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«Maktub», pensou o rapaz.

O Inglês levantou-se de onde estava sentado e sacudiu o rapaz.

— Vamos, pergunte a ela!

O rapaz se aproximou da moça. Ela tornou a sorrir. Ele sorriu também.

— Como você se chama? — perguntou.

— Me chamo Fátima — disse a moça, olhando para o chão.

— É um nome que algumas mulheres tem na terra de onde venho.

— É o nome da filha do Profeta — disse Fátima. — Os guerreiros os levaram para lá.

A moça delicada falava de guerreiros com orgulho. Ao seu lado o Inglês insistia, e o rapaz perguntou pelo homem que curava todas as doenças.

— É um homem que conhece os segredos do mundo. Conversa com os djins do deserto — ela falou.

Os djins eram os demónios. E a moça apontou para o sul, para o lugar onde aquele estranho homem morava.

Depois encheu seu cântaro e partiu.

O Inglês partiu também, em busca do Alquimista. E o rapaz ficou por muito tempo sentado ao lado do poço, entendendo que algum dia o Levante havia deixado em seu rosto o perfume daquela mulher, e que já la amava antes mesmo de saber que ela existia, e que seu amor por ela faria com que encontrasse todos os tesouros do mundo.

No dia seguinte o rapaz voltou para o poço, para esperar a moça. Para sua surpresa, encontrou lá o Inglês, olhando pela primeira vez o deserto.

— Esperei a tarde e a noite — disse o Inglês. — Ele chegou junto com as primeiras estrelas. Eu lhe contei o que estava procurando. Então ele me perguntou seja havia transformado chumbo em ouro. Eu disse que era isto que queria aprender.

«Ele me mandou tentar. Foi tudo que me disse: vá tentar».

O rapaz ficou quieto. O Inglês havia viajado tanto para ouvir o que já sabia.

Aí ele se lembrou de que tinha dado seis ovelhas ao velho rei pela mesma razão.

— Então tente — disse para o Inglês.

— É isto que vou fazer. E vou começar agora.

Pouco depois que o Inglês saiu, Fátima chegou para apanhar água com seu cântaro.

— Vim dizer-lhe uma coisa simples — falou o rapaz. — Eu quero que você seja minha mulher. Eu te amo.

A moça deixou que seu cântaro derramasse a água.

— Vou esperá-la todos os dias aqui. Cruzei o deserto em busca de um tesouro que se encontra perto das pirâmides. A guerra foi para mim uma maldição. Agora ela é uma bênção, porque me deixa perto de você.

— A guerra um dia vai acabar — disse a moça.

O rapaz olhou as tamareiras do oásis. Havia sido pastor. E ali existiam muitas ovelhas. Fátima era mais importante que o tesouro.

— Os guerreiros buscam seus tesouros — disse a moça, como se estivesse adivinhando o pensamento do rapaz. — E as mulheres do deserto têm orgulho dos seus guerreiros.

Depois tornou a encher seu cântaro, e foi embora.

Todos os dias o rapaz ia para o poço esperar Fátima. Contou-lhe de sua vida de pastor, do rei, da loja de cristais.

Ficaram amigos, e com exceção quinze minutos que passava com ela, o resto do dia custava infinitamente a passar.

Quando já estava há quase um mês no oásis, o Líder da Caravana convocou a todos para uma reunião.

— Não sabemos quando a guerra vai acabar, e não podemos seguir viagem — disse.

— Os combates devem durar por muito tempo, talvez muitos anos. Existem guerreiros fortes e valentes de ambos os lados, e existe a honra de combater em ambos os exércitos. Não é uma guerra entre bons e maus. É uma guerra entre forças que lutam pelo mesmo poder, e quando este tipo de batalha começa, demora mais que as outras — porque Allah está dos dois lados.

As pessoas se dispersaram. O rapaz tornou a encontrar-se com Fátima aquela tarde, e contou da reunião.

— No segundo dia que nos encontramos — disse Fátima — você me falou do seu amor. Depois me ensinou coisas belas, como a Linguagem e a Alma do Mundo. Tudo isto me faz aos poucos ser parte de você.

O rapaz ouvia sua voz, e achava mais bela que o barulho do vento nas folhas das tamareiras.

— Faz muito tempo, que estive aqui neste poço esperando por você. Não consigo me lembrar do meu passado, da Tradição, da maneira que os homens esperam que se comportem as mulheres do deserto. Desde criança eu sonhava que o deserto ia me trazer o maior presente de minha vida. Este presente chegou afinal, e é você.

O rapaz pensou em tocar sua mão. Mas Fátima segurava as alças do cântaro.

— Você me falou dos seus sonhos, do velho rei, e do tesouro. Você me falou dos sinais. Então não tenho medo de nada, porque foram estes sinais que me trouxeram você. E eu sou parte do seu sonho, da sua Lenda Pessoal, como você costuma chamar.

«Por isso quero que siga em direção ao que veio buscar. Se tiver que esperar o final da guerra, muito bem. Mas se tiver que seguir antes, vá em direção à sua lenda. As dunas mudam com o vento, mas o deserto permanece no mesmo. Assim será com nosso amor.

«Maktub» — disse. «Se eu for parte de sua Lenda, você voltará um dia».

O rapaz saiu triste do encontro com Fátima. Ele se lembrava de muita gente que havia conhecido. Os pastores casados tinham muita dificuldade em convencer suas esposas de que precisavam andar pelos campos. O amor exigia estar junto da pessoa amada.

No dia seguinte ele contou tudo isto à Fátima.

— O deserto leva nossos homens e nem sempre os traz de volta — disse ela. — Então nos acostumamos com isto. E eles passam a existir nas nuvens sem chuva, nos animais que se escondem entre as pedras, na água que sai generosa da terra. Eles passam a fazer parte de tudo, passam a ser a Alma do Mundo.

«Alguns retornam. E então todas as outras mulheres ficam felizes, porque os homens que elas esperam também podem voltar um dia. Antes eu olhava estas mulheres, e invejava sua felicidade. Agora vou ter também uma pessoa para esperar.

«Sou uma mulher do deserto e me orgulho disto. Quero que meu homem também caminhe livre como o vento que move as dunas. Quero também poder ver meu homem nas nuvens, nos animais e na água.»

O rapaz foi procurar o Inglês. Queria contar-lhe sobre Fátima. Ficou surpreso quando viu que o Inglês havia construído um pequeno forno ao lado de sua tenda. Era um forno estranho, com um frasco transparente em cima. O Inglês alimentava o fogo com lenha, e olhava o deserto. Seus olhos pareciam ter mais brilho quando passava o tempo todo lendo livros.

— Esta é a primeira fase do trabalho — disse o Inglês. — Tenho que separar o enxofre impuro. Para isto, não posso ter medo de falhar.

O meu medo de falhar foi que me impediu de tentar a Grande Obra até hoje. E agora que estou começando o que podia ter começado há dez anos atrás. Mas me sinto feliz de não ter esperado vinte anos para isto.

E continuou a alimentar o fogo e a olhar o deserto. O rapaz ficou ao seu lado por algum tempo, até que o deserto começou a ficar rosado com a luz do entardecer. Então ele sentiu uma imensa vontade de ir até lá, para ver se o silêncio conseguia responder suas perguntas.

Caminhou sem destino por algum tempo, mantendo as tamareiras do oásis ao alcance de seus olhos. Escutava o vento, e sentia as pedras sob seus pés.

Às vezes encontrava alguma concha, e sabia que aquele deserto, num tempo remoto, havia sido um grande mar. Depois sentou-se numa pedra e deixou-se hipnotizar pelo horizonte que existia na sua frente. Não conseguia entender o Amor sem o sentimento de posse; mas Fátima era uma mulher do deserto, e se alguém podia lhe ensinar isto, era o deserto.