-Certamente.
Sem pensar, Chotas bateu com a pasta na cara do homem. 0 estranho gritou cheio de dores.
- Seu filho da puta!
Meteu a mão no bolso e puxou de uma pistola com um silenciador incorporado.
-Eh! 0 que é que se passa aí?-gritou uma voz. Um guarda fardado corria na direcção deles.
0 estranho hesitou por uin instante, depois correu para a porta aberta.
0 guarda chegou ao pé de Chotas.
- 0 senhor está bem, senhor Chotas?
-Ah... sim. -Napoleon Chotas estava com dificuldades em respirar, - Estou óptimo.
- 0 que é que ele lhe quis fazer? Napoleon Chotas disse lentamente; -Não tenho a certeza.
«Podia ter sido uma coincidência», dizia Chotas a si próprio quando se sentou à secretária. É possível que ohomem estivesse simplesmente a assaltar-me. Mas uma pessoa não usa uma arma com um silenciador para assaltar. Não, a intenção dele era matar-me.» E Constantin Demiris teria declarado ter ficado chocado com a notícia como fingira ter estado sobre a morte de Frederick Stavros. «Eu devia ter sabido», pensou Chotas. «Demiris não é homem para correr riscos. Não pode permitir deixar pontas soltas. Bem, o senhor Demiris que se prepare para uma surpresa.» A voz da secretária de Napoleon Chotas surgiu no intercomunicador;
- Senhor Chotas, deve comparecer no tribunal dentro dé trinta minutos.
Hoje era o sumário dele num caso de homicídios em série, mas Chotas estava demasiado abalado para aparecer no tribunal. -Telefone ao juiz e diga-lhe que estou doente. Um dos sócios que faça o meu trabalho. Não recebo mais chamadas.
Tirou um gravador de uma gaveta da secretária e sentou-se, a pensar. Depois começou a falar. Logo a seguir ao almoço, Napoleon Chotas apareceu no gabinete do advogado do Ministério Público, Peter Demonides, com um envelope castanho. 0 recepcionista reconheceu imediatamente.
-Boa tarde, senhor Chotas. Posso a~udá-lo? - Quero falar com o senhor Demonides.
- Ele está numa reunião. Tem hora marcada?
- Não. Diga-lhe que eu estou aqui, e que é urgente. -Sim, naturalmente.
Quinze minutos depois, Napoleon Chotas foi conduzido ao gabinete do advogado do Ministério Público.
-Bem -disse Demonides-,vem Maomé à montanha. Em que posso ajudá-lo? Vamos negociar um pequeno apelo hoje à tarde? -Não. É um assunto pessoal, Peter.
-Sente-se, Leon.
Quando os dois homens estavam sentados Chotas disse:
- Quero deixar um envelope consigo. Está selado, e é para ser aberto apenas caso eu tenha uma morte acidental.
Peter Demonides analisava-o, curioso.
- Está à espera que lhe aconteça alguma coisa? - É uma possibilidade.
- Compreendo. Um dos seus clientes ingratos?
- Não interessa quem. Você é a única pessoa em quem posso confiar. Pode guardar isto num cofre a que ninguém possa chegar? - Claro. - Ele inclinou-se para a frente . - Você parece assustado.
-E estou.
-Quer que o meu departamento lhe dê alguma protecção? -Posso mandar um polícia acompanhá-lo.
Chotas batia no envelope com a mão.
- Esta é a única protecção de que preciso. -Pois bem. Se está assim tão certo.
-Estou. - Chotas levantou-se e estendeu a mão. -Epharisto. Não lhe sei dizer o quanto estou agradecido.
Peter Demonides sorriu. -Parakalo. Fica-me a dever urn.
Umahora depois, um mensageiro fardado apareceunos escritórios da Corporação do Comércio Helénico. Aproximou-se de uma das secretárias.
-Trago uma encomenda para o senhor Demiris. - Eu assino.
-Tenho ordens para entregar ao senhor Demiris pessoalmente. -Desculpe, mas não posso interrompê-lo. Quem é que manda a encomenda?
-Napoleon Chotas.
- Tem a certeza de que não pode simplesmente deixá-la aqui? -Tenho, minha senhora.
-Vou ver se o senhor Demiris quer recebê-la. Premiu o botão do intercomunicador.
-Desculpe, senhor Demiris. Está aqui um mensageiro com uma encomenda do senhor Chotas para si.
Avoz de Demiris surgiu no intercomunicador. -Traga cá, Irene.
- Ele diz que tem ordens para entregar pessoalmente. Houve uma pausa.
-Traga-o cá dentro.
Irene e o mensageiro entraram no gabinete. - 0 senhor Constantin Demiris ?
- Sou.
-Assina-me isto, por favor?
Demiris assinou um talão. 0 mensageiro colocou o envelope na secretária de Demiris.
-Obrigado.
Constantin Demiris seguiu a saída da secretária e do mensageiro. Estudou o envelope, de rosto pensativo, depois abriu-o. Havia um gravador no interior, com uma fita dentro, Curioso, premiu um botão e a fita começou a tocar. A voz de Napoleon Chotas invadiu a sala.
-Meu caro Costa: Tudo teria sido mais simples se vocë tivesse acreditado que Frederick Stavros não fazia tenções de revelaro nosso pequeno segredo. 0 que mais me custa é que vocë não tivesse acreditado que eu não fazia tenções de falar sobre esse assunto incómodo, Tenho todas as razões para pensar que você esteve por detrás da morte do pobre Stavros, e que é agora sua intenção mandar matar-me. Como a minha vida me é tão preciosa quanto a sua para si, devo respeitosamente declinar ser a sua próxima vítima... Tomei a precaução de escrever os pormenores do papel que nós os dois desempenhámos no julgamento de Noelle Page e Larry Douglas, e coloquei-os num envelope selado que entreguei ao advogado de acusação para ser aberto em caso da minha morte acidental. De forma que é agora do seu interesse, meu amigo, cuidar que eu fique vivo e bem. -Afita terminou. Constantin Demiris deixou-se ficar, a olhar o vazio, Quando Napoleon Chotas regressou ao escritório nessa tarde, o medo tinha-o abandonado. Constantin Demiris era um homem perigoso, mas estava longe de ser um idiota. Não ia prejudicar ninguém sob pena de pôr em perigo a suaprópria pessoa. «Ele fez o lance>•, pensou Chotas, «e eu dei-lhe xeque-mate.•• Ele sorriu para si. «Acho que tenho de fazer outros planos para o jantar de quinta-feira.» Nos dias que se seguiram, Napoleon Chotas esteve atarefado a preparar-se para um novo julgamento de homicídio envolvendo uma mulher que matara as duas amantes do marido. Chotas levantava-se cedo todas as manhãs e trabalhava até altas horas da noite, preparando as suas contra-interrogações. 0 instinto dizia-lhe que-contratodas as probabilidades-iriavencer de novo. Na quarta-feira à noite, trabalhou no escritório até à meia-noite e depois foi para casa. Chegou à uilla à uma da manhã. 0 mordomo cumprimentou-o à porta.
-Deseja alguma coisa, senhor Chotas? Posso preparar-lhe uns mezedes se estiver com fome, ou...
-Não, obrigado. Estou bem. Vá-se deitar.
Napoleon Chotas subiu para o quarto. Passou a hora seguinte a rever mentalmente o julgamento, finalmente às duas da manhã, adormeceu. Sonhou. Estava no tribunal, a contra-interrogar uma testemunha, quando a testemunha repentinamente começou a rasgar a própria roupa. -Par que está a fazer isso? - Chotas perguntou.
- Estou a morrer de calor.
Chotas correu o olhar pela sala de audiências apinhada de gente e viu que todos os espectadores estavam a despir-se.
Voltou-se para o juiz.
- Meritíssimo, devo protestar contra... 0 juiz estava a tirar a toga.
- Está muito calor aqui dentro - disse ele. «Está quente aqui. E barulhento.p
Napoleon Chotas abriu os olhos. As chamas lambiam a porta do quarto e o quarto estava cheio de fumo. Napoleon sentou-se, acordando instantaneamente. «A casa está a arder. Por que é que o alarme não tocou?» A porta começava a empenar por causa do calor intenso. Chotas correu para a janela, engasgando-se com o fumo. Tentou abrir a janela à força, mas estava emperrada. 0 fumo estava a ficar espesso, e era cada vez mais difícil respirar, Não havia saída. As brasas em chama começaram a cair do tecto. Uma parede abateu e um lençol de chamas devorou-o. Ele gritava. 0 cabelo e o pijama estavam a arder. Às cegas, atirou-se contra a janela e atravessou-a, o seu corpo ardente estatelando-se no chão que ficava a cinco metros. Logo pela manhã do dia seguinte, uma criada conduziu o promotor público Peter Demonides ao escritório da residência de Constantin Demiris.