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Voltando-se para o terminal, começou de novo a digitar os parâmetros do Oitavo Postulado. Enquanto trabalhava, seu cansaço se dissipou: desta vez, não entrou com nenhum número errado. A cabeça tinha parado de doer. Estava momentaneamente imune à fadiga.

— O que estamos supondo — disse — é que existe um corpo planetário não-luminoso semelhante a Kalgash, que está em órbita, não em torno de Onos, mas em torno de Kalgash. Esse corpo possui uma massa considerável, da mesma ordem de grandeza que a massa de Kalgash, e suficiente para exercer uma força gravitacional sobre nosso planeta capaz de explicar as perturbações descobertas por Beenay.

Athor apertou uma tecla e um diagrama do sistema solar apareceu na tela do terminaclass="underline" os seis sóis, Kalgash e o suposto satélite de Kalgash. O velho professor olhou para os assistentes. Estavam todos se entreolhando, nervosos. Embora tivessem metade da sua idade, ou menos, deviam estar encontrando tanta dificuldade quanto ele para aceitar a ideia de que havia um outro astro no universo de cuja existência jamais alguém havia suspeitado. Ou então estavam achando que tudo não passava de devaneios de uma mente senil, que, de algum modo, havia deslizado em erros nos cálculos.

— Os dados que apóiam o Oitavo Postulado estão corretos — disse Athor. — E o postulado resistiu a todos os testes que consegui imaginar.

Olhou para eles com ar de desafio, como que para lembrar-lhes que era o mesmo Athor 77 que legara ao mundo a Teoria da Gravitação Universal e que ainda se encontrava no perfeito domínio de suas faculdades.

— Professor, por que não conseguimos observar este satélite? — perguntou Beenay, timidamente.

— É fácil explicar — respondeu Athor. — Como Kalgash, este astro não tem luz própria. Se supusermos que sua superfície contém rochas azuladas, uma hipótese geologicamente plausível, a luz refletida por ele ocuparia uma posição tal no espectro luminoso que o brilho eterno dos seis sóis, combinado com as propriedades de nossa atmosfera, o tornaria totalmente invisível. Em um céu perpetuamente iluminado como o nosso, seria impossível observá-lo.

— Contanto que este satélite gire em torno do nosso planeta a uma distância muito grande, não é mesmo, professor? — disse Faro.

— Isso mesmo. — Athor apertou outra tecla. — Aqui está uma vista mais ampliada. Como podem ver, nosso satélite desconhecido e invisível descreve uma enorme elipse que o leva a enormes distâncias de Kalgash. Não tão grandes que não possamos detectar os seus efeitos gravitacionais, mas suficientes para nos impedir de observá-lo a olho nu e tornar improvável sua observação ao telescópio.

— Agora, que sabemos que ele existe, podemos tentar observá-lo no telescópio — disse Thilanda 191, cuja especialidade era a astrofotografia.

— Claro que vamos fazer isso — disse Athor. Estavam começado a aceitar a ideia, pensou. Todos eles. Conhecia-os suficientemente bem para saber que o estavam levando a sério. — Se bem que a busca pode ser mais difícil do que vocês pensam. Vai ser como procurar uma agulha no palheiro. Mesmo assim, vale a pena tentarmos.

— Professor, eu tenho uma pergunta — disse Beenay.

— Pode falar.

— Se a órbita é tão excêntrica como o senhor supõe, e se este seu satélite, se este… este Kalgash Dois, se é que podemos chamá-lo assim… se Kalgash Dois está muito distante de nós em certos trechos de sua órbita, é evidente que em outros trechos da órbita estará muito mais próximo. Existe uma variação, mesmo na mais perfeita órbita, assim, no caso de órbitas excêntricas, como as deste satélite, é provável que exista uma grande diferença entre os pontos de maior e menor aproximação.

— Isso me parece lógico — concordou Athor.

— Nesse caso, professor — prosseguiu Beenay -, se supusermos que Kalgash Dois tem estado tão afastado de nós durante todo o período da ciência astronômica moderna que não fomos capazes de detectá-lo, a não ser por seus efeitos gravitacionais, não concorda que é provável que ele já tenha passado pelo ponto de máximo afastamento? Que, no momento, ele esteja se aproximando de nosso planeta?

— Não necessariamente — protestou Yimot, agitando os braços. — Não sabemos em que ponto da órbita ele se encontra no momento, nem quanto tempo leva para completar uma volta em torno de Kalgash. Uma órbita pode durar dez mil anos. Nesse caso, talvez Kalgash Dois ainda esteja se afastando de nós, depois de uma aproximação nos tempos pré-históricos que não deixou registros.

— Pode ser — admitiu Beenay. — A verdade é que não sabemos se está indo ou vindo. Não ainda.

— Mas podemos tentar descobrir — sugeriu Faro. — Thilanda está certa. Embora os números tenham sido checados, o que temos a fazer é observá-lo no telescópio. Depois disso, poderemos calcular sua órbita.

— Mesmo que seja impossível observá-lo, podemos calcular sua órbita pela perturbação que está causando na nossa — declarou Klet, que era o melhor matemático do departamento.

— É verdade — concordou Simbron, a cosmógrafa. Também podemos verificar se está se aproximando ou se afastando de nós. Puxa! E se estiver se aproximando? Seria um acontecimento incrível! Um astro sem luz própria, passando entre nós e os sóis! Talvez ocultando a luz de alguns deles por um par de horas!

— Como seria estranho! — cismou Beenay. — Acho que poderíamos chamar esse fenômeno de eclipse. Você sabe: o efeito visual que ocorre quando um objeto se coloca entre um objeto e o observador. Mas poderia isto acontecer? Os sóis são tão grandes… como Kalgash Dois ocultaria um deles?

— Bastaria que passasse muito perto de nós — argumentou Faro. — Ora, posso imaginar uma situação em que…

— Isso, imagine todas as situações possíveis, por que não? — interveio Athor, interrompendo Faro de forma tão abrupta que todos se voltaram para olhar para ele. — Brinquem com a ideia, todos vocês. Imaginem isso e aquilo, e vejam o que acontece.

De repente, não agüentou mais ficar sentado. Tinha que sair dali.

A excitação que vinha sentindo desde que a última peça do quebra-cabeça se encaixara no lugar tinha desaparecido bruscamente. Tudo que sentia era um grande cansaço, como se tivesse mil anos de idade. A dor nas costas era quase insuportável. Sabia que seu corpo estava no limite da resistência. Era hora de deixar aos mais moços a tarefa de completar o trabalho.

Levantando-se da cadeira, Athor deu um passo em direção ao meio da sala, cambaleou, aprumou-se e caminhou devagar, com dignidade, em direção à porta, passando pelo meio dos seus discípulos.

— Vou para casa — declarou. — Preciso dormir um pouco.

15

— Quer dizer que a cidade foi destruída nove vezes seguidas, Siferra? — observou Beenay, surpreso. — E eles a reconstruíram nove vezes?

— Meu colega Balik acha que só existem as ruínas de sete cidades enterradas na colina de Thombo — respondeu a arqueóloga. — E pode ser que tenha razão. Nos níveis mais baixos, está tudo misturado. Mas sete cidades, nove cidades… seja qual for o número, a ideia central não muda. Olhe para estes mapas. São baseados nas nossas escavações. Naturalmente o que fizemos foi apenas uma sondagem preliminar, um corte rápido em toda a colina, deixando o trabalho detalhado para a próxima expedição. Quando descobrimos o que havia na colina, estava quase na hora de voltar para a civilização. Mas estes mapas lhe darão uma ideia. Não estou aborrecendo você, estou? Está realmente interessado, não está, Beenay?

— Estou fascinado. Acha que estou tão envolvido com a astronomia que não dou valor às outras disciplinas? Além disso, a arqueologia e a astronomia às vezes se complementam. Aprendemos muita coisa a respeito dos movimentos dos sóis estudando os monumentos astronômicos que vocês desenterraram aqui e ali. Deixe-me ver os mapas.