IAN FLEMING
MOSCOU CONTRA 007
TRADUÇÃO DE
MARIA EUGENIA DE SOUSA PACHECO
TÍTULO DO ORIGINAL INGLÊS: FROM RÚSSIA WITH LOVE
Copyright by PETER JANSON-SMITH LTD.
LONDON — ENGLAND
Todos os direitos reservados pela "BESTSELLER" — Importadora de Livros S. A.
1960.
Índice
NOTA DO AUTOR
PRIMEIRA PARTE
Capítulo 1 — VILA DAS ROSAS
Capítulo 2 — O SANGUINÁRIO
Capítulo 3 — CURSO DE APERFEIÇOAMENTO
Capítulo 4 — OS POTENTADOS DA MORTE
Capítulo 5 — "KONSPIRATSIA”
Capítulo 6 — AUTORIZAÇÃO DE MORTE
Capítulo 7 — O MAGO DE GELO
Capítulo 8 — 0 BELO CHAMARIZ
Capítulo 9 — UMA TAREFA AMOROSA
Capítulo 10 — O RASTILHO PEGA FOGO
SEGUNDA PARTE
Capítulo 11 — VIDA SEDENTÁRIA
Capítulo 12 — UMA DÁDIVA DOS DEUSES
Capítulo 13 — SEGUIRÁ PELA B. E. A....
Capítulo 14 — DARKO KERIM
Capítulo 15 — O PASSADO DE UM ESPIÃO
Capítulo 16 — O TÚNEL DOS RATOS
Capítulo 17 — HORA DE MATAR
Capítulo 18 — SENSAÇÕES FORTES
Capítulo 19 — A BOCA DE MARILYN MONROE
Capítulo 20 — NEGRO SOBRE ROSA
Capítulo 21 — EXPRESSO DO ORIENTE
Capítulo 22 — FORA DA TURQUIA
Capítulo 23 — FORA DA GRÉCIA
Capítulo 24 — FORA DE PERIGO?
Capítulo 25 — UMA GRAVATA COM NÓ À WINDSOR
Capítulo 26 — A GARRAFA DA MORTE
Capítulo 27 — CINCO LITROS DE SANGUE
Capítulo 28 — “LA TRICOTEUSE”
NOTA DO AUTOR
Embora isto não seja essencial, os dados em que se baseia esta história são, em grande parte, verídicos.
A SMERSH, contração de Smiert Spionam (Morte aos Espiões), existe e é, até hoje, o mais secreto departamento do governo soviético.
No início de 1956, quando este livro foi escrito, os componentes da SMERSH, na pátria e no exterior, eram cerca de 40.000, tendo como chefe o General Grubozaboyschikov. Minha descrição do seu aspecto é fiel.
Atualmente, o quartel-general da SMERSH está onde o localizei no capítulo 4: Sretenka Ulitsa, n.° 13, Moscou. A sala de conferências é fielmente descrita e os chefes do Serviço Secreto, reunidos em torno da mesa, são oficiais que realmente existem e que são frequentemente convocados para fins semelhantes aos que narrei.
PRIMEIRA PARTE
O PLANO
Capítulo 1 — VILA DAS ROSAS
O homem despido que jazia de bruços ao lado da piscina poderia estar morto.
Poderia ter sido afogado, pescado para fora da piscina e deixado sobre a grama para secar, enquanto a polícia ou os parentes mais próximos fossem avisados. Até mesmo a pequena coleção de objetos, sobre a grama, ao lado de sua cabeça, podia ser de seu uso pessoal, posta bem à vista, com todo o cuidado, a fim de que ninguém pensasse que algo havia sido subtraído pelos seus salvadores.
A julgar-se pela faiscante coleção, ele fora, ou era, um homem rico. Ela continha os célebres distintivos dos clubes frequentados por homens de posse: um prendedor de notas, feito de uma moeda mexicana de cinquenta dólares e contendo substancial quantidade de cédulas; um isqueiro Dunhill já bem usado; uma cigarreira de ouro, de formato oval, com os desenhos sinuosos e o discreto botão de turquesa que identificam a marca Fabergé; e a espécie de livro que um homem rico tira da estante para acompanhá-lo num passeio ao jardim: "A Pequena Pepita", velha obra de P. G. Wodehouse. Havia também um volumoso relógio de pulso, de ouro, montado numa pulseira de crocodilo bem gasta. Era um modelo Girard-Perregaux, desenhado para pessoas que gostam de usar objetos requintados: tinha um ponteiro de segundos e duas pequenas janelas no mostrador, para indicar o dia, o mês e a fase da lua. Nesse instante marcava duas horas e trinta minutos do dia 10 de junho, lua em quarto crescente.
Uma varejeira surgiu dentre as touceiras de rosas, no fundo do jardim, e pairou no ar algumas polegadas acima da base da espinha dorsal do homem. Fora atraída pelo brilho dourado do sol de junho, sobre a fileira de finos cabelos louros no pescoço. Uma rajada de vento soprou do mar. A pequena massa de cabelos agitou-se levemente. A varejeira desviou-se nervosamente para o lado e pairou, olhando para baixo, sobre o ombro esquerdo do homem. A grama, embaixo da boca aberta, agitou-se. Uma grande gota de suor deslizou pelo lado do volumoso nariz e caiu brilhando na grama. Foi o suficiente. A varejeira desapareceu entre as rosas e sobre os cacos de vidro no topo do alto muro do jardim. Aquilo, que podia ter servido de bom alimento, movia-se.
O jardim no qual jazia o homem consistia em coisa de um acre de gramados bem cuidados, cercados em três lados por espessas touceiras de rosas, das quais vinham um contínuo zumbido de abelhas. Além do enlanguescente murmúrio das abelhas, o ronco do mar fazia-se ouvir mansamente na base dos rochedos, ao terminar o jardim.
Dali não se via o mar: não se via nada além do céu e das nuvens acima do muro de quatro metros. Na realidade, só se podia ver o exterior dos dois dormitórios no andar superior da vila que formava o quarto lado dessa propriedade tão recôndita. Avistava-se deles uma grande massa de água, à frente, ladeada pelas janelas superiores das vilas vizinhas e pelo topo das árvores nos gramados: cedros do Mediterrâneo, pinheiros, casuarinas e uma ou outra palmeira.
A vila era moderna: um edifício baixo em forma de caixote, sem ornamentos. No lado do jardim, a fachada lisa e cor de rosa ostentava quatro janelas com molduras de grade e uma porta central de vidro, que conduzia a um pequeno quadrilátero de ladrilhos esverdeados. Os ladrilhos confundiam-se com o gramado. O outro lado da vila, a algumas jardas de uma estrada poeirenta, era quase idêntico. Mas, desse lado, as quatro janelas eram gradeadas e a porta central era de cedro.
A vila tinha dois dormitórios, de tamanho regular, no andar de cima e, no inferior, uma sala-de-estar e uma cozinha que lhe dividia a extensão com um lavabo. Não havia banheiro.
O silêncio dormente e repousante da tarde foi quebrado pelo ruído de um carro que vinha pela estrada. Parou em frente à vila. Ouviu-se o som metálico de uma porta que se fecha e depois, ele prosseguiu. A campainha da porta tocou duas vezes. O homem despido, ao lado da piscina, não se moveu, mas, ao som da campainha, seus olhos se abriram por um instante: parecia que se punham alerta, como as orelhas de um animal. O homem lembrou-se imediatamente onde estava, do dia da semana e das horas do dia. Os ruídos foram identificados. As pálpebras orladas por pestanas curtas e louras caíram sonolentas sobre os olhos azuis-claros, opacos e introspectivos. Os lábios pequenos e cruéis abriram-se num vasto bocejo que encheu a boca de saliva. O homem cuspiu-a na grama e esperou.
Uma jovem, carregando uma pequena bolsa trançada, vestida com uma blusa branca e uma saia azul curta e sem atrativos, entrou pela porta de vidro e dirigiu-se num passo masculino através dos ladrilhos e da grama em direção ao homem despido. A alguns metros dele, pousou a bolsa de fibra sobre a grama, sentou-se e descalçou os sapatos baratos e poeirentos. Depois, levantou-se. Desabotoou a blusa e tirou-a, colocando-a bem dobrada ao lado da bolsa.