente. Perdeu o prisioneiro e não foi ele a reavê-lo. Afirmou o meu senhor que o Montante Luzente deveria morrer. Insisto com Sua Senhoria para que leve a cabo a sentença!

O Senhor de Ariakan olhou para a mulher com uma expressão perturbada, e depois virou-lhe as costas, gorando-lhe os esforços de acrescentar o que quer que fosse. Em seguida, olhou para Trevalin.

— Subcomandante, reconhece este Veste Branca? Jura que confirma a sua identidade?

— Meu senhor, conheço, na verdade, o mago — respondeu Trevalin. — É Palin Majere, o prisioneiro, e juro pela minha Rainha e por todas as suas hostes! O que exonera Steel Montante Luzente da sentença de morte! — rematou, dardejando a Dama da Noite com um olhar de desafio.

Ariakan esboçou um leve sorriso.

— Assim será, subcomandante — disse. Virando-se para Steel, acrescentou: — Montante Luzente, é este o teu prisioneiro?

— Sim, meu senhor — respondeu Steel, aturdido. — Este é Palin Majere.

— Sobrinho de Raistlin Majere que, uma vez mais, caminha neste plano de existência! — exclamou a Dama da Noite. — Meu Senhor Ariakan, insisto contigo! Entregue imediatamente o mago e o primo aos Cavaleiros do Abrolho! Deixe que nos encarreguemos deles! Escute o que te digo, senhor, pois conspiram juntos! Se assim não fosse, que motivos teria este jovem mago para se entregar voluntariamente à morte? Acha que pode escapar! Meu senhor, mate-os agora, imediatamente! Caso contrário, aviso-o, estes dois provocarão a queda dos cavaleiros!

Os cavaleiros reunidos entreolharam-se e puseram-se a falar em voz baixa e agitada. Com a sua veemência e ardor, Lillith era de uma convicção alarmante.

Ariakan levantou a mão, exigindo silêncio, e olhou intensamente para o jovem mago que se mantinha sozinho perto do cepo de mármore manchado de sangue.

— Me aconselharei quanto à questão de Steel Montante Luzente — disse. — Quanto ao mago, os Cavaleiros do Abrolho podem interrogar o prisioneiro à vontade. Permitam apenas que fale em sua defesa, antes que o calor aumente e acabemos todos assados vivos.

Embora o Sol mal tivesse nascido, o calor já se fazia sentir. O aspecto do Sol também era estranho. Parecia maior, mais perto do mundo, como se isso fosse possível. O calor incidia implacável nas armaduras negras dos cavaleiros, e não eram poucos os que lançavam olhares em direção às áreas frondosas.

Com o braço, Ariakan limpou o suor da testa e prosseguiu o interrogatório.

— Palin Majere, veio pagar o seu resgate?

— Veio para nos destruir! — exclamou a Dama da Noite em voz estridente.

Ariakan lançou-lhe um olhar sinistro, obrigando-a a mergulhar em silêncio.

Palin abanou a cabeça.

— Não, não vim — respondeu.

— Está, de fato, aliado ao seu primo Steel Montante Luzente para nos trair? Jovem mago, diga a verdade — advertiu Ariakan. — Tenho meios de verificar se mente, meios que não considerará muito agradáveis.

— Fiz os votos dos Vestes Brancas — retorquiu Palin em tom orgulhoso. — Meu senhor, acha provável eu me aliar a um cavaleiro do Mal?

Acenando com a cabeça, Ariakan pareceu aceitar a resposta. Frustrada, Lillith rilhava os dentes, murmurando em voz baixa.

Ignorando a Dama da Noite, Ariakan continuou a dirigir-se ao jovem mago.

— Foi condenado à morte, no caso de ser capturado e não trazer o resgate. Ordeno que tal sentença seja executada de imediato. Antes de morrer, tem algo a dizer?

— Tenho sim, meu senhor — replicou Palin. — Dei a minha palavra de que regressaria. Antes de morrer, desejo apresentar as minhas desculpas a este cavaleiro e explicar-lhe por que faltei à minha palavra.

— Não permita que fale! — insistiu a Dama da Noite. — É um truque dos nossos inimigos! Não confie nesse mago! É sobrinho de um dos feiticeiros mais poderosos que já existiram! Meu senhor, afirmo que deparei com Raistlin Majere próximo da Floresta de Wayreth! Ele escapou do Abismo...

— O meu tio nunca esteve no Abismo! — interveio Palin. A Dama da Noite nem se preocupou em refutar.

— Raistlin voltou! — insistiu. — Foi ele quem te enviou até aqui, não é verdade?

— Não, não é! — respondeu Palin, e um leve rubor espalhou-se pelas faces descoradas. — Apresentei-me aqui por iniciativa própria. De outro modo, o meu tio me teria impedido!

Ariakan interveio.

— Dama da Noite, será que posso dizer uma palavrinha? Obrigado. Estou a par das façanhas dos membros da família Majere. Ao que parece a coragem corre-lhes nas veias. Quero falar com este jovem mago. Lillith, se o receia tanto — acrescentou, com secura —, então, subjugue-o com os encantamentos que te apetecer.

Carregando o cenho, a Dama da Noite aproximou-se e foi se postar ao lado de Palin. Desdenhou tocar nas bolsas e alforjes que continham os componentes de encantamento. Fosse qual fosse a magia que estes produziam, conseguiria anulá-la com facilidade. Os seus olhos, ávidos, invejosos e desconfiados, estavam fixos no bastão.

— Lorde Ariakan, ele tem consigo o Bastão de Magius... um dos artefatos mágicos mais poderosos de todo o continente de Ansalon.

— Pois então, tire-o — disse Ariakan, impaciente.

— Meu senhor, quero que seja ele a me dar. Isso provará que não se trata de um truque do tio.

Sem encarar a Dama da Noite, Palin manteve os olhos fixos em Ariakan.

— Meu senhor, pode ficar com o bastão quando este tombar da minha mão morta. Antes, não. Asseguro-lhe que não se trata de truque nenhum. Não estou envolvido com o meu primo em nenhum conluio. Meu senhor, permite que fale sem rodeios?

— Não pode confiar nele! — gritou a Dama da Noite. — Não vê que se recusa a entregar o bastão? Pode nos causar um mal terrível!