Ele sacudiu a cabeça.
- É um carro pequeno. Vou tratar das coisas.
Os visitantes de Atenas eram exigentes, e Catherine viu-se com muito pouco tempo para si própria. Haley, Renard e Mattusi tinham tido várias reuniões com Wim Vandeen, e Catherine achava piada à maneira como as suas atitudes se haviam alterado.
- Ele faz tudo sem calculadora - disse Haley maravilhado. - É verdade.
- Nunca vi nada parecido.
Catherine estava impressionada com Atavas Stavich. 0 rapaz era o trabalhador mais esforçado que ela conhecera. Ele já estava no escritório quando Catherine chegava de manhã, eficavalá depois de todos os outros saírem. Estava sempre a sorrir e ansioso por agradar. Fazia lembrar a Catherine um cachorrinho agitado. Algures no seu passado, alguém o tratara muito mal. Catherine resolveu falar de Atavas a Alan Hamilton. «Tem de haverumamaneira de construir a sua autoconfiança, pensou Catherine. «Estou certa de que o Alan o poderia ajudar.»
- Sabes que o garoto está apaixonado por ti, não sabes? - disse Evelyn um dia.
- De que é que estás a falar?
-Do Atavas. Não viste o olhar de adoração nos olhos dele? Ele segue-te como se fosse uma ovelha tresmalhada.
Catherine riu-se. - Estás a exagerar. Num impulso, Catherine convidou Atavas para almoçar.
-Num.. num restaurante? Catherine sorriu.
- Sim, claro.
0 rosto dele corou.
- Não... não sei, Miss Alexander. Baixou os olhos pela roupa imprópria.
-A senhora sentiria vergonha de ser vista na minha companhia. -Eu não julgo as pessoas pela roupa que vestem -disse Catherine com firmeza. -Vou tratar da reserva.
Levou Atavas a almoçar ao Lyons Corner House. Ele sentou-se à frente dela, espantado com o ambiente.
-Nunca estive num lugar como este. É tão bonito. Catherinef cou sensibilizada.
- Quero que peças tudo o que te apetecer. Ele analisou a ementa e abanou a cabeça. -É tudo tão caro.
Catherine sorriu.
-Não te preocupes com isso, Tu e eu trabalhamos para um homem muito rico. Tenho a certeza de que ele gostaria que nós comêssemosuma boa refeição.-Não lhe disse que quem ia pagar seria ela.
Atavas pediucocktail de camarão e salada, um frango assado com batata frita e terminou a refeição com bolo de chocolate com gelado. Catherine viu comer espantada. Ele tinha uma estrutura tão pequena.
- Onde é que metes isso tudo? Atavas disse envergonhado: -Eu não engordo,
- Gostas de Londres, Atavas?
Ele fez um sinal afirmativo com a cabeça. -Do que vi gostei muito. -Trabalhavas como paquete em Atenas? Disse que sim com a cabeça.
- Para o senhor Demiris.-Houve uma nota de amargura na sua voz.
- Não gostaste?
-Desculpe-me... não sou eu quem deve dizer, mas o senhor Demiris não me parece boa pessoa. Eu... não gosto dele.-Ojovem olhou emvolta num relance como se alguém o tivesse ouvido sem querer.Ele... não importa, Catherine pensou que era melhor não perguntar mais.
- 0 que é que te fez decidir vir para Londres, Atavas?
Atavas disse qualquer coisa tão baixinho que Catherine não conseguiu ouvi-lo.
-Como?
- Eu quero ser médico. Ela olhou para ele, curiosa. -Médico?
-Sim, senhora. Sei que parece uma parvoíce.-Hesitou, depois prosseguiu. -A minha família é de Macedónia e toda a minha vida ouvi histórias sobre os turcos que entravam na nossa aldeia para matar e torturar o nosso povo. Não havia médicos para ajudar os feridos. Agora, a aldeia já não existe e a minha família foi exterminada. Mas ainda há muitas pessoas feridas no mundo, Eu quero ajudá-Ias. - Baixou os olhos, embaraçado. -A senhora deve pensar que eu sou maluco.
-Não – disse Catherine num tom calmo.-Acho que isso é maravilhoso. Então tu vieste para Londres com o intuito de estudar medicina?
- É verdade. Vou trabalhar de dia e estudar de noite. Vou ser médico.
Havia um toque de determinação naquela voz. Catherine fez um sinal afirmativo com a cabeça.
-Acredito que sim.
-Havemos de falar mais sobre isso, nós os dois. Tenho um amigo que te poderá ajudar. E conheço um restaurante maravilhoso onde poderemos almoçar na semana que vem.
À meia-noite, uma bomba explodiu na villa de Spyros Lambrou. A explosão destruiu a frente da casa e matou dois criados. 0 quarto de Spyros Lambrou ficou destruído, e ele sobreviveu simplesmente porque à última hora ele e a mulher mudaram de planos e decidiram ir a um jantar oferecido pelo presidente da Câmara de Atenas. Na manhã seguinte, chegou ao seu escritório uma nota que dizia «Marte aos capitalistas». Estava assinado. Partido Revolucionário Helénico.
-Por que te fariam eles uma coisa deste género? -perguntou Melina horrorizada.
-Não foram eles - disse Spyros bruscamente. - Foi o Costa. -Tu... não tens provas.
-Não preciso de provas nenhumas. Ainda não percebeste com quem estás casada?
-Não sei o que pensar.
-Melina, enquanto esse homem for vivo, nós os dois estaremos em perigo. Nada o deterá.
-Não podes ir à polícia?
- Tu própria o disseste. Não tenho provas. Eles iam rir-se na minha cara. -Ele tomou as mãos dela nas suas. -Quero que saias daqui. Por favor. Vai para o lugar mais longe possível.
Ela deixou-se ficar durante muito tempo. Quando por fim falou, foi como se tivesse tomado uma decisão de grande importância. -Muito bem, Spyros. Farei o que devo fazer.
Ele abraçou-a.
-Óptimo. E não te preocupes. Arranjaremos um meio de impedi-lo.
Melina ficou no quarto durante a longa tarde, a sua mente tentando aceitar o que estava a acontecer. Era verdade, o marido falara a sério quando ameaçara destruí-la a ela e ao irmão. Ela não podia deixar que ele concretizasse essaameaça. E, se as suas vidas estavam em perigo, também estava a vida de Catherine Douglas. «Ela vai trabalhar para mim em Londres. Eu vou adverti-la», pensou Melina. «Mas preciso de fazer mais do que isso. Preciso de destruir o Costa. Preciso de impedi-lo que faça mal a outras pessoas. Mas como?» E foi então que lhe surgiu a resposta. «Claro!», pensou ela. «E a única maneira. Porque é que não pensei nisso antes?»
C: Desculpe o atraso, Alan. Houve uma reunião de última hora no escritório.
A: Não há problema. A delegação de Atenas ainda está em Londres?
C: Está. Eles... estão a pensar partir no fim da semana que vem.
A: Você parece aliviada. Eles têm sido difíceis?
C: Não propriamente difíceis, só que tenho uma sensação estranha em relação a eles.
A: Estranha?
C: Édifícilexplicar.Podeparecerparvoíce,mas...háalgodeesquisito em todos eles.
A: Eles fizeram alguma coisa que...?
C: Não. Apenas me deixam pouco à vontade. A noite passada, voltei a ter o pesadelo.
A: Aquele sonho em que algum tentava afogá-la?
C: Sim. Não tinha esse sonho há uns tempos, E desta vez foi diferente.
ARQUIVO CONFIDENCIAL Transcrição da Sessão com Catherine Douglas
A: De que maneira?
C: Era mais... real. E não terminou onde terminara antes.
A: Foi além do momento em que algum tentava afogá-la?
C: Sim. Estavam a tentar afogar-me e de repente eu estava num lugar seguro.
A: No convento?
C: Não tenho a certeza. Podia ter sido. Era um jardim. E apareceu um homem para me ver. Acho que já sonhei com qualquer coisa assim antes, mas só que desta vez eu pude ver-lhe o rosto.
A: Reconheceu-o?
C: Sim. Era o Constantin Demiris.
A: Portanto, no seu sonho...
C: Alan, não foi apenas um sonho. Foi uma recordação verdadeira. De repente lembrei-me que o Constantin Demiris me deu o alfinete de ouro que possuo.
A: Acreditaqueoseusubconscientelhetrouxeàmemóriaalgoque realmente aconteceu? Tem a certeza de que não era...
C: Eu conheço-o. 0 Constantin Demiris deu-me esse alfinete no convento.
A: Disse que foi salva do lago por umas freiras que a recolheram no convento?
C: É verdade.
A: Catherine, alguém sabia que esteve no convento? C: Não, acho que não.