— O que é?
Ela se abanou, contra o crescente calor alcoólico, a ponta da língua entre os dentes. Em francês, André disse:
— Estou livre, meu amor, muito em breve seu contrato será pago, e se tornará toda minha para sempre.
— Sinto muito, mas não entendi. Voltando ao japonês, ele murmurou:
— Esta noite eu ser feliz e dizer você minha. Ser muito bonita e ser minha.
Hinodeh inclinou a cabeça ao elogio.
— Você também é bonito e fico contente quando se sente feliz comigo.
— Sempre.
Mas isso não era verdade. Com bastante frequência, André se irritava, ia embora furioso. Sempre o mesmo problema, um comentário casual, levando-o a indagar, depois escarnecer, suplicar, exigir, implorar, gritar:
— Não precisamos de escuridão! Somos amantes e não precisamos mais do escuro. Somos amigos, além de amantes, estou comprometido com você para sempre. Para sempre! Amo você, não pode nem imaginar o quanto a amo, não pode saber, fico perguntando e perguntando, mas você apenas senta aí...
Sempre a mesma resposta paciente e submissa, a cabeça no chão, a voz baixa, com ou sem lágrimas, mas categórica:
— Por favor, desculpe, mas você concordou. Sinto muito, mas você concordou.
Ela tornou a beber e André percebeu o crescente rubor em suas faces, observou-a sair de novo, os dedos trêmulos, derramando uma gota. Hinodeh prendeu a respiração, com uma risada.
— Oh, sinto muito!
As duas taças, cheias, de novo logo se esvaziaram, a embriaguez de Hinodeh tornando-a ainda mais sedutora.
— Ah, mas isso é muito, muito gostoso, neh, Furansu-san?
Os dedos compridos, com unhas perfeitas, sacudiram o frasco, para descobrir que estava vazio. Hinodeh levantou-se no mesmo instante, graciosa, o quimono comprido arrastando no chão, criando a ilusão de que ela flutuou até o braseiro, onde havia outros frascos, em água fervendo, e até a pequena janela, onde havia uma prateleira para fora, com mais frascos, gelando. O vento entrou no cômodo por um instante, trazendo um odor inesperado. Fumaça de pólvora, tênue, mas inconfundível.
— O que é isso? — disse ele, em francês. Hinodeh fitou-o, surpresa.
— Por favor?
Agora que a janela fora fechada, o odor desaparecera.
— Nada... apenas pensei... — Naquela noite, tudo em Hinodeh o fascinava. — Nada... Por favor, sente aqui.
Obediente, ela sentou ao seu lado, esbarrando nele, rindo. Meio desajeitada, serviu de novo. Divertido, André bebeu com ela, o saquê esquentando-o, mas não tanto quanto aquecia Hinodeh. Sob a manta, as pernas se encontraram. Ele estendeu a mão para pegar a dela, a outra contornou sua cintura, beijaram-se, os lábios de Hinodeh macios e úmidos, a língua sensual. A mão de André foi subindo, ela se desvencilhou do abraço, rindo.
— Espere, espere, não aqui, esta noite...
Como uma colegial assustada, Hinodeh empurrou-o, levantou-se, foi para o quarto, com um único lampião, pronta para apagá-lo, e depois, quando estivesse no escuro, convidando-o para entrar. Mas naquela noite ela parou na porta, encostou-se nela, virou-se, os olhos cintilando.
— Furansu-san...
Observando-o, ela cantarolou, enquanto tirava os alfinetes compridos dos cabelos, deixou-os caírem numa cascata até a cintura. Em seguida, soltou a obi e deixou-a cair. Uma risada. E veio a vez do quimono. André ficou fascinado incapaz de respirar. O dourado do quimono de baixo tremeluzia às chamas das velas, deixando entrever, mas também ocultando. Mais uma vez, a ponta da língua de Hinodeh percorreu os lábios. Coquete, ela desamarrou os laços, deixou o quimono abrir um pouco. Não havia outras roupas por baixo. Apenas as linhas estreitas de seu corpo reveladas, do pescoço aos pés mínimos. E durante todo o tempo o sorriso enigmático, os olhos sedutores, compelindo-o a esperar, prometendo, insinuando. O vento zunia pelas telas de shoji, mas nenhum dos dois o ouvia.
O coração de André batia forte, como nunca antes. Ele forçou-se a permanecer sentado. Podia agora ver o peito de Hinodeh subindo e descendo, os mamilos dos seios pequenos se projetando contra a seda. E depois ela suspirou. Com uma graça excepcional, ela deixou essa última cobertura escorregar, devagar, e ficou imóvel ali, em toda a sua pureza.
Para André, o tempo parou. Mal respirando, ele exultou com o presente que Hinodeh lhe oferecia, tão inesperado, e dado por livre e espontânea vontade. Quando não mais podia suportar a espera, ele se levantou. Seus braços foram gentis e beijou-a com toda a paixão que possuía, apertando-se fortemente contra ela, que ficou inerte em seus braços. Com a maior facilidade, André levantou-a, foi estendê-la sobre os futons no quarto, tirou as próprias roupas. Ajoelhou-se ao seu lado, contemplando-a em êxtase, na luz.
— Jet’aime, jet’aime.
— Olhe, Furansu-san — murmurou ela, com um sorriso adorável.
Os dedos apontavam para a parte interna da coxa. Por um instante, ele não entendeu. E depois viu a abrasão. Seu coração quase saltou do peito, a bílis subindo à boca.
— Olhe — repetiu ela, a voz suave, o sorriso constante, os olhos muito escuros, na tênue claridade. — Começou.
— Não... não é nada — balbuciou André, a voz trémula. — Nada.
— É tudo. — Ela fitou-o nos olhos. — Por favor, dê-me a faca.
Ele sentiu a cabeça girar, sem ver mais nada, apenas a chaga, que parecia encher todo o mundo. Com um esforço gigantesco, André sacudiu a cabeça, para desanuviá-la. E forçou os olhos a ver. Mas isso não dissipou o gosto amargo e vil na boca.
— Não é nada, apenas... nada... absolutamente nada. — Quanto mais ele olhava, menos importante a chaga parecia. — Não passa de uma marca de esfoladura, só isso.
— Por favor? Deve falar em japonês, Furansu-san, sinto muito.
— Ah... não ser doença. Não isso. Apenas... apenas tanga apertada, não se preocupar.
André inclinou-se para cobri-la, apagar a luz, mas ela o deteve. Gentilmente.
— Sinto muito, mas já começou. Por favor, dê-me a faca.
Como sempre, a faca de André se encontrava na bainha em seu cinto. Junto com as roupas, por trás dele.
— Não, por favor, Hinodeh, não faca, faca ruim, não precisar faca. Isso apenas marca, sem importância.
Através de seu pesadelo, ele a viu sacudir a cabeça, sempre gentil, e repetir o pedido, que agora se tornara uma ordem. Os braços e pernas de André começaram a tremer, a cabeça balançava, de forma incontrolável, não havia como controlar, não havia como interromper a litania incoerente, o murmúrio em francês e japonês que se despejou por sua boca, suplicando, alegando e explicando que a pequena chaga era apenas uma esfoladura, não mais do que isso, não era nada demais, embora ele soubesse. Começara mesmo. Hinodeh tinha razão. Começara, começara de verdade. O estômago de André se contraiu. Mal conseguiu conter o vômito e continuou a murmurar, interminável.