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Back from inhabiting his time, he thought:
time in progress, live time, is empty,
and not only empty but also transparent,
so that the instant to be inhabited passes unseen.
Therefore: to avoid killing it, we have to kill it,
to kill time by filling it with things,
to live not in the desert but in the streets,
where people fill it up and kill it.
Since time goes by transparently
and only gains body and color by what’s in it
(whatever passed it and hasn’t all passed),
we can only inhabit it in the past, where it’s dead.
Para a feira do livro
Folheada, a folha de um livro retoma
o lânguido e vegetal da folha folha,
e um livro se folheia ou se desfolha
como sob o vento a árvore que o doa;
folheada, a folha de um livro repete
fricativas e labiais de ventos antigos,
e nada finge vento em folha de árvore
melhor do que vento em folha de livro.
Todavia a folha, na árvore do livro,
mais do que imita o vento, profere-o:
a palavra nela urge a voz que é vento,
ou ventania varrendo o podre a zero.
*
Silencioso: quer fechado ou aberto,
inclusive o que grita dentro; anônimo:
só expõe o lombo, posto na estante,
que apaga em pardo todos os lombos;
modesto: só se abre se alguém o abre,
e tanto oposto do quadro na parede,
aberto a vida toda, quanto da música,
viva apenas enquanto voam suas redes.
Mas apesar disso e apesar de paciente
(deixa-se ler onde queiram), severo:
exige que lhe extraiam, o interroguem;
e jamais exala: fechado, mesmo aberto.
For the Book Fair
When leafed, the leaf of a book regains
the vegetable lassitude of green leaves,
and a book is leafed or loses its leaves
like the tree it came from, blown by the wind;
when leafed, the leaf of a book repeats
fricatives and labials of ancient winds,
and nothing feigns wind in the leaves of a tree
as well as wind in the leaves of a book.
And yet the leaf in the tree of the book,
more than mimicking, utters the wind;
its words move the voice, which is wind:
a gale that blows what is rotten away.
*
Silent whether closed or open,
including what shouts inside it; anonymous,
it shows only its spine when on the shelf,
which annuls all the spines in gray; modest,
it opens only when someone opens it,
unlike a hanging picture, which is open
all its life, and unlike music,
alive only while its lines are flying.
But despite this and despite its patience
(lets anyone, anywhere, read it), severe,
requiring that you dig in, interrogate it;
and even when open, closed: it never gives vent.
from Museu de tudo / Catchall Museum 1975
A insónia de Monsieur Teste
Uma lucidez que tudo via,
como se à luz ou se de dia;
e que, quando de noite, acende
detrás das pálpebras o dente
de uma luz ardida, sem pele,
extrema, e que de nada serve:
porém luz de uma tal lucidez
que mente que tudo podeis.
The Insomnia of Monsieur Teste
A lucidity which sees everything,
as if by lamp- or daylight,
and which, at nightfall, turns on
behind the eyelids the tooth
of a sharp and skinless light,
extreme and serving for nothing:
a light so lucid it fools you
into thinking you can do everything.
W. H. Auden
(
1905–1973
)
Se morre da morte que ela quer.
É ela que escolhe seu estilo,
sem cogitar se a coisa que mata
rima com sua morte ou faz sentido.
Mas ela certo te respeitava,
de muito ler reler teus livros,
pois matou-te com a guilhotina,
fuzil limpo, do ataque cardíaco.
W. H. Auden
(
1905–1973
)
We die the death death decides.
Death itself selects its method,
without caring whether the weapon
fits or rhymes with the victim.
But death apparently respected you
after reading and rereading your stanzas,
for it killed you with the guillotine,
the clean gun of a heart attack.
O artista inconfessável
Fazer o que seja é inútil.
Não fazer nada é inútil.
Mas entre fazer e não fazer
mais vale o inútil do fazer.
Mas não, fazer para esquecer
que é inúticlass="underline" nunca o esquecer.
Mas fazer o inútil sabendo
que ele é inútil, e bem sabendo
que é inútil e que seu sentido
não será sequer pressentido,
fazer: porque ele é mais difícil
do que não fazer, e dificil —
mente se poderá dizer
com mais desdém, ou então dizer
mais direto ao leitor Ninguém
que o feito o foi para ninguém.
The Unconfessing Artist
Doing this or that is useless.
Not doing anything is useless.
But between doing and not doing,
better the uselessness of doing.
But no, doing to forget
is what’s useless — no one should forget.
But one can do what’s useless knowing
it’s useless, and although knowing
it’s useless and that its sense
cannot in any way be sensed,
still do: for it is harder
than not doing, and hardly
will one be able to say
with more disdain or say
more plainly to the reader Nobody
that what was done was for nobody.
Catecismo de Berceo
1. Fazer com que a palavra leve
pese como a coisa que diga,
para o que isolá-la de entre
o folhudo em que se perdia.
2. Fazer com que a palavra frouxa
ao corpo de sua coisa adira:
fundi-la em coisa, espessa, sólida,
capaz de chocar com a contígua.
3. Não deixar que saliente fale:
sim, obrigá-la à disciplina
de proferir a fala anônima,
comum a todas de uma linha.
4. Nem deixar que a palavra flua
como rio que cresce sempre:
canalizar a água sem fim
noutras paralelas, latente.