Выбрать главу

Amo-te! murmurou ele com a boca nos cabelos dela. Nunca saberás a que ponto te amo...

Por que nunca hei-de saber? Não mo poderás provar durante estes anos todos que temos para viver juntos?

Saberemos nós se teremos anos pela frente? Eu vou partir, deixar-te, porque não posso levar-te comigo.

No fim de contas, por que razão não podes?

Sabe-lo bem. Não se leva uma mulher para a guerra.

Talvez se comportasse de maneira a espantar-te? Para te seguir, para estar sempre ao pé de ti, creio que seria capaz de aceitar muitos perigos.

Casei, afinal, com uma jovem leoa? perguntou ele, abraçando-a. Só aumentas as minhas penas, meu amor, minha flor... meu doce amor. Mas tu tens de ficar... nem que seja para não pôr o teu pai em perigo. Diz-se que o rancor do magnífico Lourenço pode ser tanto mais terrível quanto menos direito tem de exercer o poder. E tenho poucas dúvidas acerca dos seus sentimentos para com o meu duque. Se ele soubesse que o teu pai te deu a mim sem sequer lhe pedir a opinião, as consequências, se eu julguei bem o homem, poderiam ser... desagradáveis para vós dois.

Nesse caso, esperarei suspirou Fiora mas, mesmo que só dure uma semana, será bem longa, essa espera... Tens mesmo de partir amanhã?...

Não

posso fazer outra coisa...

Nesse caso, não podemos perder um minuto desta noite que o destino nos dá. Ama-me! Philippe, ama-me mais e mais, para que eu possa viver de recordações durante todos os dias e noites que vou passar sem ti.

Philippe só esperava aquele pedido, porque o desejo já tinha acordado de novo nele, mas temia, dando-lhe livre curso, assustar e até ferir aquela criança que se tinha abandonado a ele com tanta confiança. E afastou-se um pouco.

Não é preciso ter tanta pressa, minha doce... Tu és tão jovem, tão nova... Tenho tanto medo de te fazer mal!

Não me poderás fazer mal, porque sou eu que te»chamo. É tão doce ser tua...

Ele olhou para ela deslumbrado, maravilhado... A vela esculpia o seu corpo com sombras ternas, dourava a superfície delicadamente arredondada do seu corpo e fazia deslizar um raio na direcção do vértice das coxas, ao mesmo tempo arredondadas e esbeltas. Com uma mão, ele puxou para si o belo rosto tão puro, cujos lábios se entreabriam e ofereciam, ao mesmo tempo que as grandes pupilas claras desfaleciam. Nunca tal beleza lhe fora dada e o seu coração apertou-se ao pensar que ela iria desabrochar ainda mais, longe dos seus olhos:

Queres? perguntou ele com a voz rouca. Queres mesmo? Então, o riso de Fiora caiu em cascatas alegres, infantis e, no entanto, perturbadoras:

É claro que quero! Platão diz que é bom repetir duas ou três vezes as coisas boas!

A estupefacção deixou-o sem voz. Platão era, de certeza, a última pessoa que ele esperava ver como intruso no seu leito nupcial. Mas como imaginar que aquela adorável rapariga, ainda há pouco uma criança, pudesse ter conhecimentos de filosofia grega? A sua cultura não ia além dos Commentários de César e sentiu-se um pouco vexado...

E que diz Platão do amor? perguntou ele enquanto os seus dedos recomeçavam a deslizar pela pele suave.

Não... não fala muito dele ofegou Fiora, ao mesmo tempo que o seu olhar se perdia... Mas diz:...«Dá e receberás!» E... e eu dou-me a ti para sempre! E eu quero-te em mim, todo...

E então ele apoderou-se dela, brutalmente, como se ela fosse uma rapariga de uma cidade qualquer conquistada. Ela gritou e ele sufocou-lhe os gritos. Ele sentiu as lágrimas correrem-lhe pelo rosto e compreendeu que lhe estava a fazer mal, mas sentia uma alegria maldosa, duplicada pelo pensamento terrível de que aquela rapariga, nascida do incesto e alimentada por uma filosofia herética talvez fosse, no fim de contas, uma enviada do diabo. Teve vontade de a matar, para se libertar das correntes com que ela, insensivelmente, lhe prendia a alma. Já as suas mãos se agarravam ao seu frágil pescoço: começava já a apertá-lo quando ela abriu os seus imensos olhos da cor das nuvens que as lágrimas faziam brilhar e estendeu para que ele os beijasse, os lábios inchados...

Philippe! murmurou ela meu amor, meu senhor...

O demónio é que é o teu senhor! rugiu ele. Uma tal beleza não pode ter sido desejada por Deus...

Bruscamente lúcida, ela quis arrancar-se a ele:

Se há um demónio, foste tu que o fizeste nascer disse ela tão dolorosamente que ele teve vergonha. As lágrimas que agora corriam não eram lágrimas de felicidade. Ele recolheu-as uma a uma, antes de beijar longamente aquela boca trémula, ao mesmo tempo que, de novo, fazia explodir o prazer no corpo da jovem mulher, antes de dar livre curso à sua própria satisfação.

Perdoa-me! sussurrou ele, por fim. Tu pões-me louco...

Então, estamos loucos os dois concluiu Fiora, consolada, aninhando a cabeça na cova do ombro do seu marido...

Sentia-se fatigada, mas ainda não queria dormir. Teria todo o tempo para se abandonar ao sono quando Philippe já ali não estivesse, quando o seu leito estivesse vazio e frio...

Ignorava suspirou ela que o amor pudesse dar tanta satisfação e eu gostaria de poder dar-te tanta quanta tu me dás...

Não sentes a que ponto me fazes feliz?

Talvez... mas, há um momento, pareceu-me que me detestavas...

Não acredites nisso... A verdade é que tu és demasiado bela e a tua beleza mete-me medo.

Porquê, se tudo o que eu sou te pertence inteiramente? Oh! Meu amor, ensina-me a amar-te... Diz-me como te hei-de dar tanto prazer...

Isso são coisas que não se ensinam a uma mulher honesta disse ele com uma falsa severidade...

Para que hei-de eu ser uma mulher honesta esta noite? Vou ter todo o tempo para isso. Esta noite só quero ser a tua mulher...

Enternecido, ele guiou-lhe os primeiros gestos, mas a aluna era digna do mestre e um silêncio, povoado por longos suspiros, instalou-se por baixo das cortinas púrpuras que fechavam os dois amantes, como se estivessem no coração de um fruto maduro. E, por três vezes ainda, Philippe triunfou daquele corpo jovem que parecia insaciável, até que por fim, Fiora, fulminada, adormeceu de repente, com a cabeça fora do leito e os longos cabelos, encharcados em suor, arrastando pelo tapete. Philippe, com o coração a bater desordenadamente no peito, deixou-se cair de borco, o rosto nas almofadas e, por sua vez, adormeceu também.

Mas a madrugada não estava longe. Algures, no campo, um galo cantou, imitado por outros nos quatro cantos do horizonte... A porta da câmara nupcial abriu-se silenciosamente sob a mão de Léonarde, que permaneceu um momento imóvel, na soleira, fascinada pelo espectáculo que se lhe oferecia à luz decadente da vela, da concha avermelhada da alcova aberta com os dois corpos nus, que o amor parecia ter fulminado. O de Fiora, na sua pose impudica, tinha o ar do cadáver de uma bacante e Léonarde, de sobrolho franzido, benzeu-se duas ou três vezes antes de caminhar, sem o menor ruído, na direcção daquele leito onde, um século antes, dormira uma virgem inocente...