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Catherine disse:

-Vamos alinhar, de modo a podermos olhar bem para vocês. OBrien formou os homens numa fila desalinhada. Catherine ouviu gargalhadas e vozes por perto e voltou-se irritada. Um dos homens fardados estava num canto, sem prestar atenção, a falar com umas raparigas muito atentas ao que ele dizia e dando risinhos. Os modos do homem irritaram Catherine.

-Desculpe. Importava-se de se juntar a nós? Ele voltou-se e perguntou, preguiçosamente: - Está a falar comigo?

- Estou. Nós queríamos começar a trabalhar.

Ele era extraordinariamente bonito, alto e vigoroso, com cabelo negro azulado e olhos escuros tempestuosos. A farda assentava-lhe perfeitamente. Sobre os ombros havia uns galões de capitão, e sobre o peito tinha pregado umamancha defitas brilhantemente coloridas. Catherine olhou-as fixamente.

-Essas medalhas...?

-Impressionam bastante, chefe?-Avoz eraprofunda e cheia de divertimento insolente.

- Tire-as.

- Porquê? Achei que iam dar ao filme um pouco de cor.

- Esqueceu-se de um pequeno pormenor, A América ainda não está em guerra. Só as poderia ter ganho nalgum carnaval.

-Tem razão - admitiu ele acanhadamente. - Não pensei nisso. Vou tirar algumas.

-Vai tirar todas -ripostou Catherine.

Depois da filmagem da manhã, enquanto Catherine almoçava na intendência, ele foi até à mesa dela.

-Queria perguntar-lhe como é que eu me portei esta manhã. Fui convincente?

Os modos dele enfureceram-na.

-Você gosta de usar aquela farda e pavonear-se ao pé das raparigas, mas já pensou em alistar-se?

Ele parecia chocado.

- Elevar um tiro? Isso é para idiotas. Catherine estava pronta a explodir. -Eu acho que você é desprezível.

- Porquê?

- Se você não sabe porquê, eu nunca lhe poderia explicar. -Porque é que não tenta? Hoje ao jantar. Na sua casa. Cozinha? - Não se dê ao trabalho de voltar às filmagens - ripostou Ca

therine. -Vou dizer ao senhor O'Brien que lhe envie o seu cheque para pagar esta manhã de trabalho. Como é que se chama? Douglas. Larry Douglas.

A experiência com o jovem actor arrogante exasperou Catherine, e ela estava determinada a esquecer o incidente. Por alguma razão, ela estava com dificuldades em esquecê-lo.

Quando Catherine regressou a Washington, William Fraser disse-lhe

-Tive saudades tuas. Tenho pensado muito em ti. Amas-me? -Muito, Bill.

-Eu também te amo. Porque não saímos esta noite para comemorar?

Catherine sabia que era essa a noite em que ele ia pedir-lhe a mão.

Foram ao exclusivo Jefferson Club. A meio do jantar, Larry Douglas entrou, usando ainda a farda do Corpo Aéreo do Exército com todas as medalhas, Catherine observava incredulamente enquanto ele caminhava até à mesa deles e cumprimentou não a ela, mas a Fraser. Bill Fraser levantou-se.

- Cathy, este é o capitão Lawrence Douglas. Larry, esta é a Catherine Alexander. 0 Larry voa na RAF. Ele era o líder da esquadrilha americana. Convenceram-no a chefiar uma base de caças em Washington para preparar alguns dos nossos rapazes para combate.

Como a reposição de um filme antigo, Catherine lembrou-se da ordem que lhe dera para que ele tirasse os galões e medalhas, e como ele alegremente cumprira. Elafora presunçosa, autoritária-e chamara-o de cobarde! Só teve vontade de se esconder debaixo~da mesa.

No dia seguinte, Larry Douglas telefonou a Catherine para o escritório. Ela recusou aceitar as chamadas dele. Quando ela saiu do escritório, ele estava lá fora, à espera dela. Tirara as medalhas e as fitas e usava os galões de segundo-tenente. Ele sorriu e caminhou até ela. -Assim está melhor? Catherine ficou a olhar para ele. - 0 uso de insígnias indevidas não é contra os regulamentos? - Não sei. Pensei que você é que mandava nisto tudo. Ela olhou nos olhos e sabia que estava perdida. Havia nele uma força magnética que era irresistível.

- 0 que é que quer de mim? -Tudo. Quero-a a si.

Foram para o apartamento dele e fizeram amor. E foi uma alegria intensa que Catherine nunca pensara ser possível, uma aproximação fantástica que balançou o quarto e o universo-até que houve uma explosão que se tornou um delírio extasiante, umaviagem esmagadora e inacreditável, uma partida e uma chegada, um fim e um começo. E ela ficara ali deitada, exausta e entorpecida, abraçando-o com força, não querendo largá-lo, não querendo que esta sensação desaparecesse. Casaram-se cinco horas mais tarde no estado de Maryland. Agora, sentada no avião, a caminho de Londrespara começaruma nova vida, Catherine pensava: <~Fomos tão felizes. 0 que é que correu mal? Os filmes românticos e as canções de amor levaram-nos a todos a acreditar em finais felizes e cavaleiros de armaduras brilhantes e no amor que nunca, nunca morria. Nós realmente acreditámos que James Stewart e Donna Reed tiveram Uma Vida Maravilhosa, e sabíamos que Clark Gable e Claudette Colbert ficariam juntos para sempre depois de Aconteceu Uma Noite, e derramámos lágrimas quando Frederick March voltou para Myrna Loy por causa de OsMelhores Anos das Nossas Vidas, e tínhamos a certeza de que Joan Fountaine encontrou a felicidade nos braços de Laurence Olivier em Rebecca. E eram mentiras. Tudo mentiras. E as canções.l'llBe Loving You, alcuays.Como é que os homens medem o sempre? Com um relógio para cozer ovos? Hocu Deep Is the Ocean? Que tinha IrvingBerlin em mente? Meio metro? Um metro? E...Forever a Day. Vou-me embora. Quero o divórcio. Some Enchanted Evening. Nós vamos subir o Monte Tzoumerka...You and theNight and the Music. 0 gerente do hotel falou-me de umas caves aqui perto...(1 Love You) for Sentimental Reasons. Nunca ninguém... agora, enquanto ela está a dormir.Be My Love. E ouvimos as canções e vimos os filmes e pensámos realmente que era assim que a vida ia ser. Eu tinha tanta fé no meu marido. Poderei acreditar assim em alguém outra vez? Que fiz eu para que ele me quisesse assassinar?»

-Senhorita Alexandre...

Catherine olhou para cima, assustada, desfocada. 0 piloto estava ao pé dela.

-Já aterrámos. Bem-vinda a Londres.

Havia uma limusina à espera de Catherine no aeroporto. 0 motorista disse:

-Eu encarrego-me da sua bagagem, menina Alexandrr. 0 meu nome é Alfred. Gostava de ir directamente para o apartamento? HO meu apartamento.»

- Sim, será óptimo.

Catherine afundou-se nas costas do banco. Inacreditável. Constantin Demiris proporcionara-lhe um avião particular e um lugar para morar. Ou ele era o homem mais generoso do mundo, ou... Ela simplesmente no conseguia pensar noutra alternativa. «Não. Ele é o homem mais generoso do mundo. Terei de achar um modo conveniente de mostrar o meu agradecimento.~> 0 apartamento, na Elizabeth Street nas imediações de Eaton Square, era totalmente luxuoso. Consistia de uma entrada enorme, uma sala de estar muito bem mobilada com um candelabro de cristal, umabiblioteca com paredes almofadadas, uma cozinhacheia de comida, três quartos atraentemente mobilados e instalações para os criados. Catherine foi cumprimentada à porta por uma mulher de quarenta e tal anos vestida de preto.

-Boa tarde, menina Catherine. Chamo-me Anna. Sou a sua governanta.

Claro. A minha governanta.p Catherine começou a aceitar tudo sem dificulade.

-Muito prazer.

0 motorista trouxe as malas de Catherine e colocou-as no quarto de dormir.

-A limusina está à sua disposição-disse lhe. -Basta apenas dizer à Anna quando estiver pronta para ir para o escritório, e eu venho buscá-la.

«A limusina está à minha disposição. Naturalmente.u -Obrigada-disse Anna.

-Vou desfazer as suas malas. Se precisar de mais alguma coisa, é só dizer-me.

-Acho que não preciso de nada-disse Catherine honestamente.

Catherine deambulou pelo apartamento até Anna acabar de dêsfazer as malas. Entrou no quarto e olhou para os belos vestidos novos que Demiris lhe comprara, e pensou: «Tudo isto parece um sonho maravilhoso.» Sentiu-se repentinamente cansada. Deitou-se na cama macia e confortável. «Vou só descansar um pouco», pensou. Fechou os olhos. Estava a afogar-se e a gritar por socorro. E Lorry nadava em direcção a ela, e quando a alcançou empurrou-a para debaixo da água. E ela estava numa gruta escura, e os morcegos atiravam-se a ela, puxando-lhe o cabelo, batendo as suas asas frias e húmidas contra o seu rosto. Catherine acordou com um sobressalto e sentou-se na cama, a tremer. Respirou fundo várias vezes para se recompor. «Chega», pensou. «Acabou. Isso foi ontem. Hoje é hoje. Ninguém te vai fazer mal. Ninguém. Já chega » Fora do quarto de Catherine, Anna, a governanta, escutara os gritos. Esperou um momento, e quando houve silêncio foi até ao hall e pegou no telefone para informar Constantin Demiris. ACorporaçãoHelénica de Comércio estava situada no número 217 da Bond Street, nas imediações de Picadilly, num velho edifício do governo, que fora transformado anos antes em edifício de escritórios. 0 exterior do prédio era uma obra-prima de arquitectura, elegante e graciosa. Quando Catherine chegou, o pessoal do escritório estava à sua espera, Havia meia dúzia de pessoas perto da porta para cumprimentá-la.