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- Foi, sim. E ela disse que se não estivesse de volta pelas seis horas eu devia chamar a polícia.

-Houve uma reacção visível por parte do júri. Viraram-se para fixar o olhar em Demiris.

-Não tenho mais perguntas.-Delma voltou-se para Chotas.A testemunha é sua.

Napoleon Chotas moveu a cadeira para junto do banco das testemunhas.

- 0 seu nome é Andrea, não verdade?

-É, sim. -Ela tentou não olhar para o rosto cicatrizado e desfigurado.

-Andrea, você afirmou que ouviu a senhora Demiris dizer ao marido que ia pedir o divórcio e que ouviu o senhor Demiris dizer que não Iho dava, e que ele lhe disse aela quefosse à casa de praia àstrêshoras e que fosse sozinha. Está certo?

- Está, sim.

- Você está sob juramento, Andrea. Você não ouviu nada disso. - Ouvi, sim, senhor doutor.

- Quantos telefones há no quarto onde a conversa se verificou? -Bem, apenas um.

Napoleon Chotas aproximou a cadeira.

-Portanto, você não estava a ouvir a conversa noutro aparelho? - Não, senhor. Eu nunca faria uma coisa dessas.

-Então, a verdade é que apenas ouviu o que a senhora Demiris disse. Ter-lhe-ia sido impossível ouvir o que marido dizia?

- Oh. Bem, suponho...

-Por outras palavras, você não ouviu o senhor Demiris ameaçar a esposa ou pedir-lhe que se encontrasse com ele na casa de praia, nem nada. Você imaginou tudo isso por causa daquilo que a senhora Demiris estava a dizer?

Andreaestavaatrapalhada.

- Bem, suponho que o senhor pode pôr as coisas nesses termos, -Eu estou a pôr as coisas nesses termos. Porque é que estava no quarto quando a senhora Demiris estava ao telefone?

-Ela pediu-me que lhe levasse um pouco de chá. - E a senhora levou-o?

- Levei, sim.

-Pô-lo em cima de uma mesa. -Pus, sim.

-Porque não se retirou em seguida? -A senhora fez sinal para que eu ficasse.

-Ela queria que você ficasse a ouvir a conversa ou a presumível conversa?

-Eu... suponho que sim.

A voz dele era uma correia de chicote.

-Portanto, não sabe se ela estava a falar com o marido ao telefone ou se, de facto, não estava afalar com ninguém.-Chotas aproximou ainda mais a cadeira. -Não acha estranho que, a meio de uma con versa pessoal, a senhora Demiris lhe pedisse que ficasse a escutar? Sei que em minha casa quando estamos a ter uma discussão pessoal não pedimos ao pessoal que fique abisbilhotar. Não. Digo-lhe a si que essa conversa nunca existiu. A senhora não estava a falar com ninguém. Estava a tramar o marido para que neste dia neste tribunal ele fosse a julgamento. Mas Constantin Demiris não matou amulher. As provas contra ele foram cuidadosamente tramadas. Foram tramadas com cuidado excessivo. Nenhum homem inteligente deixaria atrás uma série de pistas óbvias que o incriminariam. E, independentemente de tudo aquilo que Constantin Demiris possa ser, ele é um homem inteligente. Ojulgamento prolongou-se pormais dez dias com acusações e contra-acusações, e depoimentos peritos da polícia e do médico-legista. 0 consenso de opinião apontava para que Constantin Demiris fosse provavelmente culpado. Napoleon Chotas guardou a bomba até o fim. Pôs Spyros Lambrou nobanco das testemunhas. Antes do início do julgamento, Demiris assinara um contrato reconhecido em cartório transferindo por meio de escritura a Corporação do Comércio Helénico e todos os seus bens a Spyros Lambrou. Um dia antes, esses bens foram secretamente transferidos para Napoleon Chotas com a cláusula de que só teria efeito se Constantin Demiris fosse absolvido do seu julgamento.

-Senhor Lambrou. 0 senhor e o seu cunhado, Constantin Demiris, não se davam muito bem, pois não?

-É verdade.

- De facto, não seria exagero dizer-se que os senhores se odiavam?

Lambrou olhou para Constantin Demiris.

-Podia até ser uma maneira branda de pôr a questão.

-No dia em que a suairmã desapareceu, ConstantinDemiris disse à polícia que nunca esteve nas imediações da casa de praia; que, de facto, às três horas, a hora fixada para a morte da sua irmã, ele estava reunido consigo em Acrocorinto. Quando a polícia o interrogou acerca do encontro, o senhor negou.

-Neguei, sim. - Porquê?

Lambrou permaneceu em silêncio por um longo momento. A sua voz estava cheia de raiva.

-Demiris tratava a minha irmã de uma forma vergonhosa. Maltratava-a e humilhava-a constantemente.

- Eu queria vê-lo castigado. Ele precisava de mim para ter um álibi.

- Eu não lhe queria dar. - E agora?

-Não posso continuar a viver com urna mentira. Sinto que tenho de dizer a verdade.

-0 senhor e Constantin Demiris encontraram-se em Acrocorinto nessa tarde?

-Sim, a verdade é que nos encontrámos.

Houve uma algazarra na sala de audiências. Delma pôs-se de pé, o rosto pálido.

-Meritíssimo. Protesto... -Protesto negado.

Delma afundou-se no seu lugar. Constantin Demiris estava inclinado para a frente, com os olhos brilhantes.

- Fale-nos do vosso encontro. A ideia foi sua?

-Não. A ideia foi de Melina. Ela enganou-nos a ambos. -Enganou-os, como?

A Melina telefonou-me a dizer que o marido queria encontrar-se comigo no meu pavilhão de caça para discutir uma transacção comercial. Depois telefonou ao Demiris a dizer-lhe que eu pedira um encontro. Quando chegámos, descobrimos que não tínhamos nada para dizer um ao outro.

- E o encontro realizou-se a meio da tarde na hora fixada da morte da senhora Demiris ?

-É verdade.

-São quatro horas de viagem de Acrocorinto até à casa de praia. Mandei verificar o espaço de tempo. -Napoleon Chotas olhava para o júri. -Deforma que não há possibilidade de Constantin Demiris poder ter estado em Acrocorinto às sete e regressado a Atenas antes das sete.

Chotas voltou-se para Spyros Lambrou.

-0 senhor está sob juramento, senhor Lambrou. 0 que acabou de dizer neste tribunal corresponde à verdade?

-Sim. Tomo Deus por testemunha.

0 júri ausentou-se durante quatro horas. Constantin Demiris observava o seu regresso à sala de audiências. Tinha um ar pálido e ansioso. Chotas não estava a olhar para o júri. Olhava para o rosto de Constantin Demiris. 0 aprumo e a arrogância de Demiris haviam desaparecido. Era um homem que enfrentava a morte. 0 juiz-presidente perguntou:

-0 júri já chegou a um veredicto?

- Chegámos, sim, Meritíssimo. - 0 primeiro jurado segurava um pedaço de papel.

- 0 oficial de justiça que vá buscar o veredicto, por favor.

0 oficial de justiça caminhou até ao jurado, pegou no pedaço de papel e entregou-o ao juiz. Ele abriu o papel e ergueu o olhar.

- 0 júri considera o réu inocente.

Houve um pandemónio na sala de audiências. As pessoas começavam a levantar-se, algumas aplaudindo, outras assobiando. A expressão no rosto de Demiris era de êxtase. Respirou fundo, levantou-se e caminhou na direcção de Napoleon Chotas.

-Você conseguiu -disse ele. -Fico em grande dívida consigo. Chotas olhou-o bem de frente.

-Já não. Eu sou muito rico e você é muito pobre. Venha. Vamos celebrar.

Constantin Demiris empurrou a cadeira de rodas por entre a multidão que se acotovelava, longe dos repórteres até ao parque de estacionamento. Chotas apontoupara um turismo estacionado à entrada. - 0 meu cano está ali.

Demiris empurrou-o até à porta. -Não tem motorista?

-Não preciso. Mandei equipar o carro de forma a poder conduzi-lo eu próprio. Ajude-me a entrar. Demiris abriu a porta e levou Chotas até ao lugar do condutor, Demiris entrou no carro sentando-se ao lado de Chotas.

-Você ainda é o maior advogado do mundo-Constantin Demiris sorriu.

-É verdade. -Napoleon Chotas meteu a primeira e começou a conduzir. - Que vai fazer agora, Costa?

Demiris disse cuidadosamente

- Oh, herde safar-me. NCom um milhão de dólares posso reconstruir o meu império. Demiris deu um risinho de satisfação.-0 Spyros vai ficar muito chateado quando souber que você o enganou.

-Ele não pode fazernada-assegurou-lhe Chotas.-0 contrato que ele assinou dá-lhe uma companhia que não vale nada. Eles dirigiam-se para as montanhas. Demiris observava enquanto Chotas movia as alavancas que controlavam o acelerador e o travão.