Ela não fazia ideia de que acabara de salvar a vida de William Fraser.
-Vou arranjar-lhe um passaporte. -Entregou-lhe um envelope. -Isto é um adiantamento por conta do seu salário. Não terá de preocupar-se com alojamento. A companhia tem um apartamento em Londres. Vai ficar lá. Era surpreendente.
- 0 senhor é muito generoso. Ele tomou-lhe a mão.
- Você acabará por achar que eu...
Ele acabou por não dizer no que estava a pensar. «Trata dela com cuidado», pensou. ~<Lentamente. Não a queiras espantar.»
-... que eu sei ser um bom amigo. - 0 senhor é um bom amigo. Demiris sorriu. «Então espera.»
Duashoras depois, ConstantinDemiris ajudouCatherine a entrar para o banco traseiro do Rolls Royce que ia levá-la ao aeroporto. -Aproveite o melhor de Londres - disse ele. -Ficarei em contacto consigo. Cinco minutos depois de o carro ter partido, Demiris estava ao telefone com Londres.
- Ela vai a caminho.
Catherine apressara-se, só para encontrar a recepção de Fraser cheia de dezenas de candidatas ao emprego. «Não tenho hipótese», pensou Catherine. A porta para o gabinete de William Fraser abriu -se, e ele emergiu. Era um homem alto e atraente, com cabelo louro encaracolado, de fontes já acinzentadas, olhos azuis brilhantes e um queixo forte, bastante ameaçador. Voltou-se para a recepcionista.
- Preciso de um exemplar da Life. Uma edição que saiu há três ou quatro semanas. Traz uma fotografia de Estaline na capa. -Vou pedi-la, senhor Fraser-disse a recepcionista. -Sally, o senador Borah está na linha. Eu quero ler-lhe um parágrafo dessa edição. Você tem dois minutos para me conseguir uma cópia. - Entrou no gabinete e fechou a porta.
As candidatas entreolharam-se e encolheram os ombros. Catherine deixou-se ficar, muito pensativa. Virou-se e saiu do escritório. Ouviu uma das mulheres dizer;
- Óptimo. É menos uma.
Três minutos depois, Catherine regressou ao escritório com uma cópia antiga da Life, com uma fotografia de Estaline na capa. Entregou-a à recepcionista. Cinco minutos depois Catherine encontrava-se sentada no gabinete de William Fraser.
-A Sally disse-me que foi você quem trouxe a revista.
-Fui eu, sim. Assumo que não trazia por acaso uma edição com três semanas na carteira.
-Pois não.
-Como é que a encontrou tão depressa?
-Fui lá abaixo à barbearia. As barbearias e os consultórios dos dentistas têm sempre edições antigas espalhadas por lá.
-Você é tão inteligente com o resto? -Não sou, não.
-Havemos de descobrir isso-disse William Fraser. Estava contratada,
Catherine apreciava a excitação de trabalhar para Fraser. Ele era um solteiro rico e social, e parecia conhecer toda a gente em Washington. A revista Time chamara-o «0 solteiro mais elegível do ano». Seismeses depois de Catherine começar atrabalhar para William baser, apaixonaram-se. No quarto dele, Catherine disse; 0 avião estava programado para partir do Aeroporto de Hellenikon às 9.00 da manhã. Era um Hawker Siddeley, e, para surpresa de Catherine, ela era aúnica passageira. 0 piloto, um grego de meia-idade, de rosto agradável chamado Pantelis, tratou de ver se Catherine ia confortavelmente sentada e com o cinto apertado.
- Descolaremos dentro de alguns minutos -disse-lhe ele. - Obrigada.
Catherine viu-o entrar na cabina para se juntar ao co-piloto, e o coração dela repentinamente começou a bater mais depressa. «Este era o avião que o Larry pilotava. A Noelle Page ter-se-ia sentado no lugar onde eu estou sentada agora?» Catherine de repente sentiu-se como se fosse desmaiar; as paredes começaram afechar-se sobre ela, Fechou os olhos e respirou fundo. «Isso acabou», pensou. «0 Demiris é que está certo. Isso pertence ao passado e nada poderá mudá-lo.» Ouviu o ronco dos motores e abriu os olhos. 0 avião estava alevantar na direcção de noroeste com rumo a Londres. «Quantas vezes tinha Larry feito este voo? Larry.» Ela estava agitada pelo misto de emoções que o seu nome causava, E as lembranças. As maravilhosas e terríveis lembranças... Corria o Verão de 1940, o ano anterior à entrada da América na guerra. Ela acabara de sair da Universidade de Northwestern e fora de Chicago para Washington, D.C., onde arranjara o seu primeiro emprego. A companheira de quarto dissera-lhe:
-Sei de um emprego que talvez te interesse, Uma das raparigas da festa disse que se vai despedir para regressar ao Texas. Ela trabalha para o Bill Fraser. Ele é responsável pelas relações públicas do Departamento de Estado. Eu soube disso apenas ontem à noite, portanto, se fores já para lá, deves chegar primeiro do que as outras,
- Tenho de te contar uma coisa. Sou virgem. Fraser sacudiu a cabeça admirado.
- Isso é incrível.
Como é que eu me envolvi com a única virgem da cidade de Washington?
Um dia William Fraser disse a Catherine:
-A nossa firma foi solicitada para supervisionar um filme de recrutamento do Corpo Aéreo do Exército nos estúdios da MGM em Hollywood, Gostava que te encarregasses do filme enquanto eu estiver em Londres.
-Eu? Bill, eu nem sequer sei carregar umaBrownie. Que sei eu sobre um filme de treino?
Fraser deu um sorriso largo, mostrando os dentes.
- Quase tanto como toda a gente. Não precisas de te preocupar, Eles têm um realizador. Chama-seAllan Benjamin. 0 exército pensa usar actores no filme.
- Porquê?
-Acho que eles sentem que os soldados não convencem o suficiente para fazerem de soldados.
-Isso é mesmo do exército.
E Catherine voara para Hollywood para supervisionar o filme de treino.
0 palco estava repleto de figurantes, a maior parte deles de uniformes que não lhes assentavam bem.
- Desculpe-me -disse Catherine a um homem que passou por ela. - 0 senhor Allen Benjamin está cá?
- 0 cabozinho? - Ele apontou. - Acolá.
Catherine virou-se e viu um homem franzino e de aspecto frágil num uniforme com divisas de cabo. Gritava com outro que usava estrelas de almirante.
- Estou-me marimbando para o que disse o director do elenco. Estou farto de generais. Preciso de oficiais subalternos.
Ergueu as mãos em desespero.
- Querem todos ser chefes, ninguém quer ser índio. -Desculpem-me interromper-disse Catherine. -Sou Catherine Alexander.
-Graças a Deus!-disse o homenzinho, -Você é que toma conta disto. Não sei o que estou a fazer aqui. Eu tinha um emprego de trinta e cinco mil dólares ao ano em Dearborn para dirigir uma revista de mobiliário e negócios, e fui recrutado para o Corpo de Sinaleiros e mandaram-me para aqui escreverfilmes de treino. Que sei eu sobre produção e direcção de filmes?
-Fique com tudo isto. -Voltou-se e apressou-se para a saída, deixando Catherine ali.
Um homem esguio, de cabelo grisalho e de camisola, aproximou-se dela, com um sorriso divertido no rosto.
- Precisa de ajuda?
-Preciso de um milagre-disse Catherine.-Estou à frente disto, e não sei quais são as minhas funções.
Ele deu-lhe um sorriso aberto.
-Bem vinda a Hollywood. Chamo-me Tom O'Brien, realizador assistente,
-Acha-se com capacidade para realizar isto? Ela viu o canto da boca contorcer-se.
-Podia tentar. Fiz seis filmes com o Willie Wyler. A situação não é tão má quanto parece. Tudo o que é preciso é um pouco de organização. 0 argumento está escrito, e o cenário está pronto. Catherine deu uma vista de olhos pelo palco.
-Algumas destas fardas têm um péssimo aspecto. Vamos ver o que podemos fazer para as melhorar.
O'Brien abanou a cabeça num tom aprovador. -Certo.
Catherine e O'Brien foram aproximar-se do grupo de figurantes. A barulheira da conversa sobre o palco enorme era ensurdecedora. -Vamos baixar a voz, rapazes -gritou O'Brien. - Temos aqui Catherine Alexander. É quem vai mandar aqui.