Выбрать главу

16

Àquela hora, o Observatório estava praticamente deserto. Não havia ninguém ali, a não ser Faro e Thilanda. Para alívio de Beenay, Athor 77 ainda não havia voltado.

Ótimo, pensou Beenay. O esforço para explicar os desvios na órbita do planeta, que levara a hipótese de Kalgash Dois, deixara o velho astrônomo extenuado, melhor poupar-lhe novas preocupações.

O fato de encontrar Faro e Thilanda havia sido uma feliz coincidência. Faro tinha o tipo de raciocínio rápido, sem preconceitos, de que Beenay estava precisando. E Thilanda, que passara tantos anos esquadrinhando os recantos vazios do céu com seu telescópio e sua câmera, talvez pudesse fornecer as informações de que Beenay necessitava no momento.

— Estive revelando chapas o dia inteiro — disse Thilanda, à guisa de saudação. — Mas não adianta. Agora posso afirmar com convicção: não há nada lá em cima no céu, a não ser os seis sóis. Será que o velho perdeu o juízo?

— Acho que não, Thilanda.

— Como explica, então, os meus resultados? Há vários dias que estou fotografando todos os quadrantes do universo. É um programa meticuloso. Fotografar, desviar alguns graus, fotografar de novo. Uma varredura sistemática de toda a esfera celeste. Veja o resultado, Beenay. Uma pilha de fotografias do vazio!

— Se o satélite desconhecido é invisível, Thilanda, o que a faz pensar que pode ser fotografado?

— Invisível a olho nu, talvez. Mas as fotos deviam mostrar…

— Escute, vamos deixar isso de lado por enquanto. Preciso da ajuda de vocês dois em uma questão puramente teórica. Tem a ver com a nova teoria do Dr. Athor.

— Mas se o satélite desconhecido não existir… — protestou Thilanda.

— Não quero discutir isso agora — Beenay a interrompeu. — E não gostaremos quando ele aparecer de não sei onde, bem na nossa cara. Vai me ajudar ou não?

— Bem…

— Ótimo. O que quero que faça é calcular no computador as posições dos seis sóis em um período 420O anos.

— Você disse quatro mil e duzentos anos? — repetiu Thilanda, surpresa.

— Sei que nossos registros cobrem um período muito menor. O que eu quero, Thilanda, é uma projeção das órbitas, com base nas posições conhecidas. Vocês dispõem de pelo menos cem anos de observações confiáveis, não é mesmo?

— Mais do que isso.

— Melhor ainda. Extrapole as órbitas, a partir desses dados, para o passado e para o futuro. Faça o computador dizer onde estavam os sóis a cada dia durante os últimos 21 séculos e onde estarão durante os próximos 21 séculos. Se não puder fazer isso sozinha, estou certo de que Faro concordará em ajudá-la a escrever o programa.

— Acho que dá para fazer o que você quer — disse Thilanda, em tom glacial. — Mas se importa de explicar do que se trata? O Observatório vai publicar um calendário?

— Depois eu explico a você — disse Beenay. — Prometo.

Ele deixou a jovem astrônoma soltando fumaça e foi até o escritório de Athor, onde se sentou diante das três telas que Athor havia usado para chegar à teoria de Kalgash Dois. Ficou olhando por muito tempo para a tela central, que mostrava a órbita de Kalgash, levando em conta as perturbações causadas pelo hipotético Kalgash Dois.

Depois, apertou uma tecla e a suposta órbita de Kalgash Dois apareceu na tela, uma elipse excêntrica que ocupava um espaço muito maior do que a órbita de Kalgash, mais compacta e quase circular. Examinou-a por alguns instantes; depois, apertou as teclas que faziam os sóis serem mostrados na tela. Passou quase uma hora experimentando diferentes configurações: Onos no céu com Tano e Sitha, Onos com Trey e Patru, Onos e Dovim com Trey e Patru, Dovim com Trey e Patru, Dovim com Tano e Sitha, Patru e Trey sozinhos… Aquelas eram as configurações normais.

E as configurações anormais?

Tano e Sitha sozinhos? Não, isso não podia acontecer. As trajetórias dos astros eram tais que Tano e Sitha nunca podiam aparecer naquele hemisfério, a menos que Onos, Dovim ou ambos estivessem visíveis ao mesmo tempo. Talvez isso fosse possível há centenas ou milhares de anos, pensou, embora fosse pouco provável. No momento, porém, era impossível.

Trey, Patru, Tano e Sitha?

Outra impossibilidade. Os dois pares de sóis ficavam em lados opostos de Kalgash; sempre que um par estava no céu, o outro estava escondido atrás do planeta. Uma vez ou outra, os quatro sóis apareciam juntos no céu, mas Onos estava sempre visível nessas ocasiões. Havia os famosos dias de cinco sóis, que correspondiam aos igualmente famosos dias de um único sol (Dovim) no hemisfério oposto. Eles ocorriam uma vez a cada dois ou três anos.

Trey sem Patru? Tano sem Sitha?

Teoricamente, era possível. Quando um dos pares de sóis estava próximo ao horizonte, durante um breve período, um dos sóis do par podia ficar acima do horizonte e o outro abaixo. Entretanto, isso não era um evento astronômico significativo, mas apenas uma aberração momentânea. Os sóis continuavam a formar um par, ainda que separados temporariamente pela linha do horizonte.

Todos os seis sóis no céu ao mesmo tempo? Impossível!

Pior do que isso… impensável!

No entanto, tinha acabado de pensar nesta possibilidade. A ideia o fez estremecer. Se os seis sóis estivessem ao mesmo tempo acima do horizonte, não restaria nenhum sol para iluminar o hemisfério oposto. Escuridão! Escuridão! Mas a Escuridão era desconhecida em Kalgash, a não ser como um conceito abstrato. Não era possível que os seis sóis se reunissem em uma região do céu, deixando metade do planeta mergulhada em total Escuridão. Isso era inconcebível. Era mesmo?

Beenay parou para pensar. Ouviu mais uma vez a voz grave de Theremon repetindo as previsões dos Apóstolos: “… os sóis vão desaparecer… as Estrelas vão despejar fogo do céu negro…” Sacudiu a cabeça. Tudo que conhecia a respeito dos movimentos dos sóis no céu ia contra a ideia de que os seis se reunissem de um lado de Kalgash ao mesmo tempo. Aquilo simplesmente não podia acontecer, a não ser por milagre. Beenay não acreditava em milagres. Da forma como os sóis se moviam no céu, qualquer ponto da superfície de Kalgash tinha que ser iluminado, a cada instante, por pelo menos um sol.

Esqueça a hipótese dos seis sóis aqui, Escuridão ali. Que restava?

Dovim sozinho, pensou. O pequeno sol vermelho sozinho no céu?

Sim, isso acontecia, se bem que raramente. Nos dias de cinco sóis, em que Tano, Sitha, Trey, Patru e Onos eram vistos no mesmo hemisfério, restava apenas Dovim para iluminar o outro lado do mundo. Beenay imaginou se aquela seria a Escuridão anunciada pelos Apóstolos.

Seria possível? Dovim era um sol relativamente fraco, com uma luz vermelho-arroxeada que as pessoas poderiam confundir com a Escuridão.

Não, não fazia nenhum sentido. Mesmo o pequeno Dovim fornecia iluminação suficiente para que as pessoas não se assustassem com a falta de luz. Além do mais, Dovim aparecia sozinho no céu uma vez a cada dois ou três anos. Era um evento incomum, mas não chegava a ser extraordinário. Se os efeitos psicológicos de ver apenas um sol vermelho no céu fossem sérios, todos na certa estariam aguardando com apreensão a próxima ocorrência do fenômeno, que estava prevista para dali a um ano e pouco.

A verdade, porém, é que ninguém estava preocupado com o assunto.

Por outro lado, se Dovim estivesse sozinho no céu e alguma coisa acontecesse, alguma coisa realmente rara, para bloquear a luz do pequeno sol…

Thilanda apareceu a seu lado e disse, secamente:

— Beenay, seu programa está pronto. Não foi preciso limitar as projeções a um período finito. Faro me ajudou e montamos o programa de tal forma que você pode calcular as posições dos sóis desde a criação do universo até o final dos tempos.