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— E quanto aos meus fazedores de magia? Os teus sacerdotes?

— Os encantamentos de luz evitarão que as criaturas-sombras assumam a forma do inimigo e os encantamentos de fogo as destruirão, mas os feiticeiros terão de expulsar da mente as vozes letais daquelas, senão serão destruídos. Todo o objeto sagrado que tocar no guerreiro demoníaco, o remeterá de novo para o esquecimento, mas o próprio objeto se perderá, será sacrificado.

Pensativo, Ariakan guardou silêncio. Depois, aquiescendo com a cabeça, observou:

— Majestade, começo agora a entender por que motivo pretende que se mantenham tropas de reserva. Esta batalha irá nos enfraquecer muitíssimo.

— Enfraquecerá todos, Lorde Ariakan — replicou Takhisis. — E nisso residirá a nossa vitória final. Reinarei em supremacia. Meu senhor, adeus.

A Rainha estendeu-lhe a mão enluvada e o Senhor de Ariakan prostrou-se de novo de joelhos, para que o abençoasse.

— Majestade, lutaremos até à morte! — exclamou, com fervor. Com ar de desagrado, Sua Majestade retirou a mão.

— Ariakan, tenho almas de sobra — disse com frieza. — São os vivos que me interessam.

Ariakan baixou a cabeça, acusando a reprimenda. Quando a levantou, a Rainha já desaparecera

25

Ordens.

Escondidos.

— O que disse? — perguntou Steel, furioso, e o amargo desapontamento o fez esquecer da disciplina. — Trevalin, não está falando sério!

Os outros cavaleiros rodearam o superior, juntando-se aos protestos de Steel.

— Desagrada-me tanto quanto a vocês, mas foram as ordens que recebi — respondeu Trevalin. — Temos que nos esconder nas armadilhas para dragão, longe da batalha, e permanecer ali até novas ordens. E — acrescentou, dardejando os homens com um olhar severo —, temos que guardar sigilo a respeito disto. O homem que o divulgar a alguém alheio a este batalhão, pagará com a vida.

— Estamos sendo castigados — observou um dos cavaleiros.

— Que fizemos para cair no desagrado do nosso amo? — perguntou outro.

— Andar por aí aos segredinhos, escondidos no escuro como duendes dos esgotos fedorentos!

— O povo entoará odes à bravura dos nossos camaradas...

— Entoarão à nossa vergonha!

— Cavalheiros, basta! As ordens que recebi vêm diretamente de Lorde Ariakan — interveio Trevalin, em tom severo. — Algum plano deve ter em mente. Cabe-nos obedecer e não questionar. Se há queixas a fazer, sugiro que as apresentem diretamente a Sua Senhoria.

Tal declaração veio calar os protestos — pelo menos os ditos em voz alta. Os cavaleiros trocaram olhares carrancudos e infelizes, mas nada disseram.

Dada a imposição de sigilo, Trevalin reunira os homens nos barracões do batalhão, longe dos alojamentos da força principal dos cavaleiros. Ao olhar de relance pela janela, verificou que o Sol começava, por fim, a baixar no horizonte, irradiando um fulgor lúgubre, como que renitente em partir e assim perder a batalha iminente. A torre preparava-se para o ataque seguinte, augurado pelas vastas poças de trevas, que deslizavam pelos flancos das montanhas e se adensavam ao redor das muralhas. Da escuridão ressaltavam agora os olhos dos guerreiros do demônio, a caminharem entre as criaturas-sombras. Tratava-se apenas de olhos, nada mais. Olhos vermelhos, medonhos, faiscantes de morte.

A visão permitia a cada cavaleiro partilhar a descrição feita por Sua Majestade das Trevas a respeito das criaturas-sombras e dos guerreiros demoníacos e de como derrotá-los. Os cavaleiros do Lírio aprontavam os dragões para levantar vôo. Os Cavaleiros da Caveira invocavam a Rainha, para que derramasse a sua benção sobre as armaduras, os escudos e as armas. Os Cavaleiros do Abrolho reuniram ingredientes mágicos e memorizavam encantamentos. O batalhão de Steel preparava-se para bater em retirada e esconder-se.

— É tempo de partirmos — disse por fim Trevalin, com relutância. — Espero que não haja perguntas a fazer, pois se assim fosse, não poderia lhes responder. Dentro de uma hora, deveremos nos encontrar reunidos nas armadilhas para dragão. Dada a necessidade de sigilo, tomarão caminhos diferentes e irão um a um ou aos pares. O oficial cavaleiro Montante Luzente transmitirá as diretivas.

Com ar macambúzio, os cavaleiros preparavam-se para abandonar o local, a fim de assumirem as novas posições “na adega, com as velhas e as crianças”, conforme disse um em surdina, para que Trevalin não ouvisse.

Steel estava tão furioso como os outros por perder a batalha, mas — passado o primeiro acesso de cólera — nada mais dissera. Resgatara o seu posto, era de novo o segundo-comandante do batalhão e, na qualidade de oficial cavaleiro, dele se esperava que prestasse lealdade e apoio incondicional a Trevalin. Steel organizou os cavaleiros do batalhão, deu a cada grupo instruções quanto ao trajeto específico a tomarem, ouviu-os resmungar e, referindo-se a “tropas de choque” e “missões secretas”, tudo fez ao alcance para apaziguá-los. Quando o último contingente se retirou, apresentou-se junto de Trevalin para lhe apresentar um relatório da situação.

— Sabe, não anda longe da verdade — disse-lhe Trevalin em voz baixa, quando se encaminharam para as armadilhas para dragões. — Pelo que consegui apurar, passamos à reserva porque nos vai ser atribuída uma missão importante, que o Ariakan recebeu de Sua Majestade em pessoa. Um dos guarda-costas de Ariakan me contou que a Rainha se avistou com o nosso suserano no Ninho do Pica-Peixe e que falaram. O homem soube porque viu o Ariakan subir até lá sozinho e depois ouviu duas pessoas falando — uma era mulher, com uma voz que lembrava um sino anunciando a catástrofe. Quando o Ariakan desceu, vinha pálido e tremendo, como um homem atingido por um raio. Pouco depois, transmitia estas ordens.

Steel sorriu, com agrado.

— Porque não conta aos outros? Os faria se sentir melhor.

— Porque devemos obedecer às ordens sem contestá-las. E o que te contei, não passa de mexerico — replicou Trevalin em tom cortante. Relaxando, encolheu os ombros, sorriu e acrescentou: — Em outras palavras, oficialmente, eu não recebi autorização para dizer, mas você, Montante Luzente, pode fazer correr o boato.

— Fomos escolhidos pela própria Rainha! — exclamou Steel, exultante, para consigo, ao franquearem os portões de bronze que conduziam às armadilhas para dragões.

Mas, quando a escuridão daquele antro se abateu sobre eles, os separou dos camaradas e os envolveu na sua mortalha, tornou-se difícil manter o orgulho, o arroubo por se saberem eleitos.

Mantiveram-se em silêncio, que foi interrompido pelo toque às armas de um clarim, um apelo ao qual estavam proibidos de responder.

Refreando-se, Steel procurou manter-se calmamente sentado, a aguardar as ordens. Olhou, com ar de censura, para os cavaleiros que procuravam extravasar as emoções andando nervosamente de um lado para o outro e ordenou-lhes que ficassem quietos e não desperdiçassem energias. Passou a primeira hora limpando e polindo a espada, a espada do pai, admirando-lhe de novo a perfeição, que nem sequer os mestres forjadores de espadas contratados por Sua Excelência Ariakan conseguiam igualar. O próprio Ariakan afirmara tratar-se de uma das mais belas lâminas que já lhe fora dado admirar.

Na realidade, a espada não precisava ser limpa, pois Steel punha um extremo cuidado na manutenção das suas armas. Mas polir o requintado metal proporcionava-lhe algo de construtivo para fazer e, ao mesmo tempo, tranquilizava-o. Deu consigo a pensar no pai e nas histórias que ouvira a respeito da coragem dele. Os seus pensamentos recuaram até às brumas das épocas que antecederam o progenitor. Steel interrogou-se a respeito dos outros cavaleiros que empunharam aquela espada e a transportaram aos píncaros da honra e da glória. Onde se encontravam agora reunidos todos os Montante Luzente? Será que se dispunham, em linha, atrás do seu chefe, Paladino, preparando-se para se lançar no combate? Os antepassados de Montante Luzente lutaram em nome de Paladino. Steel, que os representava em vida, combatia por Takhisis. Mas, o que viu pouca diferença fazia, pois tratava-se do reverso da medalha.