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Berceo’s Catechism 1. Make the light word weigh as much as the thing it tells by isolating it from among all the leaves it was lost in. 2. Make the loose word adhere to the body of its referent, fusing it into a solid, dense thing, able to clash with the one next to it. 3. Don’t let its speech stick out but impose the discipline of speaking anonymously — just another word in the line. 4. And don’t let the word flow, like a river that keeps growing, but channel the endless water into parallel, unseen streams.
As águas do Recife Os dois
touros 1. O mar e os rios do Recife são touros de índole distinta: o mar estoura no arrecife, o rio é um touro que rumina. Quando o touro mar bate forte nele há o medo de não ficar, de ter saído, de estar fora, de quem se recusa a ser mar. E há no outro touro, o rio, entre mangues, remansamente, mil manhas para não partir: anda e desanda, ainda, sempre. Mas se são distintos na ação, mesma é a razão de seu atuar: tentam continuar a ser da água de aquém do arrecife, antemar.
A queda
de braço 2. Eis por que dentro do Recife as duas águas vivem lutando, jogando de queda de braço entre os muros dos cais urbanos. A que é mar porque, obrigada, saltou o quebra-mar do porto vem, cada maré, desafiar a água ainda rio para o jogo. A água que remonta e a que desce travam então uma queda de braço: aplicadamente e em silêncio, equilibradas por espaços. Um certo instante estão imóveis, nem maré alta nem baixa, ao par; até que uma derruba e vence, e ao vencer, perder: se exilar.
The Waters of Recife
The two
bulls 1. The sea and the rivers of Recife
are bulls with different temperaments: the sea stampedes against the reef, the river is a bull that ruminates. The bull that is sea beats hard because it escaped, it is free and dreads being pulled back in; it no longer wants to be sea. Standing in coastal swamps, the other bull, the river, has a thousand tricks for lingering: it starts and stops, over and over. Although their actions are different, their reason for acting is the same: they try to continue as water on the reef’s near side, before sea.
The arm
wrestle 2. That is why inside Recife the two waters live in conflict, engaging in a daily arm-wrestle between the walls of the city docks. The water that’s sea, forced to jump the jetty of the port, comes with each tide to challenge the water that’s still river to fight. One rising and the other falling, the waters begin their arm-wrestle, assiduously and in silence, now gaining, now losing, by turns. For a moment they stand off, immobile — neither high nor low water, but tied — until one of them finally prevails, and in winning, loses: it is exiled.
A arquitetura da cana-de-açúcar Os alpendres das casas-grandes, de par em par abertos, anchos, cordiais como a hora do almoço, apesar disso não são francos. O aberto alpendre acolhedor no casarão sem acolhimento tira a expressão amiga, amável, do que é de fora e não de dentro: dos lençóis de cana, tendidos, postos ao sol até onde a vista, e que lhe dão o sorriso aberto que disfarça o que dentro é urtiga.
The Architecture of Sugarcane The porch of the manor house, extending into the open air and as cordial as lunch hour, is not genuinely open-hearted. The inviting porch of the mansion (where no one is ever invited) owes its friendly expression to what is not inside: to the white sheets of sugarcane that wave in the sun, giving the porch a welcome smile, disguising the nettle within.
Rilke nos Novos Poemas Preferir a pantera ao anjo, condensar o vago em preciso: nesse livro se inconfessou: ainda se disse, mas sem vício. Nele, dizendo-se de viés, disse-se sempre, porém limpo; incapaz de não se gozar, disse-se, mas sem onanismo.
Rilke in New Poems Replacing the angel with the panther and making what was vague precise, this was a book of unconfessions, still telling, but not as a vice. Here, by expressing at an angle, he told his own self, yet kept clean. Unable to resist consummation, he told all, but without masturbation.
O autógrafo Calma ao copiar estes versos antigos: a mão já não treme nem se inquieta; não é mais a asa no vôo interrogante do poema. A mão já não devora tanto papel; nem se refreia na letra miúda e desenhada com que canalizar sua explosão. O tempo do poema não há mais; há seu espaço, esta pedra indestrutível, imóvel, mesma: e ao alcance da memória até o desespero, o tédio.
The Autograph Calmly the hand copies these old verses, no longer restlessly trembling, no longer the wing in the poem’s searching flight. The hand no longer devours so much paper, nor forces its explosion to fit into tiny, florid letters. The time of the poem is over; there is its space, this unmoving, unbreaking, unchanging stone, and within the reach of memory even desperation, tedium.
Proust e seu livro De certo o sabia, quem viveu com a vida e a obra emaranhadas, que viveu fazendo-as, refazendo-as, elastecendo-a em tempo e páginas, que vestiu sua obra, por dentro, percorrendo-a, viajando em seu barco, de certo viu que um dia acabá-la era matar-se em livro, suicidá-lo.