Beenay parecia radiante.
— Quer dizer, no final das contas, a Teoria da Gravitação Universal continua de pé!
— Continua, pelo menos por enquanto. Você provavelmente já conquistou um lugar na história da ciência, mas ainda não sabemos se como demolidor ou como criador. Vamos rezar pela segunda possibilidade. E agora precisamos pensar muito, meu jovem. — Athor 77 fechou os olhos e esfregou a testa, que estava começando a doer. Percebeu, surpreso, que fazia tempo que não se dedicava a uma investigação científica. As questões administrativas do Observatório haviam ocupado todo o seu tempo nos últimos oito ou dez anos. Entretanto, a mente que havia descoberto a Teoria da Gravitação Universal seria capaz de outras conquistas, disse para si mesmo. — Primeiro, quero examinar mais de perto esses seus cálculos — disse. — E depois, naturalmente, vou examinar mais de perto minha própria teoria.
10
O quartel-general dos Apóstolos do Fogo era uma torre fina e majestosa, toda em pedra dourada, que se destacava como um dardo reluzente na margem do Rio Seppitan, no bairro de Birigam, um dos mais exclusivos da cidade de Saro. Aquela torre pensou Theremon, devia ser um dos prédios mais caros de toda a capital.
Ele nunca havia parado para pensar no assunto, mas os Apóstolos tinham que ser uma seita muito rica. Eram donos de estações de rádio e televisão, publicavam revistas e jornais e haviam construído uma torre como aquela. Provavelmente, possuíam muitos outros bens menos visíveis. Imaginou como aquilo era possível. Um bando de monges fanáticos? Como teriam conseguido pôr as mãos em centenas de milhões de créditos?
Por outro lado, industriais conhecidos, como Bottiker 888 e Vivin 99, defendiam abertamente os ensinamentos de Mondior e seus Apóstolos. Não seria surpresa se homens como Bottiker, Vivin e outros como eles houvessem contribuído para o tesouro dos Apóstolos.
E se a organização fosse tão antiga quanto afirmava ser (dez mil anos, era o que diziam!) e tivesse aplicado bem seu dinheiro através dos séculos, não havia o que os Apóstolos não pudessem ter conseguido através do milagre dos juros compostos, pensou Theremon. Sua fortuna podia chegar à casa dos bilhões. Podiam ser donos, secretamente, de metade da cidade de Saro.
Era um assunto que valia a pena investigar, disse para si mesmo.
Entrou no vasto saguão da grande torre e olhou em torno, admirado. Embora nunca tivesse estado ali antes, ouvira dizer que se tratava de um edifício de extremo luxo, tanto dentro como fora. Mas nada do que ouvira o preparara para a realidade que via diante de si.
Um piso de mármore polido, com incrustações em meia dúzia de cores vivas, se estendia até onde a vista podia alcançar. As paredes eram cobertas de mosaicos dourados que formavam figuras abstratas. Candelabros de ouro e prata banhavam a cena com uma iluminação feérica.
No lado oposto ao da entrada, Theremon viu o que parecia ser um modelo do universo, feito, ao que parecia, inteiramente de metais nobres e pedras preciosas: imensos globos suspensos, representando os seis sóis, pendiam do teto, sustentados por fios invisíveis. Cada um deles tinha um brilho diferente. O maior, que devia ser Onos, era dourado, o globo de Dovim era vermelho escuro, o par Tano-Sitha era branco azulado, e Patru e Trey tinham uma luz branca, mais suave. Um sétimo globo, que devia ser Kalgash, movia-se devagar entre eles, como um balão levado pelo vento, mudando de cor a cada instante, de acordo com sua posição em relação aos seis sóis.
Enquanto Theremon observava a cena, fascinado, uma voz, que não vinha de nenhum lugar em particular, perguntou:
— Posso saber o seu nome?
— Theremon 762. Tenho uma entrevista marcada com Mondior.
— Muito bem. Entre, por favor, na câmara à sua esquerda, Theremon 762.
O repórter não via nenhuma câmara do lado esquerdo do saguão. De repente, porém, um segmento da parede coberta de mosaicos deslizou suavemente, revelando uma pequeno compartimento oval, mais uma antessala do que uma câmara. As paredes eram revestidas por tapeçarias de veludo verde, uma única barra de luz âmbar fornecia a iluminação.
Theremon deu de ombros e entrou. A porta se fechou em seguida, e ele teve uma nítida sensação de movimento. Aquilo não era uma sala, era um elevador! Sim, estava subindo, tinha certeza disso. Só que muito devagar. Teve a impressão de que se havia passado uma eternidade antes de o elevador parar e a porta se abrir de novo. Uma figura usando uma veste negra estava à sua espera.
— Quer vir por aqui, por favor?
Um corredor estreito levava a uma espécie de sala de espera, onde um enorme retrato de Mondior 71 ocupava a maior parte de uma das paredes. Quando Theremon entrou, o retrato pareceu acender, tornando-se estranhamente vivo, de modo que os olhos escuros e penetrantes de Mondior olharam diretamente para ele e o rosto severo do Sumo Apóstolo assumiu uma radiância peculiar que o fez parecer quase belo.
Theremon enfrentou com tranquilidade o olhar do retrato. Mesmo o calejado repórter, porém, não podia deixar de se sentir emocionado ao pensar que em pouco tempo estaria entrevistando aquela mesma pessoa. Mondior no rádio ou na televisão era uma coisa, apenas um pregador excêntrico com uma mensagem absurda. Mas Mondior em carne e osso, imponente, hipnótico, misterioso, parecido com aquele retrato, seria uma coisa bem diferente.
— Entre, por favor — disse o monge vestido de preto. A parede à esquerda do retrato se abriu. Apareceu um escritório, tão modestamente mobiliado quanto uma cela.
Não havia nada no interior a não ser uma mesa nua, feita de um único bloco de pedra polida, e um banco baixo de incomum madeira cinza de veios vermelhos colocado em frente a ela. Atrás da mesa estava sentado um homem de evidente autoridade, usando a veste negra dos Apóstolos, com uma orla vermelha no capuz.
Era uma figura impressionante, mas não era Mondior 71. Mondior, a julgar pelas fotografias e pela forma como aparecia na televisão, tinha que ser um homem de 65 ou 7O anos, com uma espécie de intensa força masculina. Seus cabelos eram fartos e ondulados, negros com mechas brancas, e tinha um rosto cheio, carnudo, uma boca larga, nariz bem-feito, sobrancelhas escuras, olhos negros e penetrantes. Mas este homem era moço, não podia ter mais de quarenta anos, e embora também parecesse másculo, o era de forma inteiramente diversa. Era muito magro, com um rosto fino e anguloso e lábios estreitos. O cabelo que aparecia por baixo do capuz tinha uma estranha cor avermelhada, e os olhos eram azuis e frios.
Aquele homem era, sem dúvida, um alto funcionário da organização. Entretanto, a entrevista de Theremon era com Mondior.
Naquela manhã, depois de escrever uma reportagem a respeito das mais recentes previsões dos Apóstolos, o jornalista chegara à conclusão de que precisava conhecer melhor aquele culto misterioso. Tudo que haviam dito até o momento era absurdo, é claro, mas estava começando a parecer um absurdo interessante, digno de uma investigação mais aprofundada. Que forma melhor havia de aprender mais a respeito deles do que entrevistar o seu líder? Isto é, supondo que isso fosse possível. Para sua surpresa, o que lhe disseram, quando telefonou, foi que poderia ter uma audiência com Mondior 71 naquele mesmo dia. Tinha parecido fácil demais.