0 palerma nunca mais se calava. -Sim, claro. Um dia.
- Dar-me-ia muito prazer. - No outro extremo da sala, Korontzis via a vitrina que continha o precioso vaso. Tinha de ver-se livre do guarda.
- Parece... que há um problema com o circuito do alarme na cave. Importa-se de verificar?
- Claro. Sei que algumas destas coisas são muito antigas... -Importa-se de ir verificar agora? Não quero sair antes de saber que tudo está a cem por cento.
- Certamente, senhor Korontzis. Volto já.
Victor Korontzis ficou ali, a observar o guarda atravessar o trio e encaminhar-se para a cave. Assim que desapareceu, Korontzis correu para a vitrina que continha a ânfora vermelha. Tirou uma chave e pensou, «vou mesmo fazê-lo. Vou roubá-la». A chave escorregou-lhe dos dedos e retiniu no chão.
«Será um sinal? Estará Deus a dizer-me alguma coisa?» Suava bastante. Dobrou-se e apanhou a chave, e fitou o vaso. Era absolutamente primoroso. Forafeito com um carinho tão grande pelos seus antepassados há milhares de anos atrás. O guarda tinha razão;era uma peça histórica, algo que nunca poderia ser substituído. Korontzis fechou os olhos por um instante e estremeceu. Olhou em redor para ter a certeza de que ninguém estava a ver, depois abriu a vitrina cuidadosamente e retirou o vaso. Tirou a réplica do saco de papel e colocou-a no lugar da peça genuína. Korontzis deixou-se ficar, analisando-a por um momento. Era urna reprodução perita, mas para ele ela gritava, «Falsificação». «Era tão óbvio. Mas só para mim», pensou Korontzis, «e só para mais alguns peritos.» Mais ninguém seria capaz de distinguir. E não haveria razão para alguém examiná-la atentamente. Korontzis fechou a vitrina e trancou-a, e pôs o vaso genuíno no saco de papel com o recibo. Tirou um lenço e limpou o rosto e as mãos. Estava feito. Olhou para o relógio: 6.10. Tinha de se despachar. Encaminhou-se para a porta e viu o guarda vir na sua direcção. Não consegui ver nada de errado no sistema de alarme, senhor Korontzis, e...
-Óptimo-disse Korontzis.-Não se pode ser demasiado cuidadoso.
0 guarda sorriu.
-Tem razão. Já de partida? -É verdade. Boa noite.
0 segundo guarda estava à porta da frente, preparando-se para sair.
Reparou no saco de papel e sorriu.
- Vou ter de verificar isso. Foi o senhor que ditou as regras.
- Claro - disse Korontzis apressadamente. Entregou o saco ao guarda.
0 guarda olhou para dentro, tirou o vaso e viu o recibo.
- É um presente para um amigo - explicou Korontzis. - Ele é engenheiro. -«Porque é que eu tinha de dizer isso? Ele está-se nas tintas! Tenho de agir de forma natural,
- É bonito. - 0 guarda deixou o vaso cair dentro do saco, e por um terrível instante Korontzis pensou que ia partir-se.
Korontzis apertou o saco contra o peito. -Kalispehra.
0 guarda abriu-lhe a porta. -Kalispehra.
Korontzis mergulhou no ar frio da noite, respirando pesadamente e combatendo a náusea. Tinha nas mãos algo que valia milhões de dólares, mas Korontzis não pensava nela nesses termos. Pensava é que estava a trair o seu país, ao roubar uma peça histórica da sua Grécia amada e vendê-la a um estrangeiro sem rosto. Desceu os degraus. Como Rizzoli prometera, um táxi aguardava-o à frente do museu. Korontzis caminhou na sua direcção e entrou.
- Hotel Grande Bretagne - disse.
Recostou-se no assento. Sentiu-se vencido e exausto, como se tivesse estado numa terrível batalha. Mas vencera ou perdera? Quando o táxi estacionou em frente do Hotel Grande Bretagne, Korontzis disse ao motorista:
- Espere aqui, por favor.
Deu um último olhar para o precioso pacote que estava no banco traseiro, depois saiu e entrou rapidamente no salão do hotel. Ao passar a porta voltou-se e olhou. Um homem entrava no táxi. Um momento depois partiu veloz. pronto. Estava feito. Nuncaterei de fazersemelhante coisa outra vez, pensou Korontzis. Não enquanto for vivo. 0 pesadelo acabou.» Às três horas de domingo à tarde, Tony Rizzoli saiu do hotel e deambulou até à Platia Omonia. Vestia um casaco xadrez vermelho-vivo, calças verdes e uma boina vermelha. Era seguido por dois detectives. Um deles disse:
-Ele deve ter comprado aquelas roupas num circo.
Na Rua Metaxa, Rizzoli mandou parar um táxi. 0 detective falou para o cualkie-talkie. 0 sujeito está a entrar num táxi com direcção para oeste.
Umavoz respondeu:
- Estamos a vê-lo. Vamos seguir. Regresse ao hotel. -Certo.
Um turismo cinzento sem marca aproximou-se do táxi, mantendo uma distância discreta. 0 táxi rumou para sul, atravessando Monastiraki. No turismo, o detective que se sentava ao lado do motorista pegou no microfone. -Central, Aqui é aUnidade quatro. 0 sujeito está num táxi. Está a descer a Rua Philhellinon... Espere. Acabam de virar à direita na Rua Peta. Parece que vaiem direcção à Plaka. Podemos perdê-lo. Pode mandar um piquete segui-lo a pé?
- S6 um minuto, Unidade quatro. -Alguns segundos depois, o rádio voltou a estalar.-Unidade quatro. Temos ajuda disponível. Se ele descer na Plaka, continuará a ser vigiado.
-Kala. 0 sujeito veste um casaco xadrez vermelho-vivo, calças verdes e uma boina vermelha. É difícil de perder. Espere um minuto. 0 táxi vai parar. Ele está a sair na Plaka.
-Vamos passar a informação. Está coberto. Você fica livre. Desligue.
Na Plaka, dois detectives observavam no momento em que o homem saía do táxi.
-Onde é que ele comprou aquela roupa?-interrogou-se um dos detectives em voz alta.
Aproximaram-se dele e começaram a segui-lo por entre o labirinto apinhado da parte velha da cidade. Durante a hora que se seguiu ele vagueou sem destino por entre as ruas, deambulando por tabernas, bares, lojas de recordações e pequenas galerias de arte. Desceu a Anaphiotika e percorreu uma feira da ladra repleta de espadas, adagas, mosquetes, caçarolas, candelabros, candeeiros a petróleo e binóculos.
- Que andará ele a tramar?
- Parece que veio apenas dar um passeio. Espera. Lá vai ele. Eles iam atrás quando ele virou para a Aghiou Geronda e se dirigiu ao restaurante Xinos. Os dois detectives ficaram no exterior à distância, vendo-o pedir a comida.
Os detectives começaram a ficar aborrecidos.
-Espero que ele não se demore muito. Apetecia-me ir para casa. Uma soneca agora sabia-me bem.
-Mantém-te acordado. Se o perdemos, o Nicolino dá-nos cabo da vida.
- Como é que podemos perdê-lo? Ele parece um farol. 0 outro detective olhava-o fixamente.
- 0 quê? 0 que é que tu disseste? -Eu disse...
-Não ligues. -Houve uma urgência repentina na sua voz.-Tu olhaste para a cara dele?
-Não.
-Eu também não. Tiflo! Anda daí.
Os dois detectives entraram no restaurante a correr e dirigiram -se para a mesa a passo largo. Estavam a olhar para o rosto de um completo estranho. 0 Inspector Nicolino estava furioso.
- Eu tinha três equipas destacadas para seguirem o Rizzoli. Como é que vocês puderam perdê-lo?
-Ele pregou-nos uma partida, inspector. Aprimeira equipaviu~ entrar num táxi e...
-E eles perderam o táxi?
-Não. Nós vimo-lo sair. Ou pelo menos pensávamos que era ele. Ele estava com uma roupa espampanante. 0 Rizzoli tinha outro passageiro escondido no táxi, e os dois homens trocaram de roupa. Nós fomos atrás do homem errado.
-E o Rizzoli continuou no táxi. - É verdade.
-Tiraram a matrícula?
-Bem, não. Não... não nos pareceu importante. -E o homem que vocês apanharam?
-É um paquete do hotel do Rizzoli. 0 Rizzoli disse-lhe que estava a pregar uma partida a uma pessoa. Deu-lhe cem dólares. É tudo 0 que o rapaz sabe.
0 inspector Nicolino respirou fundo.
-E não me parece que alguém saiba onde se encontra o senhor Rizzoli neste momento.
-Não, senhor. Infelizmente não.