Demiris respirou fundo.
-No posso permitir que faça isso. Se um dia se viesse a descobrir que permiti o contrabando de drogas num dos meus barcos, poderia perder toda a minha frota,
-Mas não vai ser, pois não? No meu negócio não faço publicidade. Vamos fazê-lo sem nenhum alarido.
A expressão de Constantin Demiris endureceu.
-Você está a cometer um grande erro. Não pode fazer chantagem comigo. Sabe quem eu sou?
-Claro. Você é o meu novo sócio. Nós os doisvamosfazernegócios juntos pormuito tempo, Costa, porque, se você disser que não, vou daqui direitinho à polícia e aos jornais e digo tudo. E lá vão a sua reputação e a trampa do seu império para o fundo.
Seguiu-se um longo e doloroso silêncio.
- Como... como é que o meu cunhado descobriu? Rizzoli sorriu.
-Isso não importa. 0 que importa é que o trago preso pelos tomates. Se aperto, você vira um eunuco. Você vai ser um soprano profissional para o resto da vida e vai cantar numa cela prisional. -Tony Rizzoli olhou para o relógio. - Meu Deus, os meus dois minutos esgotaram-se. -Pôs-se de pé. -Vou dar-lhe sessenta segundos para decidir se saio daqui como seu sócio, ou se saio simplesmente.
Constantin Demiris de repente pareceu dez anos mais velho. 0 rosto estava lívido. Não tinha ilusões sobre o que aconteceria se a verdadeira história do julgamento viesse ao de cima. A imprensa ia comê-lo vivo. Seria retratado como um monstro, um assassino. Podiam até abrir inquéritos às mortes de Stavros e Chotas.
-Os seus sessenta segundos acabaram. Constantin Demiris sacudiu a cabeça lentamente. - Está bem - sussurrou ele -, está bem.
Tony Rizzoli sorriu triunfantemente para ele. -Você é esperto.
Constantin Demiris ergueu-se lentamente.
-Desta vez vou deixá-lo sair com o material -disse ele. -Não quero saber como ou quando iráfazê-lo. Vou pôr um dos seus homens a bordo de uns dos meus barcos. Não darei mais um passo.
-Combinado -disse Tony Rizzoli. Ele pensava: «Talvez não sejas tão esperto. Leva-me só um carregamento deheroína e estás apanhado, Costa. Nunca mais te vês livre de mim.» Em voz alta, repetiu. -Certo, está combinado.
Quando ia a caminho de regresso ao hotel, Tony Rizzoli estava exultante. «Bingo, Os agentes dos narcóticos nuncapensariam em tocar nafrota de Constantin Demiris. Meu Deus, de agora em diante po derei carregar todos os navios dele com destino para o estrangeiro. 0 dinheiro irá rolar. Heroína e velharias-desculpa, Victor, riu-se em voz alta-antiguidades.
Rizzoli entrou numa cabina telefónica da Avenida Stadiou e fez duas chamadas. A primeira foi para Pete Lucca em Palermo, -Podes tirar os teus dois gorilas daqui, Pete, e pô-los de volta no jardim zoológico, que é a casa deles. 0 material está pronto para seguir. Vai de barco.
-Tens a certeza de que a embalagem é segura? Rizzoli riu-se.
- É mais segura do que o Banco de Inglaterra. Conto-te tudo
quando estivermos juntos. E tenho outra boa notícia. De agora em diante vamos poder fazer um envio todas as semanas.
-Isso é maravilhoso, Tony. Eu sempre soube que podia contar contigo.
«Sabias o tanas, seu cabrão » A segunda chamada foi para Spyros Lambrou.
- Correu bem. Eu e o seu cunhado vamos fazer negócio juntos. - Parabéns. Estou encantado por saber disso, senhor Rizzoli. Quando Spyros Lambrou pousouo auscultador, sorriu. «Abrigada de narcóticos também.»
Constantin Demiris ficou no gabinete até depois da meia-noite, sentado à secretária, contemplando o seu novo problema. Tinha-se vingado de Noelle Page, e ela regressava agora do túmulo para persegui-lo. Meteu a mão numa gaveta e tirou um caixilho com o retrato de Noelle. «Oh, sua cabra. Deus, como era bela! Pensas então que me vais destruir. Bem, veremos. Veremos.» St. Moritz era um encantamento. Eram milhas de pistas de esqui colina abaixo, elevadores, passeios de trenó e tobog, torneios de pólo e uma dúzia de outras actividades. Enroscada em volta de um lago cintilante no vale de Engadine a mil e oitocentos metros de altitude na encosta dos Alpes, entre Celerina e Piz Nair, a pequena aldeia fez Catherine ofegar de deleite. Catherine e Kirk Reynolds registaram-se no fabuloso Hotel Palace. 0 salão estava cheio de turistas oriundos de uma dezena de países. Kirk Reynolds disse ao empregado da recepção:
-Uma reserva para senhor e senhora Reynolds.
Catherine desviou o olhar. «Eu devia ter posto uma aliança de casada.~Tinha a certeza de que todas as pessoas que estavam no salão olhavam fixamente para ela, sabendo o que ela estava a fazer.
-Sim, senhor Reynolds. Suite duzentos e quinze.-0 empregado entregou uma chave ao paquete, que lhes disse:
- Por aqui, por favor.
Foram levados para umasuite lindíssima, mobilada com simplicidade, com uma vïstaespectacular das montanhas de todas as janelas. Quando o paquete saiu, Kirk Reynolds tomou Catherine nos braços.
-Não tenho palavras para te dizer como me tornaste feliz, querida.
-Espero dar-te essafelicidade-respondeu Catherine.-Eu... já faz tanto tempo, Kirk.
-Não te preocupes. Não te vou apressar.
«Ele é tão querido, pensou Catherine, «mas que sentiria ele ameu respeito se eu lhe contasse o meu passado?» Ela nunca lhe falara de Larry, do julgamento por homicídio ou de nenhuma das coisas terríveis que lhe aconteceram. Queria sentir-se íntima dele, confiar nele, mas havia algo que a impedia.
- É melhor desfazer as malas - disse Catherine.
Desfez as malas lentamente-demasiado lentamente-e de repente apercebeu-se de que estava a empatar, com medo de acabar o que fazia porque receava o que ia acontecer a seguir. Do outro quarto ouviu Kirk chamar. - Catherine...
«Oh, meu Deus, ele vai dizer vamos despir-nos e vamos para a camaN. Catherine engoliu e disse em voz baixa: - Sim?
-Por que não vamos passear um pouco por aí~? Catherine enfraqueceu de alívio.
-É uma ideiamaravilhosa-disse ela entusiasticamente. «Que se passa comigo? Estou num dos lugares mais românticos do mundo, com um homem atraente que me ama, e estou em pânico?•>
Reynolds olhava-a de um modo estranho. - Estás bem?
- Óptima - disse Catherine alegremente. - Simplesmente óptima.
-Estás com um ar preocupado.
-Não. Eu... estava a pensar em.., em esquiar. Dizem que é perigoso.
Reynolds sorriu.
-Não te preocupes. Começamos com uma descida suave, amanhã, Vamos.
Vestiram camisolas e blusões forrados e saíram de encontro ao ar luminoso e revigoraste.
Catherine respirou fundo.
- Oh, é maravilhoso, Kirk. - Adoro isto aqui.
-E ainda não viste nada- deu um sorriso largo. -No Verão é duas vezes mais bonito.
«Será que ele no verão ainda me quer ver?N Catherine interrogava-se. «Ou será que eu vou ser um grande desapontamento para ele? Porque é que eu me preocupo tanto?~
Aaldeia de St. Moritz era encantadora, uma maravilha medieval, repleta de lojas, restaurantes e chalés exóticos, enquadrada no meio dos majestosos Alpes.
Deambularam pelas lojas, e Catherine comprou presentes para Evelyn e Wim. Pararam num pequeno café e mandaram vir um fondue.
À tarde, Kirk Reynolds alugou um trenó puxado por um cavalo baio, e percorreram os caminhos cobertos de neve até às colinas, a neve esmagando-se sob as sapatilhas de metal.
-Estás a gostar? -perguntou Reynolds.
-Oh, sim.-Catherine olhou para ele e pensou, «Voufazer-te tão feliz. Hoje à noite! Sim, hoje à noite. Vou fazer-te feliz hoje à noite.»
Nessa noite, jantaram no hotel em Stubli, um restaurante com a atmosfera de uma velha estalagem.
- Esta sala data de 1480 - disse Kirk. - Então é melhor não pedirmos o pão. - 0 quê?
-Uma pequena piada. Desculpa.
«0 Larry costumava perceber as minhas piadas; por que estou a pensar nele? Porque não quero pensar nesta noite. Pareço a Maria Antonieta a caminho da guilhotina. Não vou pedir bolo para sobremesa.»