— Legal — disse Rony.
— É — concordou Neville, feliz. — Só tem que quando perceberam que não tinham como me pressionar, resolveram que Hogwarts poderia muito bem passar sem mim. Não sei se estavam planejando me matar ou me mandar para Azkaban; qualquer que fosse o caso, achei que era hora de desaparecer.
— Mas — perguntou Rony, inteiramente desconcertado — não estamos... não estamos voltando direto para Hogwarts?
— Claro. Você verá. Chegamos.
Eles viraram um canto e logo adiante a passagem terminava. Um pequeno lance de escada levava a uma porta igual a que havia atrás do retrato de Ariana. Neville abriu-a e galgou a escada. Quando o seguia, Harry ouviu o colega gritar para pessoas invisíveis:
— Vejam quem está aqui! Eu não disse a vocês?
Ao emergir da passagem para a sala além, ouviram-se gritos e aplausos... — HARRY!
— É Potter, é POTTER!
— Rony!
— Hermione!
Harry teve uma impressão confusa de coisas coloridas penduradas, de candeeiros e muitos rostos. No momento seguinte, ele, Rony e Hermione foram engolfados, abraçados, receberam palmadas nas costas, tiveram os cabelos despenteados, as mãos apertadas, aparentemente por umas vinte pessoas: parecia que tinham ganhado uma final de quadribol.
— O.k., o.k., calma pessoal! — gritou Neville e, quando o amontoado de gente recuou, Harry pôde observar o ambiente.
Não reconheceu a sala. Era enorme e lembrava o interior de uma casa de árvore particularmente suntuosa, ou talvez uma gigantesca cabine de navio. Redes multicoloridas pendiam do teto e de uma galeria que rodeava o cômodo cujas paredes sem janelas eram revestidas de painéis de madeira escura, cobertas de tapeçarias de cores vibrantes. Harry viu o leão dourado da Grifinória sobre o fundo vermelho, o texugo negro da Lufa-Lufa sobre o amarelo e a águia bronze da Corvinal sobre o azul. Só estava ausente o verde e prata da Sonserina. Havia estantes superlotadas, algumas vassouras encostadas nas paredes e, a um canto, um grande rádio com caixa de madeira.
— Onde estamos?
— Na Sala Precisa, é claro! — respondeu Neville. — Desta vez ela foi demais, não? Os Carrow estavam me perseguindo, e eu sabia que só tinha um esconderijo possíveclass="underline" consegui passar pela porta e foi isso que encontrei! Bem, não estava exatamente assim quando cheguei, era bem menor, só tinha uma rede e tapeçarias da Grifinória. Mas se expandiu à medida que mais gente da Armada de Dumbledore foi chegando.
— E os Carrow não podem entrar? — perguntou Harry, olhando ao redor à procura da porta.
— Não — respondeu Simas Finnigan, que Harry não reconhecera até ouvir sua voz: o rosto do colega estava inchado e roxo. — É um esconderijo de verdade, desde que um de nós esteja sempre presente, eles não podem nos surpreender, a porta não se abrirá. É tudo obra do Neville. Ele realmente saca essa sala. Você tem que pedir exatamente o que precisa... tipo “Não quero que nenhum seguidor dos Carrow possa entrar”, e a sala fará isso! Você só tem que garantir que não deixou nenhum furo! Neville é o cara!
— Na realidade, não tem mistério — disse Neville, modestamente. — Eu já estava aqui fazia um dia e meio, louco de fome, desejei arranjar o que comer e a passagem para o Cabeça de Javali se abriu. Entrei por ela e deparei com Aberforth. Ele tem nos fornecido comida, porque, por alguma razão, essa é a única coisa que a sala não faz.
— É, bem, comida é uma das cinco exceções da Lei de Gamp sobre a Transfiguração Elementar — afirmou Rony, para surpresa geral.
— E assim estamos nos escondendo aqui há quase duas semanas — informou Simas —, e a sala acrescenta mais redes toda vez que precisamos, e até fez brotar um banheiro muito bom quando as garotas começaram a chegar...
— ... foi quando desejaram muito poder se lavar — acrescentou Lilá Brown, que Harry não havia notado até aquele momento. Agora que reparava melhor o ambiente, reconheceu os rostos de muitos colegas. As gêmeas Patil estavam ali, bem como Terêncio Boot, Ernesto Macmillan, Antônio Goldstein e Miguel Corner.
— Mas contem o que vocês andaram fazendo — pediu Ernesto -; são muitos os boatos que correm e temos procurado nos manter informados sobre vocês pelo Observatório Potter. — Ele apontou para o rádio. — Vocês não arrombaram o Gringotes?
— Arrombaram! — confirmou Neville. — E o dragão também é verdade!
Ouviram-se breves aplausos e alguns gritos; Rony fez uma reverência.
— Que estavam procurando? — perguntou Simas, ansioso. Antes que alguém pudesse desviar a pergunta com outra, Harry sentiu uma dor terrível e causticante na cicatriz. Ao se virar rapidamente de costas para os rostos curiosos e extasiados, a Sala Precisa desapareceu, e ele se viu parado no interior de um casebre de pedra, em ruínas, as tábuas podres do soalho arrancadas aos seus pés, uma caixa de ouro desenterrada aberta e vazia ao lado de um buraco, e o berro de fúria de Voldemort vibrou em sua cabeça.
Com enorme esforço, ele se retirou da mente de Voldemort e voltou ao lugar em que estava, na Sala Precisa, oscilando, o suor porejando em seu rosto e Rony sustentando-o em pé.
— Você está bem, Harry? — Ele ouviu Neville perguntar. — Quer se sentar? Imagino que esteja cansado, não...?
— Não — respondeu Harry. Ele olhou para Rony e Hermione, tentando lhes comunicar, mudamente, que Voldemort acabara de descobrir a perda de uma de suas Horcruxes. O tempo estava se esgotando depressa: se Voldemort decidisse visitar Hogwarts em seguida, eles perderiam sua oportunidade.
“Temos que ir andando”, falou, e as expressões dos colegas revelaram compreensão.
— Que vamos fazer, então, Harry? — perguntou Simas. — Qual é o plano?
— Plano? — repetiu Harry. Ele estava exercendo toda a sua força de vontade para não se deixar sucumbir à fúria de Voldemort: sua cicatriz continuava a queimar. — Bem, tem uma coisa que nós, Rony, Hermione e eu, precisamos fazer, e depois temos que sair daqui.
Ninguém mais estava rindo nem aplaudindo. Neville pareceu aturdido.
— Como assim “sair daqui”?
— Não viemos para ficar — respondeu Harry, esfregando a cicatriz, tentando suavizar a dor. — Tem uma coisa importante que precisamos fazer...
— Que é?
— Eu... eu não posso dizer.
Seguiram-se murmúrios de desagrado a essa notícia: as sobrancelhas de Neville se contraíram.
— Por que não pode nos dizer? É alguma coisa ligada à luta contra Você-Sabe-Quem, certo?
— Bem, é...
— Então nós o ajudaremos.
Os outros membros da Armada de Dumbledore assentiram, alguns entusiasticamente, outros solenemente. Uns dois se levantaram de suas cadeiras para demonstrar sua disposição de agir imediatamente.
— Você não está entendendo. — Pareceu-lhe ter repetido aquilo muitas vezes nas últimas horas. — Nós... nós não podemos dizer. Temos que fazer isso... sozinhos.
— Por quê? — perguntou Neville.
— Porque... — Em seu desespero para começar a procurar a Horcrux restante, ou, pelo menos, ter uma conversa particular com Rony e Hermione para decidir por onde começar a busca, Harry teve dificuldade em pensar. Sua cicatriz ainda queimava. — Dumbledore nos encarregou de uma tarefa, que não devíamos comentar... quer dizer, ele queria que a fizéssemos, só nós três.
— Nós somos a Armada dele — insistiu Neville. — A Armada de Dumbledore. Estivemos todos unidos nisso, temos continuado a resistir enquanto vocês três estiveram lá fora sozinhos...